Denúncias de intolerância religiosa crescem mais de 600% em 2012
Religiões de matriz africana são as mais prejudicadas, ouvidor
da Seppir acredita em racismo.
A quantidade de denúncias contra intolerância religiosa cresceu mais 600% em 2012 segundo informações do Disque 100 da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Em 2011 apenas 15 denúncias foram feitas, em 2012 foram 109 e a secretaria afirma que este número não representa a real dimensão do problema que existe no país.
Muitas pessoas não conhecem o serviço e outras acabam se dirigindo às delegacias ou órgãos estaduais de proteção dos direitos humanos, já que não há nenhuma instituição que seja responsável por contabilizar todos os dados nacionais, o que dificulta saber os números exatos de denúncias em todo o país.
De acordo com o ouvidor Carlos Alberto de Souza e Silva Junior, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), que também recebe denúncias, a maioria dos crimes de intolerância acontece contra quilombolas, indígenas e os que professam religiões de matriz africana.
“Apesar dos avanços das políticas sociais e raciais, é perceptível uma reação intolerante, preconceituosa, discriminatória e racista e eu já percebo um certo recrudescimento de alguns direitos”, disse o ouvidor.
Silva Junior diz ao portal UOL que algumas igrejas evangélicas neopentecostais pregam o ódio contra outras religiões e precisam ser tratadas com cautela. “Há ao menos um caso denunciado à ouvidoria de uma igreja cujo líder espiritual vem revelando esse ódio contra as religiões de matriz africana, associando-as à coisas do diabo. Sabemos que esse tipo de pregação, feita por um líder religioso, afeta [influencia] a muitos de seus seguidores.”
“Eu vejo tudo isso como um fenômeno umbilicalmente ligado ao racismo, algo que não pode ser desassociado da questão do preconceito racial. Tanto que, na Seppir, não recebemos nenhuma denúncia dando conta de que outras religiões, além daquelas de matriz africana, sejam alvo de discriminação.”
Ministra diz que evangélicos querem acabar com religiões africanas
A ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros, disse hoje (21) que os ataques às religiões de matriz africana chegaram a um nível insuportável. “O pior não é apenas o grande número, mas a gravidade dos casos que têm acontecido. São agressões físicas, ameaças de depredação de casas e comunidades. Nós consideramos que isso chegou em um ponto insuportável e que não se trata apenas de uma disputa religiosa, mas, evidentemente, uma disputa por valores civilizatórios”, disse ao chegar ao ato lembrando o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa no Vale do Anhangabaú, centro de São Paulo.
O número denúncias de intolerância religiosa
recebidas pelo Disque 100 da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência
cresceu mais de sete vezes em 2012, quando comparada com a estatística de 2011,
saindo de 15 para 109 casos registrados.
Para a ministra, os ataques são motivados
principalmente por alguns grupos evangélicos. “Alguns setores, especialmente
evangélicos pentecostais, gostariam que essas manifestações africanas desaparecessem
totalmente da sociedade brasileira, o que certamente não ocorrerá”, disse
Luíza, que acrescentou que esta semana deverá ser anunciado um plano de apoio
às comunidades de matriz africana. “Nós queremos fazer com que essas
comunidades também sejam beneficiadas pelas políticas públicas”, completou.
No ato promovido pela prefeitura paulistana foi
lançada a Secretaria Municipal de Promoção da Igualdade Racial. Segundo o
prefeito, Fernando Haddad, a celebração é uma forma de fazer com que as pessoas
que ainda têm preconceito contra as religiões afrobrasileiras reflitam sobre a
importância da tolerância. “Eu penso que a expressiva maioria dos moradores de
São Paulo abraça essa causa de convivência pacífica, tranquila, com respeito e
a tolerância devida ao semelhante. Agora, existe uma pequena minoria para qual
o recado aqui é dado: que há uma grande maioria que quer viver tranquilamente”,
disse.
O recado da tolerância também está sendo
promovido pelo grupo multirreligioso Paulistanos pela Paz, que há 8 anos atua
para conscientizar principalmente a juventude. “Nós estamos coordenando visitas
a escolas, faculdades para dar palestras, seminários, para trazer esse
questionamento à tona. Porque a intolerância brota da incapacidade de conviver
com o diferente”, disse o Reverendo Mahesh, coordenador do grupo e
representante do Hinduísmo Hare Krishna.
Membro do Centro Cultural Ilê-Ifa, o maestro
Roberto Casemiro, também defendeu a atuação com a juventude como forma de
combater o preconceito. Na opinião de Casemiro, para muitos jovens, em especial
os envolvidos em grupos que promovem o ódio, como os skinheads,
falta conhecimento e falta cultura. “E quem não tem nem conhecimento, nem
cultura, não tem respeito”.
Evangélico de confissão luterana, o pastor Carlos
Mussukopf, acredita que a melhor maneira de evitar o preconceito é unindo as
diferentes religiões entorno de objetivos e ideias comuns. “Devemos procurar o
que nos une, o que nos unifique, o que nós temos em comum. E que a gente
também saia da teoria, dos encontros de diálogo e passe para a prática. Existem
tantos desafios na sociedade que nós vivemos que exigem uma ação unificada
também das religiões. Vamos ver questão da população de rua, da
natureza”, disse.
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