Há
aproximadamente 4 mil anos, a idéia de um Deus único e poderoso mudou a
história do mundo. Saiba, enfim, como foi criada a ideia do criador
por
Rodrigo Cavalcante
O
todo-poderoso deus do Sol Amon-Rá, um dos criadores do mundo no antigo Egito,
não passa hoje de mera curiosidade arqueológica. O mesmo fim levaram outros
deuses egípcios, como Osíris e sua mulher Ísis. Tiamat e Apsu, deuses da
criação na Mesopotâmia, também foram relegados ao ostracismo. Zurvan, o deus do
tempo na Pérsia antiga, não conseguiu acompanhar o passar dos séculos com a
mesma força. E os grandes deuses gregos e romanos, como Zeus
(Júpiter, para os romanos), Afrodite (Vênus) e Apolo (Marte), apesar de gozarem
ainda de status literário e mitológico no Ocidente, não são levados mais a
sério como divindades – a não ser em episódios de desenhos animados como Os
Superamigos, onde ainda são invocados por personagens como o Super-Homem, a
Mulher-Maravilha e outros membros da Sala de Justiça.
Esse,
definitivamente, não é o caso de Javé. O deus bíblico criador do céu e da terra
segundo o Gênesis continua reinando absoluto para mais de 3 bilhões de judeus,
cristãos e muçulmanos (ainda que estes últimos o chamem de Alá). Mesmo que você
seja ateu, Javé continua moldando boa parte de sua vida. Afinal, a imagem de um
ser todo-poderoso, masculino, onipotente, pai, permeia a cultura, o
comportamento e a ética do Ocidente. Mas como a idéia de um único deus, cultuado
inicialmente por pequenas tribos do Oriente
Médio, viria a mudar a história do planeta? Como Javé superou os deuses dos
maiores impérios da Antiguidade?
Deuses e Deus
Apesar
de ninguém saber ao certo o momento em que os homens passaram a cultuar deuses,
a maioria dos arqueólogos e antropólogos concorda que esse é um traço comum de
todas as civilizações. Como escreveu a historiadora das religiões Karen
Armstrong em seu livro Uma História de Deus, “parece que criar deuses é uma
coisa que os seres humanos sempre fizeram. E, quando uma idéia religiosa deixa
de funcionar para eles, simplesmente a substituem”.
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Ishtar |
As
primeiras imagens de deuses esculpidas em pedras há mais de 10 mil anos na
Europa, no Oriente Médio e na Índia em nada se parecem, contudo, com o
velho barbudo e musculoso dos afrescos que Michelangelo pintou na Renascença.
São imagens de mulheres nuas, gordas, grávidas e de seios fartos que
simbolizavam a fertilidade – algo natural, segundo os arqueólogos, numa época
em que a agricultura estava se desenvolvendo. Com o tempo, essa deusa mãe da
fertilidade ganharia vários nomes: Inana na antiga Suméria, Ishtar na
Babilônia, Anat em Canaã, Ísis no Egito e Afrodite na Grécia. E quase sempre
dividia lugar com outros deuses.
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Zeus |
Na
Grécia antiga, espécie de matriz do mundo ocidental, mais de uma dezena de
deuses eram cultuados pelos cidadãos. Nenhum deles, contudo – incluindo o
poderoso Zeus
– era tão gigante, distante e sobrenatural como o deus da Bíblia. Para os
gregos, os deuses não eram figuras imaculadas e perfeitas, mas apenas uma das
“três raças” que habitavam o mundo, ao lado dos animais e dos homens. “Eles
eram espécies de super-homens com qualidades e defeitos bem semelhantes aos
nossos. Com a diferença, é claro, de que eram imortais”, diz o historiador e arqueólogo
Pedro Paulo
Funari, da Universidade Estadual de Campinas. Até mesmo a morada deles em nada
se assemelha ao céu sobrenatural do deus bíblico. Para os gregos, ao menos 12
desses deuses viviam no monte Olimpo, uma montanha de verdade localizada na
Grécia, com quase 3 mil metros de altitude.
E,
por estarem mais próximos dos homens, a relação dos gregos com os deuses era
semelhante à relação de alguns católicos com seus santos de preferência. Cada
um deles tinha um papel bem definido e as oferendas seguiam a lógica das
promessas: em troca de ofertas ao seu deus predileto, os devotos esperavam que
sua parte no pacto fosse cumprida. Quando isso não acontecia, era comum que os
deuses fossem criticados abertamente – assim como um empregado critica seu
patrão por não ter retribuído seu esforço.
Adotados
pelos romanos com outros nomes, esses deuses da Grécia logo se tornaram parte
do ritual
cívico do novo império que não parava de se expandir. Como os deuses não eram
entidades imaculadas – e sim um tipo de homens superpotentes –, era comum
atribuir a alguns imperadores (as pessoas mais poderosas à época) uma origem
divina. Na prática, os rituais da administração pública costumavam se mesclar
às cerimônias religiosas.
Mas,
desde que os povos dominados pelos romanos que seguissem outras religiões
pagassem seus impostos e não desafiassem o comando romano, seus cidadãos tinham
o direito de seguir os deuses de sua preferência. Quando os romanos conquistaram
a região que hoje faz parte de Israel, no século 1 a.C., eles inicialmente não
fizeram muito caso com o culto
dos judeus a um deus único no Templo de Jerusalém. Naquele tempo, ninguém podia
ainda imaginar que o deus dos judeus seria levado, quatro séculos depois, para
o centro do maior império do Ocidente.
Mas
que deus era esse?
Deus
tribal
Segundo
as Escrituras, o pacto entre os judeus e Javé teria começado com um homem chamado
Abraão, há cerca de 4 mil anos. Conta a tradição que ele foi chamado por Deus
para deixar a cidade de Ur, na Mesopotâmia (atual Iraque), para fundar uma nova
nação em uma terra desconhecida. Mais tarde, essa terra prometida seria chamada
de Canaã. Ao obedecer e firmar uma aliança com esse deus único, Abraão recebeu
a promessa de que sua “semente” iria prosperar por toda a Terra.
O
deus que aparecera para Abraão é completamente diferente dos deuses gregos e
romanos. Ele não compartilhava da condição humana e se colocava na posição
onipotente de poder fazer qualquer exigência que quisesse. Qualquer uma mesmo.
No caso de Abraão, por exemplo, Javé ordenou que seu filho Isaac fosse
sacrificado pelo próprio pai como prova de sua fé. O resto da história é conhecida:
no momento em que Abraão
já estava com a faca em punho, Javé recuou do pedido e disse que tudo não
passara de um teste.
Por
isso mesmo, quem lê o Antigo Testamento (o Pentateuco, para os judeus) sabe que
Javé não guarda semelhanças com o pai dócil ou amoroso que mais tarde o cristianismo
iria propagar. “É um deus brutal, parcial e assassino: um deus de guerra, que
seria conhecido como Javé Sabaoth, Deus dos Exércitos”, escreveu a historiadora
Karen Armstrong. “É passionalmente partidário, tem pouca misericórdia pelos não
favoritos, uma simples divindade tribal.”
Prova
disso seriam as passagens como a que Javé manda pragas aos egípcios. Em outras,
Javé se mostra até arrependido de sua criação, como quando ordenou a morte por
afogamento de toda a humanidade por meio do dilúvio do qual só escapou a
família de Noé e os animais que ele pôs em sua arca – isso antes ainda da
aliança feita com Abraão.
Durante
essa fase, Javé parece mais preocupado em ameaçar a raça humana para que ela
não se desvie de suas instruções. Talvez seja por isso que o pacto de Abraão
precisou ser reforçado por outros patriarcas. Caso de Moisés, para quem Deus
preferiu escrever diretamente seus mandamentos nas tábuas do profeta, não
deixando dúvidas sobre suas intenções.
O
fato é que, quando os romanos chegaram a Israel, o deus do Templo de Jerusalém
parecia muito mais rigoroso e cheio de exigências que os deuses gregos. Mesmo
para os romanos, que admiravam a tradição judaica pela consistência de suas
escrituras, a conversão àquele deus era uma tarefa nada fácil. “Como era
necessário seguir uma série de regras, que iam da alimentação à circuncisão,
poucos romanos eram atraídos para o judaísmo”,
afirma o historiador André Chevitarese, professor de História Antiga da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Até que, no século 1, o advento de uma
nova seita dentro do judaísmo
iria tornar Javé popular muito além das fronteiras de Israel.
Deus
cristão
A
nova corrente judaica defendia que Jesus de Nazaré, o galileu que acabara de
ser crucificado pelos romanos, era o messias enviado por Javé para cumprir as
profecias das escrituras. Não seria exagero dizer que, inicialmente, o cristianismo
não passava de uma corrente judaica – ou melhor, uma ala do judaísmo,
assim como um partido político tem alas que nem sempre estão afinadas com a
presidência. É então que surge uma questão decisiva para o futuro de Jesus e do
deus Javé. A pergunta-chave era: os convertidos ao cristianismo
que não seguiam os tradicionais rituais judaicos (como a circuncisão) poderiam
ser salvos?
Esse
foi um dos principais temas discutidos pelos cristãos numa assembléia realizada
por volta do ano 49 d.C., mais tarde conhecida pelo nome de Concílio de
Jerusalém. Como diz o historiador Paul Johnson em seu livro História do Cristianismo,
o tal concílio foi o primeiro ato político da história da Igreja. É aí que
surge uma figura decisiva para a expansão do cristianismo
e, por tabela, da crença do deus único Javé.
O
nome dele era Paulo de Tarso, um homem cosmopolita recém-convertido, para quem
os traços judaicos do cristianismo
estavam arruinando seu trabalho de arrebanhamento de novos cristãos. Como
provavelmente falava grego muito bem e era um dos poucos cristãos que conheciam
diversas províncias do Império Romano, ele devia ter consciência das
dificuldades que seu trabalho teria caso tivesse que obrigar os gentios a
seguirem as práticas judaicas, principalmente a circuncisão. Para a maioria dos
historiadores da religião, se as idéias de Paulo fossem censuradas no
Concílio de Jerusalém, talvez o cristianismo
permanecesse apenas como mais uma seita judaica, sem conseguir jamais a
autonomia responsável pela sua expansão.
Mas
a idéia central de Paulo, resumida na frase de que o verdadeiro cristão
se justifica pela fé “e não pelos trabalhos da lei”, prevaleceu. Os gentios
podiam agora se converter sem tantos empecilhos e o cristianismo
ganhou novas fronteiras. “Paulo ajudou a tirar de Jesus a imagem de um messias
para o povo hebreu, transformando-o num salvador de todos os povos”, diz
Chevitarese. Com isso, o deus Javé também deixou de ser um fenômeno regional,
ligado apenas ao povo hebreu, para ganhar caráter universal.
Quando,
no ano 313, o imperador romano Constantino instruiu os governadores das
províncias dominadas por Roma a dar completa tolerância aos cristãos, revogando
todos os decretos anticristãos do passado, o cristianismo
deu um passo decisivo para se tornar, em seguida, o credo oficial do império.
Com
a expansão da nova fé, o deus “carrancudo” ganhou uma face completamente
diferente, ao menos para os cristãos. De certa forma, a crucificação de Jesus
foi vista como o momento em
que Javé sentiu na pele o que é ser humano. Se, no passado,
foi Deus que pediu a Abraão que sacrificasse seu filho como prova de sua fé, o cristianismo
invertia essa lógica: agora era o próprio Javé que tivera o filho sacrificado
como prova de amor. Mesmo as mensagens atribuídas a Jesus nos Evangelhos
parecem ressaltar mais o amor divino que a lei divina. “Apesar de não ser
correta a ideia de que o cristianismo
promovera um rompimento total com a tradição judaica, é inegável que a figura
de Cristo passa a imagem de um deus bem mais marcadamente amoroso que no
passado”, diz Luiz Felipe Pondé, filósofo e professor de Teologia da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. “Na tradição judaica, em que Jesus viveu, estava
muito claro que o homem devia temer a Deus acima de tudo. Com Jesus, a mensagem
passa a ser amar a Deus acima de tudo.”
Deus
do Islã
Para
os muçulmanos, o acordo firmado entre Javé e Abraão renovou-se e foi ampliado
no século 7, quando o mercador Muhammad (em português, Maomé) teria recebido as
revelações de Deus (agora, Alá) por meio do anjo Gabriel (para eles, Jibril) –
desta feita, em língua árabe. Mais tarde, as revelações foram reunidas no livro
sagrado do Islã: o Alcorão (ou recitação, em árabe).
A
nova revelação do deus dos judeus e dos cristãos vinha preencher um vazio
religioso que há muito perturbava os povos da Arábia. Até então, a região
também era um centro de santuários de culto
a diversas divindades. O mais importante desses locais sagrados, em Meca, era a
Caaba (que significa “cubo”), e seu objeto especial de veneração era uma pedra
preta, fragmento de um meteoro. “Pedras desse tipo eram adoradas pelos árabes
nesse tempo em diversas regiões”, escreveu o francês Maxime Rodinson na
biografia Mahomet, ainda sem tradução no Brasil. Ao lado da pedra, havia
representações de diversas deusas, e o santuário era uma espécie de parada
obrigatória entre os mercadores da região.
Mesmo
assim, como escreveu a historiadora Karen Armstrong na biografia Maomé, boa
parte dos árabes sentia-se um tanto renegada por nunca ter recebido uma
mensagem direta e explícita de um único deus, como as revelações contidas nas
sofisticadas escrituras judaicas e nos evangelhos. Por conhecerem as tradições
tanto do judaísmo quanto do cristianismo,
eles acreditavam que já era hora de Deus enviar um profeta com uma revelação
exclusiva para os árabes. As mensagens recebidas por Maomé foram vistas como o
momento em que isso aconteceu.
Para
os muçulmanos, as mensagens de Deus contidas no Antigo e no Novo Testamento
foram revistas e ampliadas com o Alcorão, que deve ser consultado no lugar das
revelações anteriores. No livro sagrado do Islã, o deus de Abraão volta a ser
bem mais específico nos seus mandamentos que as parábolas atribuídas a Jesus
nos evangelhos. Nesse quesito, Alá se torna bem mais próximo do deus da Lei do
Antigo Testamento (a Torá dos judeus). Entre os 6326 versículos do Alcorão, há
desde instruções para o casamento até regras sobre como o governante deve agir
na cobrança de impostos.
É
provável que esse grau de detalhamento das instruções de Deus seja fruto do
momento em que Maomé
recebera as revelações. Alá, afinal, transmitiu seus novos mandamentos na época
em que o profeta erguia um estado em
Meca. A nova palavra de Deus, contudo, foi tão forte que os
seguidores do Islã terminaram construindo um império. Pouco mais de 100 anos
após a morte do profeta, seus seguidores levaram a mensagem do deus único para
a África e para locais distantes no Oriente, como o Afeganistão e o Paquistão.
A
expansão do Islã no último milênio – assim como a do cristianismo
– fez com que o deus de Abraão não apenas vencesse a batalha com os outros
deuses como também sobrevivesse a um poderoso inimigo: o mundo científico
contemporâneo. Em um tempo em que a narrativa da criação está mais para a explosão
caótica do Big Bang do que para o relato do Gênesis, ser ateu continua tão
impopular que, como diz o cientista britânico (e ateu) Richard Dawkings, autor
de Deus, um Delírio, os homossexuais parecem ter bem mais facilidade para “sair
do armário” que os ateus. Quatro mil anos depois, o velho Javé continua em
forma.
“Vou
enviar o dilúvio, as águas, sobre a Terra, para exterminar de debaixo do céu
toda carne que tiver sopro de vida, tudo o que há na terra deve parecer"
(Antigo
testamento, Gênisis 6:2)
“Toma
teu filho, teu único que amas, Isaac, e vai a terra de Moriá, e lá o oferecerás
em holocausto sobre uma montanha que eu te indicarei”
(Toma,
Gênisis 22:2)
“Pois
Deus amou tanto o mundo, que entregou seu filho único, para que todo o que nele
crê não pareça, mas tenha vida eterna.”
(Novo
Testamento, João 3:16)
“Todos
que crêem em Allah, no Dia do Juízo final e praticam o bem receberão a sua
recompensa do seu Senhor.”
(Alcorão,
Sura 2:16)
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Krishna |
Tudo ou nada
Para os hindus, há vários deuses. Para os
budistas, eles são mortais
Por
muito tempo, a passagem do politeísmo (culto
a vários deuses) para o monoteísmo (a idéia de um único deus) foi vista por
filósofos e historiadores como uma espécie de evolução, um marco na transição
de sociedades mais primitivas para outras mais avançadas. Hoje, os
pesquisadores reconhecem que há uma boa dose de preconceito nessa concepção, já
que não há como provar que a crença em vários deuses antecedeu a crença em um
único. Até porque ainda hoje muitas religiões no mundo permanecem cultuando
diversos deuses. Caso do hinduísmo,
que conta com centenas de divindades e é seguido por mais de 745 milhões de
pessoas no mundo, a maioria na Índia. Na mesma Índia, nasceu outra religião
no século 4 a.C.
que ganhou o mundo sem pregar que a salvação da alma depende do culto
a um ou mais deuses: o budismo.
De acordo com os ensinamentos de Sidarta Gautama, o jovem rico que abandonou
sua casa e teria atingido a iluminação, tornando-se o Buda, a libertação de
todo o sofrimento não está garantida nem mesmo para os deuses e semideuses,
categorias superiores à dos humanos. Segundo o budismo,
qualquer um pode, desde que tenha mérito espiritual, entrar no mundo dos
deuses. Mas o conforto lá em cima não seria eterno, já que os próprios deuses
também estariam submetidos ao ciclo de renascimento e morte do samsara, espécie
de roda viva que aprisiona todos os seres. Para atingir a iluminação e se
libertar do samsara, o budismo
prega que seus seguidores orem não a um deus específico, e sim aos guias
espirituais, os bodisatvas – seres que já atingiram a iluminação e retornaram
ao samsara apenas para ajudar outros a se libertarem das obstruções para chegar
lá.
Homem solteiro, velho e poderoso
Por que Deus é sempre visto dessa forma?
Sua
feição e os cabelos grisalhos revelam que ele deve ter mais de 60 anos. Seu
corpo, apesar de robusto, preserva os músculos de um homem que o usou para
trabalhar, seja construindo algo, seja lutando como um guerreiro. Embora não
tenha uma esposa, quase nunca está só. Vive cercado de anjos que o acompanham
como executivos seguindo o diretor numa visita à filial da empresa. Apesar de
forte, consegue o que quer com o mínimo de esforço físico. Um simples levantar
de dedo ou uma mudança de semblante pode decidir o destino do mundo. Sem
dúvida, ele tem muito poder. O deus pintado por Michelangelo no teto da Capela
Sistina, no Vaticano, não é popular por acaso. Seu gênio artístico revela toda
a força, poder, onipotência e masculinidade do Javé bíblico. Mas por que Javé é
sempre representado como um homem? “Mesmo que os monoteístas insistissem que
seu deus transcendia o gênero sexual, ele iria permanecer essencialmente
masculino”, escreveu a historiadora das religiões Karen Armstrong. “Em parte,
isso se devia às origens dele com um deus da guerra tribal.” Há cerca de 4 mil
anos, quando a figura de Javé foi ganhando suas feições, as mulheres começariam
a ser vistas nos impérios da Antiguidade como pessoas de segunda classe. O
advento das cidades, assim, fez com que a força marcial e física superasse as
qualidades femininas. Como resultado, as antigas deusas da fertilidade
veneradas por milhares de anos na Europa e no Oriente foram desbancadas pela
força bruta de Javé. Desde então, masculinidade e poder andam juntos.
Saiba mais
Livros
•
Uma História de Deus, Karen Armstrong, Companhia das Letras, 1994
Trajetória
de quatro milênios de Deus sob a ótica do judaísmo,
do cristianismo e do islamismo.
•
História da Vida Privada 1, org. Philippe Áries e Georges Duby, Companhia das
Letras, 1993
Um
belo panorama sobre o papel da religião
e dos deuses no cotidiano da Roma antiga.
•
Mitologia e Religião na Grécia Antiga, Jean-Pierre Vernant, Martins
Fontes, 2006
Breve
e clássico ensaio sobre o papel dos deuses na Grécia.
•
Deus, Uma Biografia, Jack Miles, Companhia das Letras, 2002
Uma das melhores análises de Deus do ponto de
vista da literatura.