MATEUS e LUCAS
estabelecem, em seus evangelhos, listas dos antepassados de Jesus e, embora
ambos sejam inspirados pelo Espírito Santo, as listas são completamente
diferentes entre si.
Charles Harold Dodd, no livro Segundo as Escrituras, mostra – com farta documentação – que a preocupação prioritária dos evangelistas e epistológrafos era demonstrar três pontos: o Messias seria um sofredor; o Messias ressurgiria da morte; o Messias se identificava com Jesus.
Na verdade, MATEUS e LUCAS usaram a genealogia para “provar” que Jesus era da família de Davi – portanto, Messias “com direito legal” – na ânsia de “comprovar” que, em Jesus, as antigas profecias haviam se cumprido.
A lista de MATEUS começa em Abraão e vai até José. LUCAS pretendeu mostrar mais conhecimento: sua lista, em ordem inversa, começa em José e retrocede até Adão!
Para efeitos didáticos, vamos colocar as duas na mesma ordem e dividi-las em três partes: de Adão a Taré, de Abraão a Davi e daí até José, e compará-las.
De Adão a Taré:
Adão, Seth, Enós, Cainan, Malaleel, Jared, Enoch, Matusalém, Lamec, Noé, Sem, Arfaxad, Cainan, Salé, Heber, Faleg, Reu, Sarug, Nacor, Taré (Lucas 3: 23-38).
Apenas LUCAS lista os antepassados. E já temos a primeira divergência: LUCAS está em desacordo com Gn 11: 10-26, pois inclui um Cainan como filho de Arfaxad e pai de Salé. No Gênesis, o único Cainan é o filho de Seth; Arfaxad é pai e não avô de Salé, como quer LUCAS. Errou LUCAS ou o autor do Gênesis omitiu esse Cainan?
De Abraão até Davi:
Abraão, Isaac, Jacob, Judah, Farés, Esron, Arão, Aminadab, Naasson, Salmon, Booz, Obed, Jessé, Davi (ver Mt 1: 1-16).
Abraão, Isaac, Jacob, Judah, Farés, Esron, Arni, Admin, Aminadab, Naasson, Salé, Booz, Obed, Jessé, Davi (ver Lucas 3: 31-34).
I Crônicas 2: 12 diz que o filho de Obed chamava-se Isaí: deve ser o mesmo Jessé (pai de Davi). A diferença de tradução deve-se (provavelmente) ao equívoco de alguns ao traduzirem o yud (i hebraico) como jota. Talvez...
MATEUS e LUCAS discordam na geração entre Esron e Aminadab:
MATEUS coloca um antepassado (Arão) e LUCAS coloca dois (Arni e Admin). Talvez
Mateus tenha omitido um, e/ou Arão seja o mesmo Arni (ou Admin).
Rute 4: 18-22 concorda com I Crônicas 2: 9-15... que os dois estão errados! Esron foi pai de Ram (seria o mesmo Arão?) que foi pai de Aminadab.
O filho de Naasson chamava-se Salmon, como afirma MATEUS, ou era Salé (Salá), como pretende LUCAS? Nesse caso, I Crônicas 2: 11 e Rute 4: 20 dizem que era Salmon (Salma).
Até aí, os desacordos entre os dois evangelistas – com um pouco de boa-vontade – podem ser tomados por equívocos ou diferenças de tradução. Mas a partir de Davi, as diferenças são absolutamente incontornáveis: na lista de MATEUS há 26 descendentes do rei Davi, de Salomão a José; LUCAS parte de outro filho de Davi, Nathan, e, após 41 descendentes, incrivelmente também chega a José.
Salomão, Roboão, Abias, Asah, Josafat, Jorão, Ozias, Joatão, Acaz, Ezequias, Manassés, Amon, Josias, Jeconias, Salatiel, Zorobabel, Abiud, Eliacim, Azor, Sadoc, Aquim, Eliud, Eleazar, Mathan, Jacob e José (ver Mateus 1: 6-16).
Nathan, Matatah, Mena, Meléia, Eliacim, Jonã, José, Judah, Simeão, Levi, Matat, Jorim, Eliezer, Jesus, Her, Elmadan, Cosan, Adi, Melchi, Neri, Salatiel, Zorobabel, Resa, Joanã, Judah, José, Semei, Matatias, Maat, Nagai, Hesli, Naum, Amós, Matatias, José, Janai, Melchi, Levi Matat, Eli e José (ver Lucas 3: 23-31).
Como claramente se vê, uma lista nada tem a ver com a outra. Afirmando coisas tão diferentes, logicamente, não é possível os dois terem razão.
Estranhamente, por linhas genealógicas diferentes (completamente), ambos chegam a José – mas como, José?
Maria, todos sabem (ou não?), concebeu Jesus por obra do Espírito Santo, pois não havia tido relações sexuais com José nem com ninguém. Portanto, a genealogia correta de Jesus seria a dos antepassados de Maria. Nunca, em nenhuma hipótese, dos de José, com quem Jesus não teve laços de consangüinidade!
Por lógica, é absolutamente impossível as duas listas
estarem corretas, pois são muito diferentes. E se, por acaso uma delas estiver
correta, ainda assim, nada tem a ver com Jesus: ele não era parente de José. Ou
era?
Além do óbvio desacordo entre si, MATEUS e LUCAS entram em conflito com outras Escrituras Sagradas:
1. MATEUS indica Abias como filho de Roboão, rei de Judá, no que está de acordo com I Crônicas 3: 10, mas não com I Reis 15: 1 (mais antigo e confiável, onde o filho de Roboão era Abiam (Abião), e Abias (Abia) era o filho de Jeroboão, rei de Israel na mesma época.
2. MATEUS aponta Jorão como pai de Ozias (Ocozias) e este de Joatão.
“... depois do cativeiro da Babilônia, Jeconias foi pai de Salatiel;
Salatiel, pai de Zorobabel; Zorobabel foi pai de Abiud...”
(Mateus 1: 12-13).
“... os filhos de Jeconias, o prisioneiro, foram Salatiel, Melquiran, Fadaías, Senasser, Jecemias, Hosama e Nadabias; os filhos de Fadaías foram Zorobabel e Semei; os filhos de Zorobabel foram Mosolan e Ananias, sendo Solomit a irmã deles.” (I Crônicas 3: 17-19).
“... os filhos de Jeconias, o prisioneiro, foram Salatiel, Melquiran, Fadaías, Senasser, Jecemias, Hosama e Nadabias; os filhos de Fadaías foram Zorobabel e Semei; os filhos de Zorobabel foram Mosolan e Ananias, sendo Solomit a irmã deles.” (I Crônicas 3: 17-19).
“Zorobabel, filho de Salatiel...” (Ageu 1: 1, Neemias 12: 1).
Sem dúvida, alguém está errado: MATEUS, que diz que Salatiel foi pai de Zorobabel e este, pai de Abiud, ou I Crônicas, que afirma que Fadaías foi o pai de Zorobabel e esse não teve nenhum filho chamado Abiud. Não existindo Abiud, como saber dos descendentes que MATEUS aponta?
Tentar seguir a linha genealógica traçada por LUCAS é pior:
ele não começa por Salomão e sim por Nathan, outro filho de Davi. Obscuro,
Nathan (apesar de mais velho que Salomão) não se envolveu na luta pelo poder
entre seus irmãos, Adonias, Absalão, Amon e Salomão. Mesmo assim, LUCAS inclui
nos descendentes Salatiel e Zorobabel. Para ele, o pai de Salatiel seria Neri,
e Zorobabel seria pai de Resa, contrariando tanto MATEUS quanto Ageu e I
Crônicas. A não ser que se trate de outro Salatiel e outro Zorobabel – embora
não sejam nomes tão comuns.
Ficamos (também) sem a certeza se o pai de José, o carpinteiro, era Jacob, como afirma MATEUS, ou Eli, como pretende LUCAS. Como levar a sério duas listagens que não só divergem entre si, como ainda contradizem Gênesis, I Crônicas, I Reis, II Reis, Rute, Ageu, Neemias?
“... a verdade não pode existir em coisas que divergem...” (São Jerônimo).
Não temos dúvida alguma que Jesus era o Messias. Mas nos parece que ele não nasceu na família do rei Davi, pois mesmo que José fosse descendente da família real nem assim Jesus teria qualquer laço familiar com Jessé e Davi, pois não era filho natural de José. Ou era?
Segundo Márcio Rogério Garcia, da Igreja Evangélica Assembléia de Deus, Pelotas, RS, essa contradição não existe, e é facilmente explicável: a concepção imaculada de Maria é ressalvada em MATEUS, onde não diz que José é pai de Jesus:
“Jacó foi pai de José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus” (Mateus 1: 16).
E, segundo ele, a genealogia traçada por LUCAS difere da de MATEUS por um simples motivo: não se trata da lista dos antepassados de José e sim dos de Maria (que também seria da família real – e descendente de Davi). Eli, apontado na lista de LUCAS como sendo “pai” de José, seria seu “sogro”, considerado “pai” pelo casamento com Maria.
Seria explicação perfeita, não houvesse documentos
garantindo ter sido Maria filha de Ana e Joaquim. Mas por que não crer que Eli
e Joaquim eram “o mesmo”? Talvez Eli seja diminutivo de Eliaquim, um outro nome
para Joaquim...
Claro que a genealogia traçada por LUCAS contém, a partir de Davi, 15 gerações a mais que a de MATEUS, com o que Maria deveria ter cerca de 300 anos de diferença de idade para com José. Poderia a genealogia de José, traçada por MATEUS, estar simplificada. Sempre há uma explicação.
MATEUS traça – com certeza – a genealogia de José. Por que cita Maria? Por que, numa genealogia masculina, cita outras quatro mulheres, todas elas adúlteras? MATEUS cita Tamar, Raabe, Ruth e “a mulher que foi de Urias” (nem quis colocar o nome de Betsabá). E se o objetivo da genealogia era exaltar Jesus como descendente do rei Davi por que citar José como descendente direto de Jeconias?
“... ninguém da sua geração se sentará no trono de Davi e reinará mais em Judá” (Jeremias 22: 30)?
Por que LUCAS inicia sua genealogia dizendo que Jesus era “como se supunha” (supostamente) filho de José? O que, exatamente, ele quis dizer?
Os apócrifos Evangelho de Mateus, Proto-Evangelho de Tiago e Livro da Infância de Maria dariam razão a M. R. Garcia: Maria pertenceria à família do rei Davi. Segundo esses livros – não aceitos por nenhuma Igreja – José não era carpinteiro: era “tekton” (“pedreiro”, “biscateiro”, “diarista”) e os pais de Maria eram pessoas “de posses” – logo, Jesus não teria nascido pobre, como as Igrejas ensinam. Só não fica explicado o porquê de uma família “de posses” dar sua jovem filha, em casamento, a um velho “tekton”.
Alguns detalhes da genealogia de Mateus
A questão pode ser dada pela palavra do aramaico que é "gabra" ela seria análogo ao termo "baal" no hebraico. Normalmente essa palavra designa marido, mas ela tem um significado mais abrangente que significa senhor. Segundo alguns aramaicistas como Paul Younan e Andrew Gabriel Roth eles atestam que o termo "grabra" pode se referir tanto a marido como pai.
Quando o texto final do manuscrito diz Yossef grabra Miriyam temos uma possível interpretação que pode ser tanto Yossef marido de Miriyam como Yossef pai de Miriyam.
Outro fato importante é que o autor diz que ele cita 3 séries de 14 gerações "Mateus 1:17" se contarmos todos os nomes vemos que se contarmos os nomes termemos 41 gerações se considerarmos a interpretação tradicional, mas se considerarmos a segunda hipótese teremo exatamente as 42 gerações que o verso 17 atesta.
Realmente se investigarmos as genealogias a risca segundo os livros de Reis e Crônicas existem gerações suprimidas, mas temos que ater para o recurso que o autor usou.
Quem intende um pouco afundo de Guematria (recurso que também é presente no Tanach (Antigo Testamento) e no Talmud) vemos que o número 14 é correspondente ao nome de David. O fato do autor dividir as genealogias em 3 séries de 14 gerações indica que uma possível associação de David com o Messias pois umas das promessas sobre o Messias é que ele descenderia de David, tanto que um dos títulos do messias é "ben David".
Outro fato é que é claro que as genealogias de Mateus e de Lucas se destiguem. A de Mateus descende de Shlomoh (Salomão) e a de Lucas descende de Natan que também é filho de David (ver II Samuel 5:14).
Se a tese de que a genealogia de Mateus é referente a Miriyam e não a Yossef, concluímos que os dois autores tentam indicar que Yeshua era descendente de David tanto por parte de pai quanto por parte de mãe.