CERTA VEZ aconteceu que muitos meninos seguiam
Jesus para divertirem-se em sua companhia. Mas havia um pai de família que,
irado ao ver que seu filho ia com Jesus, e para que não o seguisse mais,
prendeu-o numa torre fortíssima e muito sólida, sem buraco nem entrada alguma
além da porta e de uma janelinha estreitíssima, que apenas deixava passar um
pouquinho de luz; e a porta estava bem escondida e trancada. E aconteceu que um
dia Jesus aproximou-se dali com seus companheiros para brincar. Ao ouvi-los, o
menino encarcerado pôs-se a gritar junto à janela da seguinte maneira:
"Jesus, queridíssimo companheiro, ao ouvir tua voz minha alma regozijou-se
e senti-me cheio de alívio. Por que me deixas aqui encarcerado?" Jesus foi
até ele e lhe disse: "Estende-me uma mão ou um dedo pelo buraco". E
tendo feito isto, Jesus pegou a mão daquele menino e o tirou através daquela
estreitíssima janelinha. E o menino foi embora em sua companhia. Jesus
disse-lhe: "Reconhece o poder de Deus e na tua velhice conta o que Deus te
fez na tua infância". Ao tomar conhecimento do que havia acontecido, o pai
de família primeiro dirigiu-se até a porta. E ao encontrá-la ainda fechada,
gritou e disse que era um fantasma. E que os seus olhos estavam fechados para
não reconhecer o poder divino.
2 Este mesmo pai de família, que era o mais velho
dentre os juízes da sinagoga e dos fariseus e dos escribas e dos doutores, foi
até José para queixar-se de Jesus, que havia feito novas maravilhas entre o
povo, de maneira que já era venerado como Deus; e, exaltando-se, disse:
"Olha que nossos jovens, entre os quais está meu filho, estão seguindo
Jesus até o campo de Sicar". E, cheio de raiva, pegou um pau com intenção
de bater em Jesus, e seguiu-o até um monte em cujo sopé estende-se uma
plantação de favas. Jesus, porém, escapou da sua ira dando um pulo do cume da
montanha até um ponto distante, como a flecha de um arco. E os outros meninos,
querendo dar o mesmo salto, caíram no precipício, fraturando pernas, braços e
pescoços. E por esse motivo levantou-se um enorme protesto diante de Maria e
José; Jesus, porém, curou a todos e deixou-os mais sadios ainda que antes. Ao
ver isto, então, o arquissinagogo, que era o pai do rapaz preso, e todos os
outros presentes, adoraram por sua vez a Deus Adonai. E o lugar onde Jesus deu
o salto chama-se até hoje o "Salto do Senhor".
3 E aconteceu que, sendo época de semeadura, José
saiu para semear o trigo. E Jesus seguiu-o. Depois José começou sua faina, e
espalhou as sementes até o limite da propriedade. Depois José veio ceifar no
tempo da colheita. E também Jesus veio recolher as espigas que havia semeado, e
sua colheita foi de cem alqueires de riquíssimo trigo, quantidade que nem três
ou quatro campos juntos produziam. E José disse: "Chamai os pobres, órfãos
e viúvas e reparti com eles o trigo da minha colheita". E assim se fez.
Mas, ao distribuí-lo, sobreveio um extraordinário e inesperado aumento. Os
pobres que foram com ele supridos abençoaram o Senhor de todo o coração,
dizendo que o Senhor Deus de Israel havia visitado o seu povo.
4 De novo aconteceu em um dia de semeadura que
Jesus ia atravessando a Ásia e viu um lavrador que semeava certa espécie de
legume chamado grão-de-bico, em uma propriedade próxima ao túmulo de Raquel,
entre Jerusalém e Belém. Jesus lhe disse: "Homem, que estás
semeando?" Mas ele, com raiva e zombando do fato de que um jovem daquela
idade lhe fazia tal pergunta, respondeu: "Pedras". E Jesus, por sua
vez, lhe disse: "Tens razão, porque efetivamente são pedras". E todos
aqueles grãos-de-bico transformaram-se em duríssimas pedras, que ainda
conservam a forma de grãos-de-bico, a cor, bem como o pequeno olho na cabeça. E
desta maneira todos aqueles grãos, tanto os já semeados quanto aqueles que
iriam ser semeados, transformaram-se em pedras. E até hoje, procurando-as com
cuidado, pode-se encontrar as tais pedras nesse campo.
5 Outro dia de manhã, quando o orvalho ainda
suavizava o calor do sol, José e Maria vinham subindo do lado de Tiro e Sidon
em direção a Nazaré. E à medida que o sol ia subindo, Maria sentia-se cada vez
mais sufocada, até que sentou-se no chão muito cansada. E disse a José:
"Continua subindo esta temperatura que me afoga; que se poderá fazer? Não
vejo por aqui nenhuma sombra onde possa proteger-me". E levantando suas
mãos aos céus, orou dizendo: "Oh Virtude do Altíssimo! Segundo aquela doce
palavra que ouvi uma vez e que vinha de ti, protege-me com tua sombra; que
minh'alma viva e me seja dado o teu refrigério". E Jesus, ao ouvir essas
palavras, alegrou-se e fincou no solo um pau seco que levava na mão para
servir-lhe de bastão, dizendo com voz imperiosa: "Proporciona neste
momento uma sombra agradável para minha mãe". E no mesmo instante aquela
vara converteu-se em uma árvore copada e frondosa, que lhes ofereceu um doce
refrigério para seu descanso.
6 Um dia de inverno fazia um sol esplêndido, e um
raio de sol estendeu-se e veio, pela janela, incidir na parede da casa de José.
E por ali estavam os jovens da vizinhança, companheiros de Jesus, correndo pela
casa; Jesus montou o raio de sol e, colocando suas vestes em cima dele,
sentou-se como se estivesse acomodado sobre uma firmíssima viga. Ao ver isso,
seus companheiros pensaram que seriam capazes de fazer o mesmo. E tentaram
subir para sentar-se com Jesus, imitando-lhe o jogo. Mas despencaram gritando:
"Estamos nos fazendo em pedaços". Jesus, porém, atendendo aos rogos
de Maria e de José, pôs-se a curar as lesões de todos os feridos soprando
levemente no lugar machucado, dizendo: "O Espírito assopra onde quer e
devolve a saúde a quem lhe apraz". E todos foram embora curados. E
contaram todas estas coisas a seus pais, sendo o fato conhecido em Jerusalém e
nos mais remotos confins de Judá. Com o que a fama de Jesus estendeu-se por todas
as províncias. E vieram para render-lhe graças e serem, por sua vez, abençoados
por ele. E lhe disseram: "Bem-aventurado o ventre que te carregou e os
seios que te amamentaram".
José e Maria deram graças a Deus por todas as
coisas que haviam visto e ouvido.
7 Numa outra ocasião, Maria disse ao seu filho:
"Olha, filho, vai à fonte de Gabriel, tira água e traze-a neste
cântaro". E submisso às ordens da mãe, foi. E os meninos da sua idade
seguiam-no para vê-lo, levando cada um o seu cântaro. E, já de volta, Jesus
jogou com força o seu cântaro contra uma rocha que havia no caminho, sem que se
rompesse ou produzisse muito barulho. Ao ver isto os demais fizeram a mesma
coisa com os seus, quebrando cada um o seu cântaro e derramando a água que
haviam ido buscar na fonte. Então sobreveio um tumulto e levantaram-se queixas,
mas Jesus recolheu os fragmentos, recompôs os vasilhames e devolveu-os a cada
um cheios de água. E elevou seus olhos ao céu, dizendo: "Pai, desta mesma
maneira hão de ser consertados os homens que confusos pereceram". Ficaram
todos estupefatos diante daquele feito e diante daquelas palavras e o louvaram
dizendo: "Bendito o que vem em nome do Senhor. Amém".