sábado, 15 de junho de 2013

INQUISIÇÃO - BRANCA DIAS



Branca Dias foi uma descendente dos antigos judeus portugueses, que a memória regional identificava como uma cristã-nova vítima da ação do Tribunal da Inquisição entre os séculos XVII e XVIII.

Há três Brancas, explica o professor de história religiosa Carlos André. Uma delas já tem a existência histórica comprovada: viveu em Pernambuco e foi processada pela Inquisição como judaizante no século XVI. Há uma outra que teria vivido em Apipucos (hoje município do Recife), segundo a escritora pernambucana Joana Maria de Freitas Gamboa em o “drama histórico” “Branca Dias dos Apipucos”, cuja narrativa versava sobre uma rica cristã-nova, moradora perto do Recife, que teria sido presa pela Inquisição quando da Guerra dos Mascates (1710-1711), mas sem documentação comprobatória de sua existência. A Branca que nos interessa teria vivido em Gramame, Paraíba, no século XVIII.

Há ainda uma quarta Branca Dias. Esta teria nascido em Viana, no Minho em Portugal, que no final dos anos 1520, casou-se com um cristão-novo chama Diogo Fernandes. Denunciada pelo crime de judaísmo em 1540 por sua própria mãe e uma irmã, em face da pressão do Santo Ofício. Depois de confessada a culpa ficou presa durante cinco anos. Ao conseguir a liberdade, Branca Dias fugiu para o Brasil com seus filhos (3 meninos e 8 meninas) desembarcando na cidade do Recife onde seu marido em Olinda onde era comerciante de tecidos e senhor de engenho. (Dicionário Mulheres do Brasil - Maria Aparecida Schumaher, Érico Vital Brasil)

Se Branca Dias não é comprovada historicamente, se ela não existiu historicamente e realmente ela não tem comprovação de existência ou qualquer documentação, nos interessa, no entanto, como um objeto básico de memória e como uma exposição essencial daquilo que a sociedade imagina como tendo sido o Tribunal do Santo Ofício. É memória no sentido aristotélico.

 Branca Dias é a “personagem” histórica – ainda que ficcional – mais controvertida da Paraíba. A biografia dela é repleta de fatos contundentes. Sua própria existência é posta em dúvida. Branca foi, segundo o “Livro de Branca”, de J. Abreu, uma judia vitimada pela Inquisição. Naquela época – século XVIII – os judeus viviam sob o terror da conversão forçada decretada desde o século XV, obrigando os “filhos de Israel” a se tornarem cristãos na marra. Até o Papa chegou a questionar tal obrigatoriedade, mas acabou se deixando levar pelas pressões do Império Português. Com a conversão, o judeu – que pensava se livrar da perseguição após ter se convertido – passava a ser tido como cristão-novo ou criptojudeu, ou seja, cristão nas aparências públicas, mas ainda judeu nos hábitos e no coração.

A memória atual do ficcional caso de Branca Dias, na Paraíba, demonstra a força deste passado.


BRANCA DIAS


A história de Branca é paradigmática. Teria sido vítima da paixão anormal de um padre que desejava a judia a qualquer preço. Em nome do amor que tinha pelo noivo, também judeu, Branca resistiu a todas as pressões. A história é marcada pelos mitos que formam o imaginário da nossa gente. Tendo ou não ocorrido, sob a narrativa heróica está o mitologema mais caro da alma luso-brasileira: a “saudade do impossível”. Esta saudade conduz Branca ao embate suicida contra os inquisidores. Ela sabe que não poderá ter uma vida normal ao lado do seu amado. Sabe que poderá perder tudo para o confisco inquisitorial. Sabe que só lhe restará “lembrança do que TERIA SIDO a vida sem a Inquisição”. Mesmo assim, Branca não se entrega às pressões do padre... e morre queimada por causa de seu destemor.

Nós, brasileiros, buscamos este paradigma heróico em nós mesmos, nos nossos políticos, nos nossos artistas e até nos jogadores que representam o “país do futebol” na Copa do Mundo. Branca, tendo ou não existido, leva em si um pouco da nossa alma. Ou, para usar o termo científico forjado por Arnold Toynbee (um dos maiores historiadores deste século), Branca Dias diz muito do “espírito de uma época e de um povo”.

Este esforço intelectual pela elaboração de um panteão de heróis especificamente paraibanos podia ser encontrado, inclusive, em discursos de políticos. Pinheiro menciona conferência proferida pelo presidente do estado, Castro Pinto, no Rio de Janeiro, por ocasião  da comemoração do aniversário da cidade da Paraíba do Norte em 05 de agosto de 1920. No discurso ele afirma que:

“A qualidade fundamental que encontro no povo parahybano é a vontade  heróica, a firmeza de caracter, a inflexibilidade na linha de conducta, o saber querer para agir com acerto, a consciência do dever norteando os seus actos de vida (...); sirvo-me [para provar a tese] dos grandes nomes  representativos da evolução da Parahyba, desde os primórdios do povoamento até hoje.” (apud Ferreira, 2002, p.165).

 Dentre os inúmeros nomes que cita, a exemplo de Branca Dias, José Peregrino de Carvalho, Antonio Borges da Fonseca, D.Vital, Manuel de Arruda Câmara, Epitácio Pessoa, e outros, o presidente Castro Pinto destaca André Vidal de Negreiros, que, segundo ele, fora superior a todos os heróis de sua época.

Branca teria sido a realização de uma das características do imaginário colonial brasileiro muito bem definidas pelo antropólogo francês Gilbert Durand. Ele diz que o nosso imaginário é composto de vários mitologemas e dois desses mitologemas vão nos interessar especificamente para o estudo da Inquisição.

 O professor Carlos André em palestra proferida no Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, falando sobre as famílias descendentes de judeus que aqui na Paraíba viveram, destaca os membros da família de João Inácio Cardoso Darão. Esse, segundo o professor, conseguiu fugir aqui das perseguições, foi para o Ceará e lá se casou com uma moça da família Alencar, em Barbalha. Depois volta e se refugia em Mari do Seixas, saindo de lá para Pombal. Era uma família de artesãos, que passaram a arte da ourivesaria para os filhos.

Era uma família pequena. João Inácio era casado com Catarina Liberato de Alencar. Deles descende o professor Inácio Tavares de Araújo e José Romero Araújo Cardoso, que é escritor e professor de Geografia em Mossoró. O interessante dessa família é que eles conservaram na memória familiar a sua ascendência judaica e conservam viva  na memória a história de Branca Dias, da Branca Dias da Paraíba.

Segundo o professor Inácio, na memória da família (não tem documento) João Inácio e Francisco se diziam que eram filhos de Simão Dias Cardoso de Araújo, morador no Engenho Velho, nas margens do Gramame. Ora, esse Simão Dias aqui da margem do Gramame é dado, embora não tenha documentação, como pai da própria Branca Dias. Estou apenas passando aquilo que colhi na família.

Outro paraibano ilustre que defende a cidadania paraibana de Branca Dias é o Irineu Ceciliano Pereira da Costa, da cidade de Pocinhos e aluno do padre Rolim  em Cajazeiras, tendo mais tarde mudado o seu nome para Irineu Jofily.

Irineu Jofily foi promotor público em São João do Cariri (1867), Juiz de Direito de Campina Grande, Deputado provincial pelo Partido Liberal, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Jornalista (A Gazeta do Sertão), deputado geral em 1889, cuja posse foi impedida pela Proclamação da República voltando para Campina Grande no mesmo anos onde acompanhou as definições dos limites do território paraibano.

Irineu Jofily em seus escritos afirma que a tradição nos diz que Branca Dias, de alta posição na sociedade colonial pela ilustre família a que pertencia e pela opulência em que vivia no seu engenho próximo a cidade da Parahyba, o que contrastando com o seu miserando fim, resultado da perseguição que lhe moveu o terrível Tribunal, influiu de tal modo na imaginação popular, que o seu nome tem atravessado três séculos.

Outro artigo de Irineu sobre o tema foi publicado no jornal A União, em 24 de agosto de 1901. Neste texto, Joffily lembra os gracejos que ouvira, quando estudante de Direito no Recife, dos colegas de outras províncias:

“Há quarenta anos, pouco mais ou menos, quando fazia o meu curso de preparatórios na cidade do Recife, ouvia freqüentemente entre os colegas, e em reuniões familiares, pronunciar o nome de Branca Dias, célebre paraibana de raça judia e vítima da inquisição. „A Paraíba é a terra de Branca Dias, os paraibanos descendem de judeu, não comem toucinho, etc., dizia-se geralmente nessas ocasiões, pilheriando com os filhos desta terra (JOFFILY, I., 1977: 445)”.

 No mesmo artigo, Joffily escreve: “Desde tenra idade que ouço falar nessa célebre mulher [Branca Dias] e tão célebre que o seu ruidoso processo e deplorável fim nas fogueiras do Santo Ofício, deu lugar que os paraibanos seus patrícios ficassem suspeitos de judaísmo pelos habitantes das capitanias vizinhas (JOFFILY, I., 1977: 177)”.

O bacharel afirma que “a curiosidade e o interesse que me desperta o assunto, obriga-me a encará-lo com o fim de convidar a quem quer que o possa esclarecer, a vir a público JOFFILY, I., 1977: 177)”.

Quatro anos depois, no jornal A União, Joffily recuperava o convite e transcrevia a única resposta obtida após o primeiro apelo, do Cônego Bernardo de Carvalho Andrade:

“Li no „Commercio de Pernambuco de 21 de março findo seu bem lançado artigo sobre a célebre Branca Dias, e muito agradeço a fineza de mo ter enviado, porque seria por mim ignorado, desde que não assino aquele periódico.

“Pouco adiantarei ao que sabe o meu amigo da história da célebre heroína paraibana, pois jamais pude obter documento escrito que se referisse à vida e fim trágico que teve. Mas, ainda que ao nome dessa paraibana célebre ligue o preconceito popular um histórico fabuloso e fatídico que não traz a luz precisa à sua biografia, não se pode pôr em dúvida ter ela existido na Paraíba, pois disto dão testemunho o território e as ruínas do engenho que lhe pertenceu, e onde residiu.

“Até o ano de 1880, quando o meu caro amigo tomava assento na Assembléia daquela Província, hoje Estado, era aquela propriedade respeitada de tal sorte pelo povo ignaro, que dela não cortavam sequer uma tabica para açoitar cavalos, por terem por malditos os próprios matos que ali vegetavam, e se alguém mais desabusado atrevia-se a fazê-lo, os demais vaticinavam a morte dele ou do cavalo, que se morressem de velho seria a morte sempre atribuída à imprudência de se ter servido da tabica daqueles matos.

“Depois do ano memorável de 1877 projetei mudar-me do Sertão por causa do flagelo da seca, e amigos nossos da capital procuravam convencer-me que seria de vantagem minha colocação naquela zona próxima ao litoral.

“Um desses amigos, o Tenente João Pinto de Vasconcellos, que então vivia e era senhor de propriedade que pertencera à heroína de que se ocupa, ma ofereceu por venda, que não se realizou por não assentar a mulher do mesmo Pinto, que a houve por herança de antepassados.

“Não visitei aquela propriedade por não ter efetuado a compra, mas sei que é situada à margem do Rio Gramame, ao S. da capital da Paraíba, não longe da foz do mesmo rio. Sei mais que são bem visíveis os destroços das edificações que ali existiam e que o preconceito dos ignorantes não tem servido de inteira garantia à propriedade, porque os poucos escrupulosos se têm apossado de parte de seus terrenos.

“O finado Comendador Dr. Lindolpho José Correia das Neves, de talento tão robusto e cultivado, que faz honra à terra aonde nasceu, sabendo que eu pretendia comprar aquela propriedade me garantiu ser de ótimos terrenos para a agricultura, e que se conservava coberta de matos. Seu espírito ativo e aguçado a criticar com jocosidade, não perdeu o ensejo de dizer-me: - „Espera por certo encontrar o terreno de Branca Dias, pois de outro modo não se explicaria pretender V. comprar aquela propriedade inculta e sazonática. Não duvido que alguns dos seus descendentes desconhecidos entre o povo e depositários do segredo lho tenham revelado. Não haverá entre os de sua família alguém daquela procedência?

“Isto motivou larga conversação sobre o assunto, dizendo-me ter visto notas sobre o auto-de-fé daquela notável paraibana, notável não somente pela origem de sua ascendência, de quem houve a grande fortuna que possuia, como pelo faustoso e principesco tratamento que ostentava (JOFFILY, I.,1977: 445-447)”.

Ignoraria o nome do engenho visitado pelo cônego Bernardo, não fossem as pistas dadas por Zilma Pinto. A propriedade era o Engenho Velho, e a mulher do tenente Vasconcelos, Alminda Manoelita Cavalcanti d’Albuquerque.

Existe a hipótese, aventada pela autora, de que este engenho tenha sido levantado no século XVI por certo Jorge Thomas, “senhor do distrito de Gramame”. Há um Jorge Thomaz (ou Thomas) Pinto cristão-novo, depoente na visitação inquisitorial de 1591-5, a primeira que o Santo Ofício delegou à América Portuguesa.

Zilma Pinto arrisca, portanto, que o engenho Velho foi criado e habitado por cristãos-novos desde o século XVI (PINTO, 2006: 164-165)
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Porque relacionada à história da Inquisição na capitania, a Branca Dias paraibana engendra uma questão histórica: a presença cristã-nova na região e sua relação com a suposta mártir local. Escrita no século XIX, embora só publicada na íntegra em 1912, a História da Província da Parahyba, de Maximiano Lopes Machado, talvez seja um dos primeiros livros de história escritos na Paraíba que trata da lenda de Branca Dias.

 No quarto capítulo do tomo II, Machado discorre sobre as “fogueiras da Inquisição [que vieram] agravar ainda mais a sua sorte [da Paraíba]” na época colonial. Sob orientação do bispo do Rio de Janeiro e delegado do Santo Ofício, D. Frei Francisco de São Jerônimo, “os familiares [do tribunal] se poseram em  O Tribunal do Santo Ofício de Lisboa – ao qual o Brasil era subordinado – realizou pelo menos três “visitações” a partes da América Portuguesa: a Bahia, Pernambuco, Itamaracá e Paraíba (1591-1595), à Bahia (1618-1620) e ao Grão-Pará e Maranhão (1763-1769).

Os documentos sobre o casal de proprietários do engenho em 1877, citados pela autora, estão no Arquivo da Catedral Basílica da Paraíba.

Paraibano nascido em 1821, Maximiano Machado, assim como Joffily, também cursou Direito em Pernambuco. Depois de formado, exerceu cargos de magistratura e delegacia, se envolveu na Revolução Praieira – teve de se esconder até a decretação da anistia dos revoltosos, em 1851 –, chefiou o Partido Liberal em Campina Grande nos anos 1850 e foi deputado provincial na Paraíba entre 1858 e 1861. Maximiano Machado ocupou o cargo de orador do Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano. Faleceu em 1895.

Diz Maximiano Machado que “A Parahyba foi uma das [capitanias] mais tributadas neste gênero de imposição ao tremendo tribunal. Sem averiguações [...] foram arrancadas dos braços das famílias e da pátria, de 1731 em diante, as seguintes pessoas [...]

(MACHADO, 1912: 427)”. Em três páginas, com base na pesquisa de Varnhagen – paradigma da historiografia brasileira no século XIX – sobre os “brasileiros” condenados pela Inquisição lusa, Maximiano Machado cita os habitantes da Paraíba vítimas do Santo Ofício, de 1731 em diante. Mas, quanto a outros nomes que, supõe o autor, se perderam na história, um é digno de menção pelo bacharel:

“Se não desapareceu com as listas, é bem provável que á este arbítrio [o autor se refere ao fato de que os nomes dos penitenciados que saíam em autos-de-fé privados não constavam nas listas] se deva a omissão do nome da formosa e gentil donzella Branca Dias, que a tradição de mais de um século refere como sendo arrebatada aos desoito annos de edade do regaço materno para ser arremeçada aos carceres negros dos Estáus em Lisboa. Não lhe valeram formosura, innocencia, família, lagrimas, nem a consternação d‟estranhos, para desapparecer, depois do supplicio da corda, na fogueira expurgatoria da Inquisição, como as duas infelizes relaxadas em carne, Guiomar Nunes e Isabel Henriques! Quaes seriam as culpas de Branca Dias naquella edade de innocencia e de amor? Não se sabe, porque os processos da justiça eram feitos de conformidade com a sentença que se pretendia dar” (MACHADO, 1912: 430-1).

Guiomar Nunes, relaxada em carne, é uma das “pernambucanas ilustres” que Henrique Capitolino Pereira de Mello insere em seu livro sobre as heroínas pernambucanas (MELLO, H., 1980). Natural de Pernambuco, moradora no engenho de Santo André, na Paraíba, casada com o latoeiro Francisco Pereira, Guiomar foi condenada como convicta, negativa e pertinaz no crime de judaísmo, sendo relaxada ao braço secular no auto-de-fé de 17 de junho de 1731. Isabel Henriques, cristã-nova solteira, de 41 anos, natural de Portugal e moradora no engenho Velho – o mesmo engenho que, conforme o testemunho do cônego Bernardo, o povo acreditava ter sido a morada de Branca Dias na Paraíba –, foi condenada a cárcere e hábito penitencial perpétuo, e não relaxada em carne, como quer Machado. (Crítica de FERNANDO GIL PORTELA VIEIRA)

 Ainda assim, são duas personagens históricas que marcam a história da ação inquisitorial na Paraíba no século XVIII (MACHADO, 1912: 427-8; MELLO, H., 1980: 113-114; NOVINSKY, 2002: 228).

O crítico Fernando Gil Portela Vieira prossegue nos seguintes termos: “Mas é a forma pela qual Machado se refere à figura de Branca Dias que impressiona. Seu livro também não fornece respostas documentais sobre a existência da personagem. Pelo contrário, Branca Dias é tratada de modo bem romântico – “donzela”, “formosa”, “gentil”, cheia de “inocência” e “amor”. Qualidades que, se compartilhadas pelos demais paraibanos, faria qualquer suposto descendente da conversa se orgulhar de antepassada tão virtuosa. Ao afirmar que a tradição sobre a morte de Branca Dias pela  Inquisição é de “mais de um século” – o que, na pior das hipóteses (a partir do ano da morte do autor, 1895), remonta até pelo menos o final do século XVIII –, o livro de  Machado também descarta a possibilidade de a lenda ser criação literária. Vivia na memória dos paraibanos e, como toda memória, tinha um aspecto presencial. A personagem continuava presente na região, mesmo tanto tempo depois de seu suposto martírio.”

É o que se depreende da questão proposta por Joffily no Commercio de Pernambuco: “Diz-se que uma das mais distintas famílias da Paraíba é descendente de BRANCA DIAS. Será exato? Pergunta Fernando Gil Portela Vieira.

 A historiografia tem destacado a participação dos cristãos-novos na colonização da Paraíba, para além das primeiras etapas de povoamento, no século XVI. É certo que da conquista da capitania participou o cristão-novo João Nunes, tido como o “tesoureiro” da comunidade de cristãos-novos de Olinda. Nunes e seu irmão, Diogo Nunes Correia, construíram quatro engenhos na Paraíba; Diogo, aliás, morava na capitania. Fernanda Lustosa destaca o comportamento, mais que “judaizante”, crítico da religião católica e de seus dogmas, manifestado pelos conversos paraibanos ainda no século XVI (LUSTOSA, in GORENSTEIN; CARNEIRO, 2002: 134-137; FEITLER, 2003: 29; 150-152).

Argumenta Fernando Gil que o grupo de cristãos-novos judaizantes que persistia na lei mosaica aqui na Parahyba, foi desbaratado a partir de 1726, quando uma primitiva denúncia levou à prisão de cinqüenta pessoas, duas das quais morreram na fogueira – uma delas, Guiomar Nunes – e oito pereceram no cárcere (LUSTOSA, in GORENSTEIN; CARNEIRO, 2002: 139-143). Nenhum destes presos, porém, foi a “gentil donzela” Branca Dias da tradição paraibana.

A perseguição aos cristãos-novos judaizantes da Paraíba no século XVIII é que situou a personagem Branca Dias naquela centúria. O histórico deste grupo é a principal evidência explicativa da datação apontada por Machado para a prisão de Branca Dias, em meio aos conversos presos nos Setecentos. É necessário, a propósito, destacar dois pontos: o caminho que Irineu Joffily propunha para provar a existência de Branca Dias na Paraíba e a explicação para o fato de o bacharel, em meio ao turbilhão das atividades políticas e jornalísticas, fazer da busca de Branca Dias uma verdadeira meta paraibana.

A razão do primeiro ponto está no valor tributado por Joffily à história como meio legítimo de conhecer o passado. Se Irineu acreditava que Branca Dias realmente existira e vivera na Paraíba, isto não o demitia da obrigação de provar a realidade desta personagem. Para isso, só haveria um caminho: que fossem empreendidos estudos históricos em seu Estado. No artigo publicado no Commercio de Pernambuco em 1897, Joffily acatava a necessidade de uma pesquisa nos arquivos da Inquisição em Lisboa para investigar o assunto. Esta é uma realidade válida ainda hoje para os pesquisadores do Santo Ofício. Mesmo o estudo de um único processado pelo tribunal da fé residente no Brasil requer a pesquisa nos acervos da Torre do Tombo. Como afirma Ronaldo Vainfas, “Estudar a fundo a Inquisição portuguesa, seja sua atuação no Brasil, seja noutras partes, é tarefa que exige visita ao Arquivo Nacional da Torre do Tombo em Lisboa (TAVARES et alii, 2005).

Se hoje, com o número extenso de pesquisas realizadas nos arquivos inquisitoriais, esta necessidade continua insuperável, quanto mais em fins do século XIX. No artigo citado acima, Joffily relata a ajuda que pedira ao historiador pernambucano Francisco Augusto Pereira da Costa. Em artigo publicado na Revista do Instituto Arqueológico de Pernambuco, Costa havia mencionado o nome de todas as vítimas da Inquisição em Pernambuco conhecidas àquela altura. Uma destas vítimas era filha de certa Branca Dias. Irineu – vemo-lo leitor de publicações historiográficas –, intrigado com a questão, escrevera a Costa pedindo esclarecimentos sobre quem era esta Branca Dias. O pernambucano respondeu:

“O fato que refiro no meu trabalho, da prisão de Brites Fernandes, filha de Diogo Fernandes e de Branca Dias, que teve lugar em Pernambuco, em 1601, é referido por Borges da Fonseca na sua Nobiliarquia, mas com relação especial a BRANCA DIAS, o que sei, consta de uma tradição muito vulgar entre nós e já com foros de cidade [sic] por mais de uma publicação e eu mesmo já utilizei dela em um livrinho que publiquei em 1884, o Mosaico Pernambucano (...) [Costa faz uma referência que intriga Joffily:]

BRANCA DIAS seguiu para Portugal e lá morreu nas fogueiras da Inquisição de cujo auto de fé existe um quadro no Convento de São Francisco na cidade da Paraíba (RIHGB, 1966: 178.

Pereira da Costa diz acreditar que essa Branca Dias fosse realmente a mãe de Brites Fernandes e mulher de Diogo Fernandes – hipótese que seria comprovada no século XX por historiadores como Gonsalves de Mello (MELLO, G., 1996,  especialmente a parte dedicada ao casal de cristãos-novos Diogo Fernandes e Branca Dias) –, o qual, feitor do engenho de Camaragibe, poderia ter comprado um engenho nas terras de Apipucos, junto ao riacho da Prata, que seria, segundo o historiador, o engenho Dois Irmãos (RIHGB, 1966: 179). Irineu, todavia, objetou que só o fato de existir um quadro do auto-de-fé de Branca Dias no Convento de São Francisco, na Paraíba, mostrava que a vítima era paraibana, não pernambucana.

Este era um dos motivos para situar Branca Dias na Paraíba; os outros, a tradição popular no Estado, as piadas que Irineu ouvira na faculdade no Recife e nas conversas familiares... Não faltavam razões para supor que Branca Dias fosse paraibana. Ou melhor, faltava uma: encontrar um documento que o comprovasse.

Irineu adotará uma postura bem mais incisiva quanto à pesquisa histórica sobre Branca Dias quatro anos depois, no jornal A União. Neste texto, após reproduzir a carta do cônego Bernardo (transcrita acima), o bacharel escreve: “O estudo de um fato histórico vale por si só muito mais do que todas as efêmeras produções literárias [...] semelhantes a essas nuvens róseo-douradas do fim do dia, que um momento alegram a vista e logo desaparecem nas trevas da noite (JOFFILY, I., 1977: 447)”. Não poderia ser mais clara a referência a romances, peças, contos, enfim, textos ficcionais, que, se romanceavam a trajetória de personagens históricas, sublimavam a pesquisa documental. Tendo em vista o contato com historiadores do Nordeste, como Pereira da Costa, e a carreira de magistrado – a mesma de seus contemporâneos Henrique Pereira de Mello e Maximiano Machado, membros do Instituto Arqueológico e Histórico pernambucano (MELLO, H., 1980: s/p) – não terá sido impossível que Joffily tivesse um contato com algumas obras ficcionais sobre a cristã-nova Branca Dias.

De todo modo, Irineu descarta a literatura para elucidar o problema da existência de Branca Dias na Paraíba. Os contos e as estórias ouvidas até ali sobre o assunto, se “alegram a vista”, logo deixam o bacharel nas “trevas da noite”. Assim sendo, “Passada a idade juvenil [...] quando a razão entra no seu completo desenvolvimento, o homem tem o dever de empregar-se em estudos mais sérios, de resultados reais, e nenhum mais importante do que os históricos (RIHGB, 1966: 447 ”. finda com estes termos o crítico literário Fernando Gil Portela Vieira.

 Compactuo da ideia de que não há autor nem livros superados, se pensados em determinadas épocas e contextos da escrita, sendo assim, “a história é necessariamente escrita e reescrita a partir das posições do presente, lugar da problemática da pesquisa e do sujeito que a realize”. Portanto, a discussão historiográfica relativa a Branca Dias deve ter como base de análise o entendimento daquilo de Michel de Certeau (1982) chamou de lugar social, ou seja, a inserção do autor no contexto de produção da sua escrita e das suas escolhas teóricas e metodológicas, para assim, entender o discurso histórico construído pelo autor.


 
Loja Maçônica Branca Dias, João Pessoa, Paraíba, Brasil





Recomenda-se a leitura dos livros e sites quando indicados como fontes. Os posts contidos neste blogger são pequenos apontamentos de estudos. 

sexta-feira, 14 de junho de 2013

INQUISIÇÃO NA PARAÍBA





Se o teu irmão, filho de tua mãe
ou teu filho ou tua filha, ou tua mulher que repousa sobre o teu seio, ou o amigo a quem amas como à tua alma, te quiser persuadir, dizendo-te em segredo: Vamos, e sirvamos a deuses estranhos (...), não cedas ao que te diz, nem o ouças, nem teus olhos lhe perdoem (...), mas logo o matarás; seja a tua mão a primeira sobre ele, e depois todo o povo lhe ponha a mão. (...)Se ouvires alguns que dizem: Alguns filhos de Belial saírem do meio de ti, e perverteram os habitantes da sua cidade, e disseram: Vamos e sirvamos aos deuses estranhos, que vós não conheceis; informa-te com solicitude e diligência, e, averiguada a verdade do fato, se achares ser certo o que se disse, e que, efetivamente se cometeu tal abominação, imediatamente farás passar à espada os habitantes daquela cidade; e destruí-la-ás com tudo que há nela, até aos gados. Juntarás também no meio das suas praças todos os móveis que nela se acharem, e queimá-los-ás juntamente com a cidade, de maneira que consumas tudo em honra do Senhor teu Deus, e que seja um túmulo perpétuo, e não seja mais reedificada, e não se te pegará às mãos nada deste anátema, para que o Senhor aplaque a ira do seu furor, e se compadeça de ti (...).” (Bíblia Sagrada, Deuteronômio, 13, 6-9 e 12-27. Grifos nossos.),



No ano de 1492 cerca de 93 mil judeus foram expulsos da Espanha pelos reis católicos e refugiaram-se em Portugal onde o rei Dom Manuel I, se mostrava mais tolerante com a comunidade judaica. A partir de 1497 os reis católicos pressionaram o reino português na questão do asilo dado aos judeus, o que fez com que Dom Manuel obrigasse a conversão forçada dos judeus. Estes judeus convertidos por decreto passaram a ser conhecidos como cristãos-novos.

Em 1506 o “Pogrom” de Lisboa ou a Matança da Páscoa, resultou na morte de aproximadamente 3000 judeus, incitados pelos prelados onde  são trucidados pelos piedosos católicos em praça pública. 

Essa perseguição ferrenha aos judeus que se deu na época dos descobrimentos, motivou a corrida de muitos judeus para o Novo Mundo, incluindo o Brasil, nas cidades do Rio de Janeiro, Salvador, Pernambuco e Paraíba.

Paraiba Judaica

Desde o século XVI a Paraíba foi um foco de judaísmo. Os cristãos-novos que aqui viviam não eram abastados como os da Bahia ou do Rio de Janeiro, mas também tinham algumas posses. Tiravam sua subsistência da agricultura e possuíam alguns escravos. Seu número cresceu após a expulsão dos holandeses, quando judeus que não quiseram deixar o Brasil penetraram fundo no sertão.

Não demorou muito para que os judeus que fixaram residência por aqui e os paraibanos descendentes de judeus aparecem como suspeitos de judaísmo. O primeiro visitador que a Inquisição mandou ao Brasil no ano de 1595, Heitor Furtado, já teve ordem de investigar a Paraíba. João Nunes, cristão-novo que aí viveu em fins do século XVI, e teve importante papel na colonização local, foi denunciado por ter dito “quando me ergo pela manhã que rezo uma Ave Maria, amarga-me a boca”.

Segundo dados obtidos do site do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba, a cidade de Filipéia de Nossa Senhora das Neves (João Pessoa), no ano de 1625 – 40 anos de sua fundação, tinha cerca de 80 casas, 3 igrejas e 3 conventos o que, pela proporção, dá par se notar o valor da Igreja durante a colonização.

Pesquisas mais exaustivas poderão esclarecer ainda obscuros ângulos da realidade dos ‘judeus’ da Paraíba. As suspeitas aparentes repetiam as seculares acusações de que “faziam ajuntamentos”, costumavam estar na Igreja com muito pouco acato e reverência no tempo em que se alevantava o “Santíssimo Sacramento” quando falavam uns com os outros, e não traziam livros de rezas nem de contas”.

A chegada aqui do Santo Ofício, em 1595, não teve muita repercussão porque a população era muito pequena, foram cerca de 16 denúncias e os casos mais interessantes foram de bigamia e sodomia, embora tivessem alguns casos judaizantes.

 Na quaresma de 1673, a Inquisição de Lisboa ordenou que se publicasse um edital na igreja de Nossa Senhora das Neves, chamando todos fieis católicos a vir denunciar sob pena de excomunhão. Deviam contar tudo que presenciaram ou “ouviram” contra a Santa Fé Católica. O vigário da Igreja de Nossa Senhora das Neves, padre Francisco Arouche e Abrantes, leu o edital no púlpito. A população se agitou e de boca em boca corria a notícia da excomunhão. Amedrontados, sussurravam que as iras do inferno iriam desabar sobre os cúmplices.

 Acontece então algo surpreendente: apenas oito pessoas se apresentaram perante o vigário para cumprir as ordens da Igreja. Todos repetiram que o faziam por medo. Durante os treze meses que durou o inquérito, de 26 de fevereiro de 1673 a 20 de março de 1674, o vigário ouviu apenas as denúncias desses oito paraibanos. A maioria dos denunciantes pertencia à governança. A população que ouviu a chamada da Igreja não compareceu para denunciar.

Esse fenômeno já se havia passado na Bahia, durante a “grande inquirição” de 1646. Os oito denunciantes repetiram que “ouviram dizer” sobre feitiçarias e superstições, mas principalmente sobre “judaísmo”. Na Paraíba, a heresia judaica se entende durante séculos. Na investida inquisitorial do século XVIII, quando são presos em poucos anos cerca de cinqüenta paraibanos, as evidências sobre as ‘sinagogas’ e as reuniões secretas aumentaram. O Santo Ofício obteve vantagens econômicas com suas prisões, cujo montante ainda não foi avaliado.

Passemos ao século XVIII, onde poderemos focalizar as famílias de judeus da Paraíba.

Posso mostrar-lhe um impresso, de autoria de Sérgio Maia, onde se vê a Capela do Engenho Santo André, e onde foram travadas renhidas batalhas contra os holandeses. Hoje existem apenas ruínas. O Engenho Santo André é hoje a usina de açúcar Santana, no município atual de Santa Rita, Paraíba, disse o professor Carlos André Macêdo Cavalcanti.

Continuando diz o historiador Carlos André que nesse Engenho Santo André viveu Clara Henriques da Fonseca, condenada pela Inquisição de Lisboa, em 17 de junho de 1731. Era mãe de Antônio da Fonseca Rego, morador no Engenho Velho, município de Santa Rita, condenado em 6 de julho de 1732. Antônio da Fonseca Rego casou com Maria de Valença, natural do Engenho do Meio, também na várzea do rio Paraíba, também condenada pela Inquisição de Lisboa em 17 de junho de 1731 e em 20 de julho de 1756 a cárcere e hábitos perpétuos sem remissão. 

Foram dois processos. São os pais dele Joana Nunes da Fonseca, casada com João Soares Filgueira. O casal já era falecido em 1777. Residia na serra do Martins, Rio Grande do Norte, fugindo da Inquisição portuguesa. São pais dele Florência Nunes da Fonseca, casada com João Francisco Fernandes Pimenta. Abandonando o refúgio da serra do Martins, o casal foi residir em Catolé do Rocha, na Paraíba, no início do século XIX. Três filhas do casal casaram com dois filhos de Antônio Ferreira Maia. Cosma casou com Francisco Alves Maia, ela falecida em 2 de março de 1827, ele falecido em 5 de agosto de 1831. Damiana casou com Manoel Alves Ferreira Maia, foi sua primeira mulher e Maria, a terceira filha dos descendentes judeus, também casou com o cunhado, o viúvo Manoel Alves Ferreira Maia.

Grande parte da família Maia do Catolé do Rocha tem como herança o sangue dos hebreus, que se perpetua através dos tempos em todas as partes do globo terrestre. Américo Sérgio Maia, autor destes apontamentos a que agora me refiro, é descendente de Cosma e Damiana por parte de pai e parte de mãe.

Por aqui vocês vêem a dimensão lírica da História, o emocionante disso tudo, abrangendo um casal e toda uma família vítima da Inquisição, que foi levada para Lisboa e tiveram destinos trágicos.

Mas, a História continua. Quando falo nessa dimensão lírica é para realçar essa capacidade, essa potencialidade, a força que vem da própria vida, que nem a Inquisição, nem o nazismo, nem nenhum regime totalitário é capaz de matar. A vida continua devido a esse impulso lírico.

Vemos também, dentro da História da Paraíba, o deslocamento de famílias, de núcleos familiares daqui da Paraíba, do Rio Grande do Norte e do Ceará para o interior, para o sertão. O que se deu juntamente no século XVIII no momento em que se intensificava o povoamento do sertão.

Assim, quero continuar falando sobre essa família ilustre da Paraíba.

Antônio da Fonseca Rego era filho de Clara Henriques, como vocês viram. Clara Henriques é uma figura que emociona quando a gente passa a vista no rol dos culpados registrados no livro de Anita Levinsky, porque ela emerge como a própria figura da máter dolorosa. Ela era uma senhora de 71 anos, uma matriarca, parente de todo mundo, porque esses cristãos-novos daqui da várzea da Paraíba eles constituíam uma grande família: os Fonseca, os Henriques, Nunes, Pereira, Chaves. Mas todos entrelaçados e descendentes de dois casais que remontam à época dos holandeses. De Ambrósio Vieira, casado com Joana do Rego, que por sinal se multiplicam essa Joana do Rego, de geração em geração e Diogo Nunes Tomaz, casado com Guiomar Nunes, que também tem outra seqüência de Guiomar Nunes.

 Pois bem, Clara Henrique morava no Engenho de Santo André, ali num sítio histórico, e ali toda essa comunidade se reunia. Se eles foram processados, não foram inocentes, porque eles realmente judaizavam. Nas suas reuniões celebravam seus sabás, os jejuns de expiação e todo o ritual do calendário judaico.

Clara Henriques foi uma grande figura e foi presa quando já era viúva; foi para Portugal e não voltou. Deve ter morrido. Antônio da Fonseca Rego foi acusado de judaísmo e feitiçaria. Maria de Valença, que foi processada duas vezes, na primeira foi levada para Portugal em 1731. Quando foi posta em liberdade não pôde voltar e foi acolhida numa casa de cristão-novos, por sinal na casa de um irmão do teatrólogo Antônio José da Silva. Como se sabe, naqueles interrogatórios da Inquisição a pressão era muito grande, e por conta disso ela denunciou o marido, e quando ele chegou lá denunciou o filho Simão, que deveria ter uns 15 anos. Simão depois se tornou um olheiro, um espião a serviço da Inquisição. 

Eu pergunto, prossegue o professor Carlos André, teria sido uma lavagem cerebral? Simão quando foi solto ficou abrigado na mesma casa onde a mãe estava e denunciou que ela estava preparando o jejum da expiação. Justamente quando estavam reunidos na casa de um cunhado, para iniciar o jejum, chega o pessoal da Inquisição e prende todo mundo. É esta a prisão de Clara pela segunda vez, que já não andava boa do juízo. O processo vai para Roma, demora sete anos para voltar para Lisboa, sem uma solução em face da sua doença mental. Como não soubessem o que fazer com ela, mandaram-na para Évora, sendo afinal libertada, tendo morrido na miséria, mendigando nas ruas de Évora.

Simão foi mandado para o Rio de Janeiro e durante a viagem endoideceu, e ficava dizendo que era judeu, talvez por remorso, retornando do Rio para Lisboa.

Tem também o processo de Luiz de Valença. Vamos ter notícia de Luiz de Valença porque ele compareceu no mesmo auto de fé do padre Malagrida, tendo morrido no cárcere.

Com esse relato vocês podem ter uma idéia do que significou a Inquisição na Paraíba. Outra família que também se tem notícia é a de João Inácio Cardoso Darão. Esse conseguiu fugir aqui das perseguições, foi para o Ceará e lá se casou com uma moça da família Alencar, em Barbalha. Depois volta e se refugia em Mari do Seixas, saindo de lá para Pombal. Era uma família de artesãos, que passaram a arte da ourivesaria para os filhos.

Era uma família pequena. João Inácio era casado com Catarina Liberato de Alencar. Deles descende o professor Inácio Tavares de Araújo e José Romero Araújo Cardoso, que é escritor e professor de Geografia em Mossoró. O interessante dessa família é que eles conservaram na memória familiar a sua ascendência judaica e conservam viva  na memória a história de Branca Dias, da Branca Dias da Paraíba..

Segundo o professor Inácio, na memória da família (não tem documento) João Inácio e Francisco se diziam que eram filhos de Simão Dias Cardoso de Araújo, morador no Engenho Velho, nas margens do Gramame. Ora, esse Simão Dias aqui da margem do Gramame é dado, embora não tenha documentação, como pai da própria Branca Dias. Estou apenas passando aquilo que colhi na família.

No rol de culpados de Anita Novinsky nós vamos encontrar um João Almeida, um Inácio Cardoso e um Pedro Cardoso, filhos de Francisco Cardoso. Mas esse Francisco Cardoso era o senhor do engenho, do Engenho Tibiri. Acredito que haja uma relação desses três com essa descendência de  João Inácio Como se vê, a história continua através da família, que é instituição legítima, primeira da sociedade.

No rol dos culpados de Anita Novinsky, vamos encontrar um Manoel Homem, cristão-novo, natural do Engenho das Tabocas e morador no Taipu. Viúvo, senhor de engenho, filho de Antônio de Figueiroa, lavrador de cana. Testemunha: Antônio Nunes Chaves, 12 de maio de 1732. E nada mais consta.

Mas acontece que no volume II, da NOBILIARQUIA PERNAMBUCANA, vamos encontrar o seguinte: e o sobredito, Manoel Homem de Figueiroa, que ainda vive em crescida idade, foi filho de Antônio de Figueiroa, que o era de Jorge Homem Pinto e de sua mulher D. Ana de Carvalho.

Na mesma fonte encontra-se que Antônio de Figueroa teria nascido em 1634 e Jorge Homem Pinto falecido em 1651. Poderíamos fazer uma relação entre esse número Homem constante do rol dos culpados com esse Manoel Homem citado por Borges da Fonseca (fica em aberto o assunto; trouxe-o apenas para ilustrar).

Manoel Homem foi casado com Margarida de Albuquerque, herdeira do Taipu. Dessa descendência se encaminha (faltam alguns zeros) para José Lins do Rego.

 Outra família: Diogo Nunes Tomaz, esse é o segundo nome. Foi casado com D. Vitória Barbalha Bezerra, neta por via materna de Duarte Gomes da Silveira. Ele é um ramo do morgado. Como ela não mostrou arrependimento, foi queimada viva. Ela morava no Engenho Santo André, mas era pernambucana, tanto que lá é tida como heroína, e nós também, porque ela morava aqui. Ele era da vila de Serinhaém, e morador na Paraíba. Lá no rol dos culpados ele é dado sem ofício, já devia ser um homem idoso. Era pai de Diogo Nunes Tomaz, casado com Catarina Ferreira Barreto, que foi preso em 1729 e vemos, através de depoimento, porque não houve inventário, que ele era primo da morgada.

Esse é o Brasil dos 500 anos, o  Brasil das nossas raízes, porque não se pode fazer uma comemoração, escrever-se sobre a nossa história sem a história das nossas famílias, a história dos povoadores desses nossos municípios, porque eles é que realmente fizeram a história.

Sugestão de Leitura
Branca Dias

quinta-feira, 13 de junho de 2013

O OSSUÁRIO DE TIAGO, FILHO DE JOSÉ, IRMÃO DE JESUS.


Ela pesa 25 quilos. Tem 50 centímetros de comprimento por 25 centímetros de altura. E está, indiretamente, no banco dos réus de um tribunal de Jerusalém desde 2005. A discussão em torno de uma caixa mortuária com os dizeres “Tiago, filho de José, irmão de Jesus” nasceu em 2002, quando o engenheiro judeu Oded Golan, um homem de negócios aficionado por antiguidades, revelou o misterioso objeto para o mundo. A possibilidade da existência de um depositário dos restos mortais de um parente próximo de Jesus Cristo agitou o circuito da arqueologia bíblica. Seria a primeira conexão física e arqueológica com o Jesus do Novo Testamento.

Os cristãos que no ano 325 criaram um Deus romano chamado Jesus, sob o comando e as ordens do imperador Constantino, mesclando este Deus criado no Concílio de Niceia com outros Deuses pagãos cultuados no Império Romano, a exemplo de Mithra, Apolônio de Tiana, dentre outros a exemplo de Buda, com a complacência do Imperador, mandaram queimar todos os livros sagrados dos Deuses que deram origem ao Jesus/Deus temendo que mais tarde o confronto desses livros fizessem cair por terra o mito Jesus Cristo.

Enquanto o Império Romano se fez forte, a princípio permitindo livremente o culto cristão pelo Edito de Milão (Edito de Tolerância) e em seguida o Edito de Tessalônica que fez o Cristianismo a religião oficial do império obrigando a todos os súditos a conversão forçada, não se preocuparam com provas. Só mais tarde quando surgiram os questionamentos, tentaram forjar provas, adulterando o livro  “História dos Judeus”, de Flavius Josephus.

No final do século IV e início de século V, o papa Damaso I encarregou Jerônimo, doutor da Igreja e depois de falecido São Jerônimo a traduzir a bíblia do grego para o latim, a língua vulgar, falada no império romano. Está bíblia denominou-se “vulgata”. Como quem conta um conto aumenta um ponto, São Jerônimo aumentou tantos pontos que findou por descrever outro Jesus diferente daquele que foi pintado e insculpido no Concílio de Niceia  Tantas foram as modificações no Evangelho de Cristo que outro doutor e santo da Igreja Agostinho disse textualmente: “Eu não creria nos santos evangelhos se a isso não me mandasse a Santa Igreja Católica.” Vale por fim salientar que Santo Agostinho foi contemporâneo de São Jerônimo.

Os que duvidaram disso foram proclamados imediatamente hereges, e sofrerão mais tarde os raios da Inquisição. A partir do século IV da nossa era, começa o assassinato dos não-crentes pelos cristãos.

Sem nenhuma prova da existência de Jesus a Igreja começou a perseguir a quem duvidasse, e a civilização ocidental entrou no triste e assombroso “Período das Trevas”. A igreja acossou os mais sábios, os mais inteligente. Destruiu bibliotecas, puniu e castigou todos aqueles que tentaram transmitir ou adquirir conhecimentos fora do controle da igreja.

Com o invento da imprensa, livros começaram a ser impressos em série, com poucos segundos copiava-se uma página de um livro. Este evento provocou a quebra do monopólio do ensino pela Igreja. O saber, o conhecimento saíra dos conventos, a Bíblia começou a ser impressa, os livros foram barateados e tornaram-se acessível ao público. Facilmente um exemplar chegava a todos os países da Europa em pouco mais de duas semanas. O acesso a informação começou a ser divulgado incomodando a Igreja que reagiu de pronto criando a censura, o Index - Index Additus Librorum Prohibitorum - essa instituição editava regularmente a lista dos livros proibidos. A última edição do Índex foi publicada em 1961. E em 1966 o Papa Paulo VI, põe fim a novas edições.

Pois bem, deste esta época que os cristãos relutam para provar a existência de um Jesus histórico. Nenhum escritor antigo contemporâneo de Jesus escreveu sobre ele, ninguém escreveu sobre o Apóstolo Paulo ou sobre um dos doze discípulos. Mentiras foram citadas dos púlpitos das Igrejas e permaneceram como verdade por quase 19 séculos, até que a humanidade começou a ler e tomar conhecimento das controvertidas história de Jesus, através de livros e jornais ainda mornos com as cinzas das fogueiras do Santo Ofício.

Esperava-se que os Manuscritos do Mar Morto falasse alguma coisa sobre Jesus, não falou. Inventaram que na Catedral de Turim havia um pano que teria embrulhado Jesus. O sudário não resistiu aos testes científicos, então a Igreja divulgou que a parte retirada para exames saíra de um remendo feito na Idade Média em virtude de um incêndio que quase destruíra o pano. Há uma outra prova que a Igreja diz ter – A tabuleta com os dizeres "INRI" que foi posta na cruz de Jesus trazida por Helena, mãe do Imperador Constantino, quando em visita ao “santo sepulcro” teria encontrado esse pedaço de madeira.

Hoje com o advento da internet, o “pai dos burros” tomou outro nome, deixou de ser “dicionário” e passou a ser “Google”. Neste site qualquer um pode pesquisar, e por si só pode separar o joio do trigo. Como se não bastasse, o Youtube promove ensinamentos e reportagens de alto nível. Quem tiver olhos que veja, quem tiver ouvidos que ouça.

Vamos aos fatos:

No dia 21 de outubro de 2002 a mídia internacional publicou que alguém havia encontrado a primeira prova concreta da existência de Jesus. Os cristãos ficaram em estado de graça, a imprensa mundial divulgou a notícia, o ossuário foi filmado, televisionado, retratado e publicado na internet

21 de outubro de 2002

Um estudioso de hebraico disse ter descoberto a primeira evidência arqueológica da existência de Jesus



 da France Presse, em Washington


A inscrição em um antigo ossário, que pode ser a primeira indicação arqueológica da existência de Jesus, tem causado ceticismo entre diversos especialistas.


23 de outubro de 2002

da France Presse, em Washington

 A inscrição em um antigo ossário, que pode ser a primeira indicação arqueológica da existência de Jesus, tem causado ceticismo entre diversos especialistas.


24 de outubro de 2002

Agência Lusa.

O ossário tem uma inscrição em língua aramaica que diz "Tiago, filho de José, irmão de Jesus". Os arqueólogos estão agora analisando a inscrição, para determinar se é original ou se foi feita posteriormente à utilização do ossário. Se for confirmada sua autenticidade, esse seria o primeiro objeto arqueológico a confirmar a existência de Jesus.



 18 de junho de 2003

 da Folha Online

Poderia ser a primeira evidência arqueológica de sua existência fora da Bíblia. Mas especialistas dizem que a inscrição do nome de Jesus em uma urna funerária encontrada em Israel foi forjada.



28 de julho de 2004

 Urna que seria de irmão de Jesus é falsa 
 



A polícia israelense prendeu Oded Golan, sob a acusação de falsificar antigüidades. Golan ficou mundialmente famoso quando anunciou ter encontrado uma urna funerária com a inscrição Tiago, irmão de Jesus.


12 de novembro de 2010

Peritos negam que ossuário de irmão de Jesus seja falso


O ossuário de Tiago, que chegou a ser avaliado entre US$ 1 milhão e US$ 2 milhões, é tão raro que cerca de 100 mil pessoas esperaram horas na fila para vê-lo no Royal Ontario Museum, no Canadá, onde foi exposto pela primeira vez, em 2002. Agora que a justiça dos homens não conseguiu provas contra sua autenticidade, e há chances de ele ser mesmo uma relíquia de um parente de Jesus, o fascínio só deve aumentar.



Como ocorreram com o madeiro supostamente encontrado no fictício monte onde Jesus teria sido crucificado ou o sudário que teria embrulhado Jesus depois da crucificação, alguns cristãos não católicos procuraram dar credibilidade a urna, citando fatos impossíveis de terem acontecidos.

Foi dito por Rodrigo Cardoso da Revista "Isto É", na Edição de nº 2140 de 12 de novembro de 2010, que um especialista em arqueologia pela Universidade Hebraica de Jerusalém - Rodrigo Pereira da Silva, professor do Centro Universitário Adventista de São Paulo, que teria examinado a tal urna funerária e constatado a sua veracidade.

Corrobora com essa afirmação outro brasileiro André Chevitarese, professor de História das Religiões da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Impressionante como a imprensa mundial fica muda diante das provas apresentadas por estes "ilustres" peritos brasileiros, diante de um achado tão valioso para a cristandade.

Mas os "achados" não ficam por aí, o professor do Centro Adventista de São Paulo (Unasp) e especialista em arqueologia pela Universidade Hebraica de Jerusalém, baseado em textos bíblicos e pela literatura romana (?), acredita na hipótese que Jesus tenha sido crucificado sentado, apoiado em uma madeira que existia na cruz abaixo do seu quadril, com as pernas dobradas para a direita, nu e sem a coroa de espinhos. - Livro "Em Busca de Jesus" (Ed. Paulina)

Pergunte a você mesmo e responda:

Quem diz provar que a urna contendo o nome de Jesus é verdadeira enquanto peritos do mundo inteiro a julga falsa, tem interesse no fato?

Se sim, a perícia não merece credito, é suspeitíssima.

Notícia divulgada pela imprensa dá conta de que o Vaticano encarcerou Vallejo Balda, membro da Opus Dei e vai levar a julgamento cinco pessoas entre elas dois jornalistas italianos e um padre espanhol, acusados de divulgar documentos que afetam os interesses da Santa Sé.(1)


 Portanto Se você acredita que este perito (Rodrigo Pereira da Silva) e o professor de História das Religiões tiveram acesso a biblioteca do Vaticano, está perdidamente enganado. Impossível que o Papa tenha dado livre acesso a pessoas consideradas hereges pela Igreja Católica para escacaviar documentos milenares por eles guardados à sete chaves.

O INCÓMODO SILÊNCIO SOBRE JESUS PERMANECE.





Recomenda-se a leitura dos livros e sites quando indicados como fontes. Os posts contidos neste blogger são pequenos apontamentos de estudos.