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quinta-feira, 9 de julho de 2015

GUIA DE FALÁCIA LÓGICA DO STEPHEN






As falácias lógicas são erros de raciocínio ou de argumentação, erros que podem ser reconhecidos e corrigidos por pensadores prudentes. Este ensaio lista e descreve todas as falácias lógicas conhecidas.
O propósito deste ensaio é assegurar que a informação sobre as falácias lógicas estará livremente disponível. Para assegurar que esta informação permaneça gratuitamente acessível, este ensaio e o seu conteúdo são protegidos por direitos autorais.

O ponto central de um argumento é expor razões que sirvam de suporte para alguma conclusão. Um argumento comete uma falácia quando as razões apresentadas, de fato, não sustentam a conclusão.
Como usar este guia

As falácias estão agrupadas em categorias de quatro a seis falácias cada. Este agrupamento é um tanto quanto arbitrário e foi feito apenas por pura conveniência.

Cada falácia é descrita no seguinte formato:

  • Nome: o nome pelo qual a falácia é geralmente conhecida
  • Definição: a falácia é definida
  • Exemplos: são dados exemplos da falácia
  • Prova: os passos necessários para provar que foi cometida uma falácia
Nota: Por favor, fique ciente que este guia está em construção e, portanto, não deve ser tomado como completo de modo algum.

Lista de falácias

  • Falso dilema: são dadas duas alternativas quando de fato há três ou mais
  • Apelo à ignorância: conclui-se que uma proposição é falsa (ou verdadeira) porque não se sabe se é verdadeira (ou falsa)
  • Declive escorregadio: consequências cada vez mais inaceitáveis são derivadas em série
  • Pergunta complexa: duas proposições são ligadas no que aparenta ser uma só pergunta.

  • Apelo à força: o ouvinte é persuadido a concordar pela força
  • Apelo à piedade: apela-se à compaixão ou simpatia do ouvinte
  • Consequências: o ouvinte é prevenido contra consequências inaceitáveis
  • Linguagem preconceituosa: associam-se valores morais positivos à causa defendida pelo autor
  • Apelo ao povo: defende-se que uma proposição é verdadeira porque segundo a maioria da população ela é verdadeira

  • Ataques pessoais:
    • (1) ataque ao caráter da pessoa
    • (2) referem-se circunstâncias relativas à pessoa
    • (3) invoca-se o fato de a pessoa não praticar o que diz
  • Apelo à autoridade:
    • (1) a autoridade não é um perito no campo em questão
    • (2) não há acordo entre os peritos do campo em questão
    • (3) a autoridade não pode, por algum motivo, ser levada a sério — porque estava brincando, estava bêbada, etc.
  • Autoridade anônima: a autoridade em questão não é declarada
  • Estilo sem substância: sente-se que o modo como o argumento (ou o argumentador) é apresentado afeta a verdade da conclusão

  • Generalização precipitada: a amostra é demasiado pequena para apoiar uma generalização indutiva sobre o domínio em questão
  • Amostra não representativa: a amostra não é representativa do domínio em questão
  • Falsa analogia: desprezam-se diferenças relevantes entre os objetos ou acontecimentos comparados
  • Indução preguiçosa: nega-se, apesar dos indícios favoráveis, a conclusão de um forte argumento indutivo
  • Falácia de omissão: não é considerada toda a informação relevante que devia pesar na conclusão de um forte argumento indutivo
  • Acidente: uma generalização é feita quando as circunstâncias sugerem que deve haver exceções
  • Inversa do acidente: generaliza-se o que apenas devia ser tomado como exceção
  • Post hoc: pelo fato de algo acontecer após outra coisa pensa-se que a coisa causa o algo em questão
  • Efeito conjunto: conclui-se que uma coisa é causa de outra coisa quando, de fato, ambas as coisas são o efeito conjunto de uma causa subjacente
  • Insignificância: conclui-se que uma coisa é causa de algo, mas apesar de também o ser, é insignificante quando comparada com outras causas deste algo
  • Direção errada ou contramão: a relação entre causa e efeito é invertida
  • Causa complexa: a causa identificada é apenas uma parte da totalidade da causa do efeito
  • Petição de princípio: a verdade da conclusão já estava presumida nas premissas
  • Conclusão irrelevante: um argumento apresentado para defender uma conclusão prova, em vez disso, outra conclusão
  • Espantalho: o autor ataca um argumento diferente (e/ou mais fraco) do que o melhor argumento do opositor
  • Equívoco: o mesmo termo é usado em dois sentidos diferentes
  • Anfibologia: a estrutura de uma frase permite duas interpretações diferentes
  • Ênfase: a ênfase numa palavra sugere um sentido diferente daquele que de fato é enunciado
  • Composição: como os atributos das partes de um todo têm certa propriedade, argumenta-se que o todo tem esta propriedade
  • Divisão: como o todo tem uma certa propriedade, argumenta-se que as partes têm essa propriedade
Falácias de dispersão
Cada uma destas falácias caracteriza-se pelo uso ilegítimo de um operador lógico, uso que desvia a atenção do auditório da falsidade de uma certa proposição. Falácias de dispersão:
Falso dilema
Definição:
É dado um limitado número de opções (na maioria dos casos apenas duas), quando de fato há mais. O falso dilema é um uso ilegítimo do operador “ou”.
Pôr as questões ou opiniões em termos de “ou sim ou não” gera, com frequência (mas nem sempre), esta falácia.
Exemplos:
(i) Estás por mim ou contra mim.
(ii) América: ama-a ou deixa-a.
(iii) Ou suportas Meech Lake ou o Quebec separa-se.
(iv) Uma pessoa ou é boa ou é má.
Prova:
Identifique as opções dadas e mostre (de preferência com um exemplo) que há pelo menos uma opção adicional.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 136
Apelo à ignorância (argumentum ad ignorantiam)
Definição:
Os argumentos desta classe concluem que algo é verdadeiro por não se ter provado que é falso; ou conclui que algo é falso porque não se provou que é verdadeiro. (Isto é um caso especial do falso dilema, já que assume que todas as proposições têm de ser de fato conhecidas como sendo verdadeiras ou falsas). Mas, como Davis escreve, “A falta de prova não é uma prova.” (p. 59)
Exemplos:
(i) Já que você não pode provar que fantasmas não existem, eles existem sim.
(ii) Já que os cientistas não podem provar que acontecerá o aquecimento global, ele provavelmente não ocorrerá.
(iii) Fred disse que era mais esperto do que Jill, mas não o provou. Portanto, isso deve ser falso.
Prova:
Identifique a proposição em questão. Argumente que ela pode ser verdadeira (ou falsa) mesmo que, por enquanto, não o saibamos.
Referências:
Copi e Cohen: 93, Davis: 59
Declive escorregadio (Derrapagem)
Definição:
Para mostrar que uma proposição P é inaceitável, extraem-se consequências inaceitáveis de P e consequências das consequências… O argumento é falacioso quando pelo menos um dos seus passos é falso ou duvidoso. Mas a falsidade de uma ou mais premissas é ocultada pelos vários passos “se-então” que constituem o todo do argumento.
Exemplos:
(i) Se aprovamos leis contra as armas automáticas, não demorará muito até aprovarmos leis contra todas as armas, e então começaremos a restringir todos os nossos direitos. Acabaremos por viver num estado totalitário. Portanto, não devemos banir as armas automáticas.
(ii) Nunca deves jogar. Uma vez que comeces a jogar verás que é difícil deixar o jogo. Em breve estarás a deixar todo o teu dinheiro no jogo e, inclusivamente, pode acontecer que te vires para o crime para suportar as tuas despesas e pagar as dívidas.
(iii) Se eu abrir uma exceção para ti, terei de abrir exceções para todos.
Prova:
Identifique a proposição, P, que está a ser refutada e identifique o evento final, Q, da série de eventos. Depois mostre que este evento final, Q, não tem de ocorrer como consequência de P.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 137
Pergunta complexa
Definição:
Dois tópicos sem relação, ou de relação duvidosa, são conjugados e tratados como sendo uma única proposição. Pretende-se que o auditório aceite ou rejeite ambas quando, de fato, uma pode ser aceitável e a outra não. Trata-se de um uso abusivo do operador “e”.
Exemplos:
(i) Deves apoiar a educação familiar e o Direito, dado por Deus, de os pais educarem os filhos de acordo com as suas crenças.
(ii) Apoias a liberdade e o direito de andar armado?
(iii) Já deixaste de fazer vendas ilegais? (São duas questões: já cometeste ilegalidades? Já te deixaste disso?)
Prova:
Identifique as duas proposições conectadas e mostre que acreditar numa não implica acreditar na outra.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 86, Copi e Cohen: 96
Apelo a motivos em vez de razões
As falácias desta seção têm em comum o fato de apelarem a emoções ou a outros fatores psicológicos. Não levantam razões para apoiar a conclusão.
As seguintes falácias são apelos a motivos:
Apelo à força (argumentum ad baculum)
Definição:
O auditório é informado de que consequências desagradáveis se seguirão à discordância com o autor.
Exemplos:
(i) É melhor admitires que a nova orientação da empresa é a melhor — se pretendes manter o emprego.
(ii) A NAFTA é um erro! E se não votares contra a NAFTA então te votaremos para fora do escritório.
Prova:
Identifique a ameaça e a proposição. Argumente que a ameaça não tem relação com a verdade ou a falsidade da proposição.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 151, Copi e Cohen: 103
Apelo à piedade (argumentum ad misercordiam)
Definição:
Pede-se a aprovação do auditório na base do estado lastimoso do Autor.
Exemplos:
(i) Como pode dizer que eu reprovo? Eu estava mais perto da positiva e, além disso, estudei 16 horas por dia.
(ii) Esperamos que aceite as nossas recomendações. Passamos os últimos três meses a trabalhar desalmadamente nesse relatório.
Prova:
Identifique a proposição e o apelo à autoridade e argumente que o estado lastimoso do argumentador nada tem a ver com a verdade da proposição.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 151, Copi e Cohen: 103, Davis: 82
Apelo às consequências (argumentum ad consequentiam)
Definição:
O argumentador, para “mostrar” que uma crença é falsa, aponta consequências desagradáveis que advirão da sua defesa.
Exemplos:
(i) Não podes aceitar que a teoria da evolução é verdadeira, porque se ela fosse verdadeira não éramos melhores que os macacos.
(ii) Deve acreditar em Deus, porque de outro modo a vida não teria sentido. (Talvez. Mas também é possível dizer que, como a vida não tem sentido, Deus não existe.)
Prova:
Identifique as consequências e argumente que a realidade não tem de se adaptar aos nossos desejos.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 100, Davis: 63
Linguagem preconceituosa
Definição:
Termos carregados e emotivos são usados para ligar valores morais à crença na verdade da proposição.
Exemplos:
(i) Os portugueses bem intencionados estão de acordo em plebiscitar a pena de morte.
(ii) Pessoas razoáveis concordarão com a nossa política fiscal.
(iii) O primeiro ministro pretende que as novas taxas de juro ajudarão a diminuir o déficit. (O uso de “pretende” sugere que o primeiro ministro está errado.)
(iv) Os burocratas do Parlamento resistem às leis de defesa do patrimônio. (Compare com: “Os parlamentares rejeitaram a proposta de lei de defesa do patrimônio.”)
Prova:
Identifique os termos preconceituosos usados: (p. ex.: “portugueses bem intencionados” ou “Pessoas razoáveis”). Mostre que discordar da conclusão não é suficiente para dizer que a pessoa é “mal intencionada” ou “pouco razoável”.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 153, Davis: 62
Apelo ao povo (argumentum ad populum)
Definição:
Com esta falácia sustenta-se que uma proposição é verdadeira por ser aceita como verdadeira por algum setor representativo da população. Esta falácia é, por vezes, chamada “Apelo à emoção” porque os apelos emocionais pretendem atingir, muitas vezes, a população como um todo.
Exemplos:
(i) Se você fosse bela poderia viver como nós, então compre também Buty-EZ e torne-se bela. (Aqui apela-se às “pessoas bonitas”)
(ii) As sondagens sugerem que os liberais vão ter a maioria no parlamento, também deves votar neles.
(iii) Toda a gente sabe que a Terra é plana. Então porque insistes nas tuas excêntricas teorias?
Referências:
Copi e Cohen: 103, Davis: 62
Fugir ao assunto
As falácias desta seção fogem ao assunto, discutindo a pessoa que avançou um argumento em vez de discutir razões para aceitar ou não aceitar a conclusão. Em algumas ocasiões é aceitável citar autoridades (por exemplo, citar o médico para justificar o uso de um medicamento), quase nunca é apropriado discutir a pessoa em vez dos seus argumentos.
As falácias discutidas nesta seção são:
Ataques pessoais (argumentum ad hominem)
Definição:
Ataca-se pessoa que apresentou um argumento e não o argumento que apresentou. A falácia ad hominem assume muitas formas. Ataca, por exemplo, o caráter, a nacionalidade, a raça ou a religião da pessoa. Em outros casos, a falácia sugere que a pessoa, por ter algo tem algo a ganhar com o argumento, é movida pelo interesse. A pessoa pode ainda ser atacada por associação ou pelas suas companhias.
Há três formas maiores da falácia ad hominem:
(1) ad hominem (abusivo): em vez de atacar uma afirmação, o argumento ataca pessoa que a proferiu.
(2) ad hominem (circunstancial): em vez de atacar uma afirmação, o autor aponta para as circunstâncias em que a pessoa que a fez e as suas circunstâncias.
(3) ad hominem (tu quoque): esta forma de ataque à pessoa consiste em fazer notar que a pessoa não pratica o que diz.
Exemplos:
(i) Podes dizer que Deus não existe, mas estás apenas seguindo a moda. (ad hominem abusivo)
(ii) É natural que o ministro diga que essa política fiscal é boa porque ele não será atingido por ela. (ad hominem circunstancial)
(iii) Podemos passar por alto as afirmações de Simplício porque ele é patrocinado pela indústria da madeira. (ad hominem circunstancial)
(iv) Dizes que eu não devo beber, mas não estás sóbrio faz mais de um ano. (tu quoque)
Prova:
Identifique o ataque e mostre que o caráter ou as circunstâncias da pessoa nada tem a ver com a verdade ou falsidade da proposição defendida.
Referências:
Barker: 166, Cedarblom e Paulsen: 155, Copi e Cohen: 97, Davis: 80
Apelo à autoridade (argumentum ad verecundiam)
Definição:
Ainda que às vezes seja apropriado citar uma autoridade para suportar uma opinião, a maioria das vezes não o é. O apelo à autoridade é especialmente impróprio se:
(i) a pessoa não está qualificada para ter uma opinião de perito no assunto.
(ii) não há acordo entre os peritos do campo em questão.
(iii) a autoridade não pode, por algum motivo, ser levada a sério — porque estava a brincar, estava ébria ou por qualquer outro motivo.
Uma variante da falácia do apelo à autoridade é o “ouvi dizer” ou “diz-se que”. Um argumento por “ouvir dizer” é um argumento que depende de fontes em segunda ou terceira mão.
Exemplos:
(i) O famoso psicólogo Dr. Frasier Crane recomenda-lhe que compre o último modelo de carro da Skoda.
(ii) O economista John Kenneth Galbraith defende que uma apertada política econômica é a melhor cura para a recessão. (Apesar de Galbraith ser um perito, nem todos os economistas estão de acordo nesta questão.)
(iii) Encaminhamo-nos para uma guerra nuclear. A semana passada Ronald Reagan disse que começaríamos a bombardear a Rússia em menos de cinco minutos. (Claro que o disse por piada durante o teste do microfone)
(iv) Outro dia meu amigo viu no jornal que o Canadá declarará guerra à Sérvia. (Isso é um caso de ouvir dizer; na verdade, o repórter disse que o Canadá não declararia guerra.)
(v) Os cidadãos de Ottawa disseram que as vendas aumentaram 5.9 por cento este ano. (Isso é um ouvir dizer; não estamos em posição de verificar as fontes.)
Prova:
Mostre uma de duas coisas (ou ambas): (i) a pessoa citada não é uma autoridade no campo em questão; (ii) mesmo entre os especialistas não há consenso sobre o assunto discutido.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 155, Copi e Cohen: 95, Davis: 69
Autoridade anônima
Definição:
A autoridade em questão não é nomeada. Isto é uma forma de apelo à autoridade porque quando a autoridade não é nomeada é impossível confirmar se se trata de um perito. Esta falácia é tão comum que merece uma menção especial.
Uma variante desta falácia é o apelo ao rumor. Como a fonte do rumor é, em regra, desconhecida, não é possível verificar se o rumor merece crédito. Rumores falsos e caluniosos são lançados muitas vezes intencionalmente com o objetivo de desacreditar o oponente.
Exemplos:
(i) Um membro do governo disse hoje que uma nova lei sobre posse e uso de armas será proposta amanhã.
(ii) Os peritos dizem que a melhor maneira de prevenir uma guerra nuclear é estar preparado para ela.
(iii) Sabe-se que milhares de operações desnecessárias são realizadas todos os anos.
(iv) Diz-se por aí que o Primeiro Ministro vai decretar outro feriado antes das eleições.
Prova:
Argumente que pelo fato de não conhecermos a fonte e a base da informação, não temos maneira de avaliar a confiabilidade da informação.
Referências:
Davis: 73
Estilo sem substância
Definição:
Pretende-se que o modo como o argumento ou o argumentador se apresentam contribui para a verdade da conclusão.
Exemplos:
(i) Nixon perdeu o debate presidencial porque tinha suor na testa.
(ii) Trudeau sabe como dirigir as massas. Ele deve estar certo.
(iii) Porque não aceitas o conselho daquele jovem elegante e bem parecido?
Prova:
É um fato que o modo como o argumento é apresentado influencia a crença das pessoas na verdade da conclusão. Mas a verdade da conclusão não depende do modo como o argumento é apresentado. Para mostrar que esta falácia está a ser cometida, mostre que, neste caso, o estilo não afeta a verdade ou a falsidade da conclusão.
Referências:
Davis: 61
Falácias indutivas
O raciocínio indutivo consiste em inferir das propriedades de uma amostra para as propriedades de um elemento não pertencente à amostra ou para as propriedades da população como um todo.
Suponha, por exemplo, que temos uma lata com 1.000 feijões. Alguns são pretos e outros são brancos. Suponha agora que retiramos da lata uma amostra de 100 feijões e que 50 eram brancos e outros 50 eram pretos. Então podemos inferir indutivamente que metade dos feijões da lata (500 feijões) é preta e que a outra metade é branca.
Todo o raciocínio indutivo depende da similitude entre a amostra e a população. Quanto maior for a semelhança entre a amostra e a população como um todo, maior confiabilidade terá a inferência indutiva. Por outro lado, se a amostra tiver diferenças relevantes face à população, então a inferência indutiva não será confiável.
Nenhuma inferência indutiva é perfeita. Isto significa que qualquer inferência indutiva pode vir a falhar. Mesmo que as premissas sejam verdadeiras, a conclusão pode ser falsa. Apesar disso, uma boa inferência indutiva dá-nos uma razão para crermos que a conclusão é verdadeira.
As seguintes falácias indutivas são descritas nesta seção:
Generalização precipitada
Definição:
A amostra é demasiado limitada e é usada apenas para apoiar uma conclusão tendenciosa.
Exemplos:
(i) Fred, o Australiano, roubou a minha carteira. Portanto, os Australianos são ladrões. (Claro que não devemos julgar os Australianos na base de um exemplo)
(ii) Perguntei a seis dos meus amigos o que eles pensavam das novas restrições ao consumo e eles concordaram em que se trata de uma boa ideia. Portanto, as novas restrições são populares.
Prova:
Identifique as dimensões da amostra e a população em questão. Depois mostre que a amostra é insuficiente. Note: uma prova formal requer cálculo matemático porque está em jogo a teoria das probabilidades. Mas em muitas situações podemos confiar no bom senso.
Referências:
Barker: 189, Cedarblom e Paulsen: 372, Davis: 103
Amostra limitada
Definição:
Há diferenças relevantes entre a amostra usada na inferência indutiva e a população como um todo
Exemplos:
(i) Para vermos como os canadenses vão votar na próxima eleição, sondamos uma centena de pessoas em Calgary. Isto mostra, sem dúvida, que o Partido Reformador vai limpar as eleições. (As pessoas de Calgary tendem a ser mais conservadoras e, portanto, mais propensas a votar Reformador do que as outras pessoas no resto do país).
(ii) As maçãs do topo da caixa parecem boas. Todas as maçãs desta caixa devem ser boas. (As maçãs com bicho, claro, estão em camadas mais fundas…)
Prova:
Mostre que há diferenças relevantes entre a amostra e a população como um todo. Depois, argumente que por a amostra ser diferente, a conclusão é provavelmente diferente.
Referências:
Barker: 188, Cedarblom e Paulsen: 226, Davis: 106
Falsa analogia
Definição:
Numa analogia mostra-se, primeiro, que dois objetos, A e B, são semelhantes em algumas das suas propriedades, R, S, T. Conclui-se, depois, que como A tem a propriedade P, então B também deve ter a propriedade P. A analogia falha quando os dois objetos, A e B, diferem de tal modo que isso possa afetar o fato de ambos terem a propriedade P. Diz-se, neste caso, que a analogia esqueceu diferenças relevantes.
Exemplos:
(i) Os empregados são como pregos. Temos de martelar a cabeça dos pregos para estes desempenharem a sua função. O mesmo deve acontecer aos empregados.
(ii) O Governo é como o negócio. Assim, como o negócio deve ser sensível, em primeiro lugar, ao balanço final, também o governo o deve ser. (Mas os objetivos do governo e dos negócios são completamente diferentes; assim, provavelmente têm de encontrar critérios diferentes)
Prova:
Identifique os dois objetos ou eventos que estão a ser comparados e a propriedade que se diz que ambos possuem. Mostre que os dois objetos diferem de tal modo que a analogia se torna insuficiente.
Referências:
Barker: 192, Cedarblom e Paulsen: 257, Davis: 84
Indução preguiçosa
Definição:
A conclusão apropriada de um argumento indutivo é negada apesar dos dados.
Exemplos:
(i) Hugo teve doze acidentes nos últimos 6 meses. No entanto, ele continua a dizer que se trata de coincidência e não de culpa sua. (Indutivamente, as provas apontam irresistivelmente para a culpa de Hugo. Este exemplo foi retirado de Barker, p. 189)
(ii) Sondagens e mais sondagens mostram que o N.D.P. ganhará menos de 10 lugares no Parlamento. Apesar disso, o líder do Partido insiste em que o Partido está a fazer melhor do que as sondagens sugerem. (De fato o N.D.P. só obteve 9 lugares)
Prova:
Acima de tudo pode insistir na força da inferência.
Referências:
Barker: 189
Omissão de provas
Definição:
Dados importantes, que arruinariam um argumento indutivo, são excluídos. A exigência de que toda a informação relevante e disponível seja incluída num argumento indutivo, é chamada “princípio da evidência total”.
Exemplos:
(i) Jones é Albertano, e a maioria dos Albertanos vota Tori, portanto Jones provavelmente votará Tory. (A informação deixada de fora é que Jones vive em Edmonton e a maioria dos Edmontanos vota Liberal ou N.D.P.)
(ii) Muito provavelmente os Leafs vão ganhar este jogo porque ganharam nove dos últimos dez jogos. (Oito das vitórias dos Leafs foram obtidas sobre equipes de escalões secundários, na fase de preparação, e agora vão defrontar uma equipe de primeiro plano)
Prova:
Exponha os dados em falta e mostre que eles mudam a conclusão do argumento indutivo. Note que não basta mostrar que nem todas as provas foram incluídas — é preciso mostrar que as provas em falta justificam outra conclusão.
Referências:
Davis: 115
Falácias envolvendo silogismos estatísticos
Uma generalização estatística é um enunciado habitualmente verdadeiro, mas nem sempre o é. A generalização estatística é indicada, muitas vezes, por expressões como “quase sempre” ou “a maioria”. Por exemplo, “a maioria dos conservadores favorece cortes na Segurança Social”.
A generalização estatística nem sempre é verdadeira. Portanto, quando um autor trata a generalização estatística como se ela fosse sempre verdadeira, comete uma falácia.
Esta seção descreve as seguintes falácias que envolvem silogismos estatísticos:
Acidente
Definição:
Uma regra geral é aplicada quando as circunstâncias sugerem que a exceção à regra deve ser aplicada.
Exemplos:
(i) A lei diz que não deves conduzir a mais de 50 Km/h. Portanto, mesmo que o teu pai não possa respirar, não deves passar dos 50 Km/h.
(ii) É bom devolver as coisas que nos emprestaram. Portanto, deves devolver essa arma automática ao louco que te emprestou. (Adaptado de Platão, “A República”, I).
Prova:
Identifique a generalização em questão e mostre que não é uma generalização universal. Depois mostre que as circunstâncias deste caso sugerem que a generalização não deve aplicar-se.
Referências:
Copi e Cohen: 100
Inversa do acidente
Definição:
Uma exceção à generalização é aplicada nos casos em que a generalização deve aplicar-se.
Exemplos:
(i) Se deixarmos os doentes terminais usarem heroína, devemos deixar toda a gente usá-la.
(ii) Se deixou que Joana, a tal moça que foi atropelada por um caminhão, entregasse o trabalho mais tarde, também deveria permitir que toda a turma entregasse o trabalho mais tarde.
Prova:
Identifique a generalização em questão e mostre como o caso especial é uma exceção à generalização.
Referências:
Copi e Cohen: 100
Falácias causais
Os argumentos causais são os argumentos onde se conclui que uma coisa ou acontecimento causa outra. São muito comuns, mas como a relação entre causa e efeito é complexa, é fácil cometer erros.
Em regra, dizemos que a causa C é a causa do efeito E se e só se:
(i) Geralmente, quando C ocorre, também E ocorre, e
(ii) Geralmente, se C não ocorre, então E também não ocorre.
Dizemos “geralmente” porque há sempre exceções.
Dizemos, por exemplo, que riscar o fósforo é a causa da chama porque:
(i) Geralmente, quando riscamos o fósforo, ele acende (exceto quando riscamos o fósforo dentro de água…), e
(ii) Geralmente, quando o fósforo não é riscado, ele não acende (exceto quando o acendemos com um maçarico…)
Muitos estudiosos requerem também que um enunciado causal seja apoiado por uma lei da natureza. Por exemplo, o enunciado “riscar o fósforo é a causa da chama” é justificado pelo princípio “a fricção produz calor, e o calor produz o fogo”. Os seguintes argumentos são falácias causais:
  • Post hoc (Por uma coisa se seguir a outra, conclui-se que ela é a causa da outra.)
  • Efeito conjunto (A alegada causa e o efeito são ambos efeitos de uma mesma causa.)
  • Insignificância (A causa alegada é insignificante quando comparada a outras.)
  • O efeito pela causa (A direção entre causa e efeito foi invertida)
  • Causa complexa (A causa identificada é apenas uma parte do conjunto de causas do objeto ou acontecimento.)
Correlação de coincidência (post hoc ergo propter hoc)
Definição:
O nome em Latim significa: “depois disso, logo, por causa disso”. Isto descreve a falácia. Um autor comete a falácia quando assume que, por uma coisa se seguir a outra, então aquela teve de ser causada por esta.
Exemplos:
(i) A imigração de Alberta para Ontário aumentou mal a prosperidade aumentou. Portanto o incremento da imigração foi causado pelo incremento da prosperidade.
(ii) Tomei o EZ-Mata-Gripe e dois dias depois a minha gripe desapareceu…
Prova:
Mostre que a correlação é coincidência, mostrando: (i) que o “efeito” teria ocorrido mesmo sem a alegada causa ocorrer, ou que (ii) o efeito teve uma causa diferente da que foi indicada.
Referências:
(Cedarblom e Paulsen: 237, Copi e Cohen: 101)
Efeito conjunto
Definição:
Sustenta-se que uma coisa causa outra quando, de fato, são ambas o efeito de uma mesma causa subjacente. Esta falácia é muitas vezes apresentada como um caso especial de falácia post hoc ergo propter hoc.
Exemplos:
(i) Estamos a viver uma fase de elevado desemprego que é provocado por uma baixa procura de consumo. (na verdade, ambos podem ser causados por taxas de juro muito elevadas)
(ii) Estás com febre e isso está a fazer com que te enchas de borbulhas. (na verdade, ambos os sintomas são causados pelo sarampo)
Prova:
Identifique os dois efeitos e mostre que ambos são provocados pela mesma causa subjacente. É preciso indicar a causa oculta e provar que ela causa cada efeito.
Referências:
(Cedarblom e Paulsen: 238)
Causa genuína mas insignificante
Definição:
O objeto ou evento identificado como sendo a causa de um efeito, é uma causa genuína — mas insignificante quando comparada com outras causas desse evento. Note que não se trata desta falácia quando todas as outras causas são igualmente insignificantes. Não é falacioso dizer que a sua ajuda causou a derrota do partido do governo, porque o seu voto tem o mesmo peso de qualquer outro voto e, portanto, é igualmente parte da causa.
Exemplos:
(i) Fumar causa a poluição do ar em Edmonton. (É verdade, mas o efeito do fumo do tabaco é insignificante comparado com o efeito poluente dos automóveis)
(ii) Deixando a tua fornalha acesa durante a noite contribui para o aquecimento global do planeta.
Prova:
Identifique uma causa mais significativa.
Referências:
(Cedarblom e Paulsen: 238)
O efeito pela causa
Definição:
A relação entre causa e efeito é invertida.
Exemplos:
(i) O câncer faz fumar.
(ii) A propagação da AIDS foi provocada pela educação sexual. (Na verdade, o desenvolvimento da educação sexual foi provocado pela propagação da AIDS)
Prova:
Exponha um argumento causal, mostrando que a relação entre causa e efeito foi, de fato, invertida.
Referências:
(Cedarblom e Paulsen: 238)
Causa complexa
Definição:
O efeito é provocado por um certo número de objetos ou eventos, dos quais a causa identificada é apenas um parte. Uma variante disto são os ciclos de feedback onde o efeito é ele mesmo parte da causa.
Exemplos:
(i) O acidente não teria ocorrido se não fosse a má localização do arbusto. (Certo, mas o acidente não teria ocorrido se o condutor não estivesse bêbado, e o peão tivesse prestado atenção ao trânsito)
(ii) A explosão do Challenger foi causada pelo tempo frio. (Verdadeiro, mas não teria ocorrido se os O-anéis fossem bem construídos)
(iii) As pessoas estão com medo por causa do incremento do crime. (Certo, mas as pessoas têm sido levadas a violar a lei em consequência do seu medo. O que ainda incrementa mais o crime)
Prova:
Mostre que todas as causas, e não apenas aquela que foi mencionada, são precisas para explicar o efeito.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 238
Errando o alvo
Estas falácias têm em comum o fato de falharem a prova de que a conclusão é verdadeira.
As seguintes falácias são casos “errando o alvo”:
Petição de princípio (petitio principii)
Definição:
A verdade da conclusão é assumida pelas premissas. Muitas vezes, a conclusão é apenas reafirmada nas premissas de uma forma ligeiramente diferente. Nos casos mais sutis, a premissa é consequência da conclusão.
Exemplos:
(i) Dado que não estou a mentir, segue-se que estou a dizer a verdade.
(ii) Sabemos que Deus existe, porque a Bíblia o diz. E o que a Bíblia diz deve ser verdadeiro, dado que foi escrita por Deus e Deus não mente. (Neste caso teríamos de concordar primeiro que Deus existe para aceitarmos que ele escreveu a Bíblia.)
Prova:
Mostre que para acreditarmos nas premissas já teríamos de aceitar a conclusão.
Referências:
Barker: 159, Cedarblom e Paulsen: 144, Copi e Cohen: 102, Davis: 33
Conclusão irrelevante (ignoratio elenchi)
Definição:
Um argumento prova uma coisa diferente da pretendida.
Exemplos:
(i) Deves aceitar a nova política de arrendamento. Não podemos continuar a ver pessoas a viver nas ruas, devemos ter rendas mais baratas. (Podemos pensar que é inaceitável ver pessoas a viver nas ruas e, no entanto, não estarmos de acordo com as novas rendas)
(ii) A lei deve estipular uma percentagem mínima de mulheres nos cargos políticos, repartições e empresas. Os homens dominam praticamente todos os cargos importantes. Só uma sociedade discriminatória o pode suportar. Não fazermos nada para alterar esse estado de coisas é inaceitável. (Podemos concluir, com o argumentador, que a nossa sociedade é machista sem termos de aceitar que a discriminação positiva que ele propõe seja a solução)
Prova:
Mostre que a conclusão apresentada pelo argumentador, com a qual até pode concordar, não é a conclusão que ele pretendia tirar.
Referências:
Copi e Cohen: 105
Espantalho
Definição:
O argumentador, em vez de atacar o melhor argumento do seu opositor, ataca um argumento diferente, mais fraco e/ou tendenciosamente interpretado. Infelizmente é uma das “técnicas” de argumentação mais usadas…
Exemplos:
(i) As pessoas que querem legalizar o aborto querem prevenção irresponsável da gravidez. Mas nós queremos uma sexualidade responsável. Logo, o aborto não deve ser legalizado.
(ii) Devemos manter o recrutamento obrigatório. As pessoas não querem o fazer o serviço militar porque não lhes convém. Mas devem reconhecer que há coisas mais importantes do que a conveniência.
Prova:
Mostre que o argumento oposto foi mal representado, mostrando que os opositores têm argumentos mais fortes. Descreva um argumento mais forte.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 138
Falácias de ambiguidade
As falácias desta seção são, todas elas, falácias geradas pela falta de clareza no uso de uma frase ou palavra. Dois modos de isto suceder:
(i) A palavra ou frase pode ser ambígua, caso em que tem mais de sentido distinto.
(ii) A palavra ou frase pode ser vaga. Nesse caso não tem um sentido distinto.
As seguintes falácias são de ambiguidade:
  • Equívoco (O mesmo termo é usado de duas maneiras diferentes)
  • Anfibologia (A estrutura de uma frase permite duas interpretações diferentes)
  • Ênfase (Uma ênfase sugere um significado diferente do qual é normalmente usado)
Equívoco
Definição:
A mesma palavra pode ser usada com dois significados diferentes
Exemplos:
(i) Criminalidade é ilegalidade. O julgamento de um roubo ou assassínio são ações criminais. Os julgamentos de roubos e assassínios são designados de ações criminais. Logo, os julgamentos de roubos e assassínios são ilegais. (Exemplo retirado de Copi)
(ii) Os assassinos de crianças são desumanos. Portanto, os humanos não matam crianças. (O argumento joga com os significados moral e descritivo de “humano”)
(iii) Para ser grande ou pequeno um objeto tem, primeiro, de ser. Logo, o ser do objeto surgiu primeiro. (Jogo com os significados lógico e físico de “ser”)
Prova:
Identifique a palavra que é usada mais de uma vez. Depois, mostre que a palavra surge com diferentes definições, inadequadas num dos seus usos, adequadas em outros.
Referências:
(Barker: 163, Cedarblom e Paulsen: 142, Copi e Cohen: 113, Davis: 58)
Anfibologia
Definição:
Uma anfibologia ocorre quando a construção da frase permite atribuir-lhe diferentes significados
Exemplos:
(i) No teu emprego todos gostam de um carro. Portanto, há um carro muito especial. (Todos gostam de pelo menos um carro ou de um mesmo carro?)
(ii) O Oráculo de Delos disse a Croseus que se ele continuasse a guerra destruiria um reino poderoso. (O Oráculo não disse que seria o seu próprio reino…)
Prova:
Evidencie a ambiguidade da frase, mostrando que ele pode receber diferentes interpretações.
Referências:
(Copi e Cohen: 114)
Ênfase
Definição:
A ênfase é usada para sugerir uma proposição diferente daquela que, de fato, é expressa.
Exemplos:
(i) Não distribuímos CERVEJA GRÁTIS!
(ii) A ex-namorada, procurando vingar-se do capitão, escreveu no jornal: “hoje o capitão estava sóbrio” (Ela sugere, com a ênfase, que habitualmente o capitão está bêbado. Copi, p. 117)
Referências:
(Copi e Cohen: 115)
Erros de categorização
Estas falácias ocorrem porque o autor assume erroneamente que as partes e o todo devem ter propriedades semelhantes. No entanto, as coisas podem ter, como um todo, propriedades diferentes das que cada uma tinha em separado.
As seguintes falácias são erros de categorização:
Composição
Definição:
Por as partes de um todo terem uma certa propriedade, argumenta-se que o todo tem essa mesma propriedade. Esse todo pode ser tanto um objeto composto de diferentes partes, como uma coleção ou conjunto de membros individuais.
Exemplos:
(i) Cada tijolo tem três polegadas de altura, portanto a parede de tijolo tem três polegadas de altura.
(ii) As células não têm consciência. Portanto, o cérebro, que é feito de células, não tem consciência.
Prova:
Identifique o todo e as partes em questão. Mostre que, em geral, o todo não tem de ter as propriedades das partes, ou, podendo ser mais específico, mostre que o todo em questão não tem as propriedades das partes.
Referencias
(Barker: 164, Copi e Cohen: 117)
Divisão
Definição:
Como o todo tem uma certa propriedade, argumenta-se que as partes têm essa propriedade. O todo em questão pode ser tanto um objeto como uma coleção ou conjunto de membros individuais.
Exemplos:
(i) Cada tijolo da parede tem três polegadas de altura. Portanto a parede de tijolos tem três polegadas de altura.
(ii) Como o cérebro tem consciência, cada célula do cérebro deve ter a consciência.
(iii) Como tudo tem uma causa, então há uma causa de tudo.
(iv) Como todos têm uma mãe, então há uma mãe de todos.
Prova:
Mostre que as propriedades em questão são propriedades das partes, mas não do todo. Se for preciso, descreva as partes para mostrar que elas não têm as propriedades do todo.
Referências:
Barker: 164, Copi e Cohen: 119
Non sequitur
O termo non sequitur significa literalmente “não se segue que”. Nesta seção descrevemos falácias que ocorrem como consequência da sua forma de argumento inválida. As seguintes falácias são non sequiturs:
Afirmação do consequente
Definição:
Todo o argumento com a seguinte forma é inválido:
Se A então B
Ora, B
Logo, A
Exemplos:
(i) Se jogamos bem, ganhamos. Ora, ganhamos. Logo, jogamos bem. (Na verdade, jogamos mal, mas o adversário jogou pior e o árbitro ajudou)
(ii) Se estou em Campinas, estou em São Paulo. Ora, estou em São Paulo. Logo, estou em Campinas. (Claro, ainda que as premissas sejam verdadeiras, posso estar em Santos ou em Presidente Prudente.)
(iii) Se a fábrica estivesse poluindo o rio, então veríamos o número de peixes mortos aumentar. Há cada vez mais peixes a morrer. Logo, a fábrica está poluindo o rio.
Prova:
Mostre que, mesmo sendo as premissas verdadeiras, a conclusão pode ser falsa. Em geral, basta mostrar que B pode ser consequência de outra coisa que não A. Por exemplo, a morte dos peixes pode ser provocada pela aplicação de pesticidas e não pela fábrica.
Referências:
Barker: 69, Cedarblom e Paulsen: 24, Copi e Cohen: 241
Negação do antecedente
Definição:
Os argumentos com a seguinte forma são inválidos:
Se A então B
Não-A
Logo, não-B
Exemplos:
(i) Se fores atingido por um carro quando tiveres 6 anos, morres jovem. Mas não foste atingido por um carro aos 6 anos. Portanto, não vais morrer jovem. (Claro que ele poderia ser atingido por um comboio com a idade de 6 anos e, nesse caso, morria jovem)
(ii) Se estou em Faro, então estou no Algarve. Não estou em Faro. Logo, não estou no Algarve. (Mas pode estar em Olhão…)
Prova:
Mostre que a conclusão pode ser falsa mesmo que as premissas sejam verdadeiras. Em particular, mostre que o consequente, B, pode ocorrer mesmo que A não ocorra.
Referências:
Barker: 69, Cedarblom e Paulsen: 26, Copi e Cohen: 241
Inconsistência
Definição:
O argumentador avança pelo menos duas proposições que não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. Em tais casos as proposições podem ser contrárias ou contraditórias.
Exemplos:
(i) Montreal está a cerca de 200 km de Otava, enquanto Toronto está a 400 km de Otava. Toronto está mais perto de Otava do que Montreal.
(ii) John é maior do que Jake, e Jake é maior do que Fred, enquanto Fred é maior do que John.
Prova:
Assuma que um dos enunciados é verdadeiro e use-o como uma premissa para mostrar que o outro enunciado é falso.
Referências:
Barker: 157
Erros silogísticos
As falácias nesta seção são todas casos de silogismos categóricos inválidos. Leitores que não estão familiarizados com silogismos categóricos devem consultar o Guia do Stephen de Silogismos Categóricos.
As seguintes falácias são silogísticas:
Falácia dos quatro termos (quaternio terminorum)
Definição:
Exemplos:
(i) Todos os cães são animais e todos os gatos são mamíferos, portanto todos os cães são mamíferos.
Os quatro termos são: cães, animais, gatos e mamíferos.
Nota: Em muitos casos a falácia dos quatro termos é um caso especial de equívoco. Enquanto a mesma palavra é usada, a palavra possui significados diferentes e, portanto, a palavra é tratada como dois termos diferentes. Considere o exemplo seguinte:
(ii) Apenas o homem nasce livre e nenhuma mulher é homem, portanto, nenhuma mulher nasce livre.
Os quatro termos são: homem (no sentido de “humanidade”), homem (no sentido de “macho, masculino”), mulher e nasce livre.
Prova:
Identifique os quatro termos e onde necessário enuncie o significado de cada termo.
Referências:
Copi e Cohen: 206
Meio não distribuído
Definição:
termo do meio nas premissas de uma forma padrão de silogismo categórico nunca se refere à totalidade dos membros da categoria que ele descreve.
Exemplos:
(i) Todos os russos eram revolucionários e todos os anarquistas eram revolucionários, portanto, todos os anarquistas eram russos.
O termo do meio é “revolucionário”. Mesmo que ambos russos e anarquistas compartilhem a propriedade comum de serem revolucionários, eles podem ser grupos separados de revolucionários, portanto não podemos concluir que os anarquistas são o mesmo que russos de maneira alguma. Exemplo de Copi e Cohen, 208.
(ii) Todos os que ultrapassam receberão tiros e alguém foi atingido por um tiro, portanto, alguém ultrapassou.
O termo do meio é “tiro”. Mesmo que ambos “alguém” e “quem ultrapassa” compartilhem a propriedade de terem recebido um tiro, isso não quer dizer que o alguém em questão ultrapassou, ele pode ter sido vítima de um assalto.
Prova:
Mostre como cada uma das duas categorias identificadas na conclusão podem ser grupos separados, mesmo que compartilhem uma propriedade em comum.
Referências:
Copi e Cohen: 207
Ilícito maior
Definição:
O termo predicado da conclusão refere-se à totalidade dos membros desta categoria, mas o mesmo termo nas premissas refere-se apenas a alguns membros desta categoria.
Exemplos:
(i) Todos os cariocas são brasileiros e nenhum paulista é carioca, portanto, nenhum paulista é brasileiro.
O termo predicado na conclusão é “cariocas”. A conclusão refere-se a todos os brasileiros (cada brasileiro não é paulista, de acordo com a conclusão). Mas as premissas referem-se apenas a alguns brasileiros (aqueles que são cariocas).
Prova:
Mostre que pode haver outros membros da categoria do predicado que não foram mencionados nas premissas e que são contrários à conclusão.
Por exemplo, no (i) acima, pode-se dizer que “Embora seja verdade que todos os cariocas são brasileiros, também é verdade que o Faustão é brasileiro, mas o Faustão é paulista, então não é verdade que nenhum paulista é brasileiro”.
Referências:
Copi e Cohen: 207
Ilícito menor
Definição:
O termo sujeito da conclusão refere-se à totalidade de membros desta categoria, mas o mesmo termo nas premissas refere-se apenas a alguns membros desta categoria.
Exemplos:
(i) Todos os comunistas são subversivos e todos os comunistas são críticos do capitalismo, portanto, todos os críticos do capitalismo são subversivos.
O termo sujeito na conclusão é “críticos do capitalismo”. A conclusão refere-se a todos os críticos. A premissa que “todos os comunistas são críticos do capitalismo” refere-se apenas a alguns críticos do capitalismo; pode haver outros críticos que não são comunistas.
Prova:
Mostre que pode haver outros membros da categoria do sujeito que não foram mencionados nas premissas que são contrários à conclusão.
Por exemplo, no (i) acima, pode-se dizer que “Embora seja verdade que todos os comunistas são críticos do capitalismo, também é verdade que Thomas Jefferson foi um crítico do capitalismo, mas Thomas Jefferson não era subversivo, então nem todos os críticos do capitalismo são subversivos”.
Referências:
Copi e Cohen: 208
Premissas exclusivas
Definição:
Uma forma padrão de silogismo categórico possui duas premissas negativas (uma premissa negativa é qualquer premissa na forma “Nenhum S é P” ou “Alguns S não são P”).
Exemplos:
(i) Nenhum nova-iorquino é brasileiro e nenhum brasileiro é americano, portanto, nenhum nova-iorquino é americano.
Na verdade, já que Nova Iorque é um estado dos Estados Unidos, todos os nova-iorquinos são americanos.
Prova:
Presuma que as premissas são verdadeiras. Encontre um exemplo que permita que as premissas sejam verdadeiras, mas que claramente contradiga a conclusão.
Referências:
Copi e Cohen: 209
Falácia de criar uma conclusão afirmativa de uma premissa negativa
Definição:
A conclusão da forma padrão de silogismo categórico é afirmativa, mas pelo menos uma das premissas é negativa.
Exemplos:
(i) Todos os ratos são animais e alguns animais não são perigosos, portanto alguns ratos são perigosos.
(ii) Nenhuma pessoa honesta rouba e todas as pessoas honestas pagam impostos, então algumas pessoas que roubam pagam impostos.
Prova:
Presuma que as premissas são verdadeiras. Encontre um exemplo que permita que as premissas sejam verdadeiras, mas que claramente contradiga a conclusão.
Referências:
Copi e Cohen: 210
Falácia existencial
Definição:
Uma forma padrão de silogismo categórico com duas premissas universais possui uma conclusão particular.
A ideia é que algumas propriedades universais não precisam ser exemplificadas. Pode até ser verdade que “todos os que ultrapassarem serão alvejados”, mesmo se não houver ninguém que ultrapasse. Pode ser verdade que “todos os trens sem freio são perigosos”, embora não exista trem sem freio. Esta é a ideia desta falácia.
Exemplos:
(i) Todos os camundongos são animais e todos os animais são perigosos, então alguns camundongos são perigosos.
(ii) Nenhuma pessoa honesta rouba e todas as pessoas honestas pagam impostos, então algumas pessoas honestas pagam impostos.
Prova:
Presuma que as premissas são verdadeiras, mas que não existem exemplos da categoria descrita. Por exemplo, no (i) acima, presuma que não há camundongo e no (ii) acima, presuma que não há pessoa honesta. Isto mostra que a conclusão é falsa.
Referências:
Copi e Cohen: 210
Falácias de explicação
Uma explicação é uma forma de raciocínio que tenta dar resposta à pergunta “Por quê?” Por exemplo: é com uma explicação que respondemos a uma pergunta como “Por que o céu é azul?”
Uma boa explicação será baseada numa teoria científica ou empírica. A explicação do azul do céu será dada em termos da composição dos céus e das teorias da reflexão.
Falácias da explicação:
Inventando fatos
Definição:
Uma explicação pretende dizer-nos por que acontece certo fenômeno. A explicação é falaciosa se o fenômeno não ocorre ou se não houver prova de que possa ocorrer.
Exemplos:
(i) A razão da timidez da maioria dos solteiros reside no caráter possessivo das mães. (Uma tentativa de explicar por que a maioria dos solteiros é tímida. No entanto não sucede que a maioria dos solteiros sejam pessoas tímidas)
(ii) João entrou na loja porque queria ver a Maria. (Isto é uma falácia porque, na verdade, João queria ver a Maria, mas sabia ela não estava na loja. Por isso não entrou…)
(iii) A razão pela qual a maioria das pessoas se opõe à greve é o medo de perder o emprego. (Pretende-se explicar a oposição dos trabalhadores à greve. Mas suponha que eles votem a continuação da greve. Então não há, de fato, oposição à greve. Isto tem acontecido…)
Prova:
Identifique o fenômeno que está a ser explicado. Mostre que não há razão para acreditar que o fenômeno tenha de fato ocorrido.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 158
Torcendo os fatos
Definição:
Uma explicação pretende dizer-nos por que acontece certo fenômeno (fato). O fenômeno ou fato está estabelecido, o argumento visa estabelecer a explicação. Neste tipo de falácia, no entanto, apesar de algo semelhante ao fenômeno a explicar ter ocorrido, ele é falsificado, montado com parcialidade ou baseado em provas ad hoc.
Exemplos:
(i) A timidez da maioria dos solteiros explica-se pelo caráter dominador das mães. (Pretende-se explicar a timidez da maioria dos solteiros. No entanto, provou-se que o autor baseou a sua argumentação em dois solteiros que conheceu em tempos, sendo ambos tímidos… Isto está longe de ser artificial: é assim que muitas vezes formamos a nossa opinião sobre diversos grupos humanos)
(ii) A razão pela qual obtenho boas classificações é que os meus alunos me apreciam. (Isto é uma falácia quando as avaliações com menos de 70% são eliminadas com a justificação de que os alunos não compreenderam a questão…)
Prova:
Identifique o fenômeno que está a ser explicado. Mostre que as provas avançadas para afirmar a existência do fenômeno foram, de algum modo, manipuladas.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 160
Irrefutabilidade
Definição:
A teoria que foi apresentada para explicar a ocorrência de algum fenômeno não pode ser testada.
Testamos uma teoria por meio das suas previsões. Por exemplo, uma teoria pode predizer que a luz encurva em certas condições, ou que um líquido muda de cor com o ácido, ou que um psicótico responda mal a certos estímulos. Se o evento previsto não ocorrer, então as provas contradizem a teoria.
Uma teoria não pode ser testada se não faz previsões. Também não é testada quando prevê acontecimentos que poderiam ocorrer, fosse ou não a teoria verdadeira.
Exemplos:
(i) Um avião desapareceu no meio do Atlântico devido ao efeito do Triângulo das Bermudas, uma força tão sutil que não pode ser medida por qualquer instrumento. (A força do Triângulo das Bermudas não manifesta qualquer efeito para além do desaparecimento ocasional de um avião. Por isso, a única previsão que ela permite é que mais aviões se perderão. Mas isto é o que pode muito bem acontecer independentemente de a teoria ser verdadeira ou falsa.)
(ii) Ganhei a loteria porque a minha aura psíquica fez-me ganhar (Uma maneira de testar esta teoria é tentar ganhar de novo a loteria. Mas a pessoa responde que essa aura só o faz ganhar uma vez. Não há, portanto, uma maneira de determinar se o ganho foi resultado da aura ou do acaso.)
(iii) A razão pela qual tudo existe é que Deus tudo criou. (Isto pode ser verdade, mas a explicação não tem qualquer peso porque não temos meios para testar tal teoria. Nenhuma evidência no mundo pode mostrar que esta teoria é falsa porque, de acordo com tal teoria, todos os fatos foram criados por Deus.)
(iv) NyQuil fá-lo dormir devido à sua fórmula dormitiva. (Quando pressionado, o fabricante definirá a “fórmula dormitiva” como “qualquer coisa que o faz dormir”. Para testar esta teoria, teríamos de descobrir outra coisa que contivesse a fórmula dormitiva e verificar se ela faz dormir. Mas, como encontramos alguma coisa que contenha a fórmula dormitiva? Procuramos por coisas que façam dormir! Mas nós podemos predizer que as coisas que fazem dormir, fazem dormir, não interessando o que a teoria diz. Esta teoria é vazia.)
Prova:
Identifique a teoria. Mostre que ela não faz previsões ou que as previsões feitas com a teoria são falsas ou que as previsões que ela faz podem ser verdadeiras mesmo que a teoria seja falsa.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 161
Âmbito limitado (Ad Hoc)
Definição:
A teoria só explica um fenômeno e nada mais.
Exemplos:
(i) Havia hostilidade em relação aos hippies dos anos 60 por causa do ressentimento dos seus pais em relação às crianças. (Esta é deficiente porque explica a hostilidade em relação aos hippies e nada mais. Uma teoria melhor seria dizer que havia hostilidade em relação aos hippies porque os hippies são diferentes, e as pessoas temem coisas diferentes. Esta teoria explicaria não só a hostilidade em relação aos hippies, mas também outras formas de hostilidade. )
(ii) As pessoas tornam-se esquizofrênicas porque as diferentes partes do seu cérebro funcionam separadas. (Esta teoria explica a esquizofrenia e nada mais.)
Prova:
Identifique a teoria e o fenômeno que ela explica mostre que a teoria não explica nada mais. Argumente que as teorias que só explicam um fenômeno estão, no melhor dos casos, incompletas.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 163
Profundidade limitada (superficialidade)
Definição:
As teorias explicam os fatos apelando a causas ou fenômenos subjacentes. As teorias que não apelam a causas subjacentes e apenas apelam à pertença a uma categoria (apenas incluem o fenômeno em uma classe de fenômenos) são superficiais.
Exemplos:
(i) A minha gata gosta de atum porque é uma gata. (Esta teoria apenas afirma que os gatos gostam de atum, sem explicar este fato.)
(ii) Ronald Reagan era militarista porque era americano. (Certo, ele era americano. Mas, em que é que o fato de ser americano o torna militarista? O que o levou a agir desta maneira? A teoria não nos diz isso e, portanto, não nos dá uma boa explicação.)
(iii) Está dizendo isso só porque pertences à União. (Esta tentativa de rejeição do argumento pretende explicar o comportamento do opositor como manifestação de frivolidade. Falha, no entanto, porque não é uma explicação. Suponhamos que toda a gente da União dizia o mesmo. E daí? Tínhamos de ir mais fundo — tínhamos de perguntar por que razão toda a gente da União dizia isso, antes de podermos concluir que as afirmações do opositor são frívolas.)
Prova:
As teorias desta espécie tentam explicar um fenômeno mostrando que ele é parte de uma classe ou categoria de fenômenos semelhantes. Aceitando esse fato exija uma explicação mais vasta para os fenômenos dessa categoria. Argumente que uma teoria explicativa deve referir causas e não apenas classificações.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 164
Falácias de definição
Usamos definições para tornar os nossos conceitos mais claros. O propósito da definição é enunciar com exatidão o significado de uma palavra. Uma boa definição deve permitir que o leitor a aplique a casos concretos sem ajuda exterior.
Por exemplo, suponhamos que queremos definir a palavra “maçã”. Se a definição for bem sucedida, então o leitor deve estar apto a ir para o mundo e a aplicá-la a cada maçã que existe e só a maçãs. Se o leitor deixar passar algumas maçãs ou incluir outros objetos (como pêras) ou não puder dizer se algo é maçã ou não, então a definição é falha. As definições não são argumentos. Por isso, não se pode, com rigor, falar de “Falácias de definição”. Mas definições incorretas, por vezes tendenciosas, são muitas vezes incluídas em argumentos, tornando-os falaciosos.
Falácias de definição:
  • Demasiado ampla (A definição inclui itens que não devia incluir.)
  • Demasiado restrita (A definição não abrange tudo o que devia abranger.)
  • Falta de clareza (A definição é mais difícil de entender do que a palavra ou conceito que está a ser definido.)
  • Circularidade (A definição inclui o termo a definir como parte da definição.)
  • Contradição (A definição é contraditória.)
Demasiado ampla
Definição:
A definição inclui mais do que devia incluir.
Exemplos:
(i) Uma maçã é um objeto vermelho e redondo. (O planeta Marte é vermelho e redondo. Portanto, está incluído na definição. Mas é óbvio que Marte não é uma maçã.)
(ii) Uma figura é quadrada se e somente se tiver quatro lados de igual comprimento. (Não são só quadrados que têm quatro lados de igual comprimento. Os losangos também.)
Prova:
Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Procure um objeto que preencha as condições da conclusão mas que obviamente não seja uma instância do termo a definir.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 182
Demasiado restrita
Definição:
A definição não inclui tudo o que deveria incluir.
Exemplos:
(i) Uma maçã é algo vermelho e redondo. (Há muitas maçãs, e deliciosas maçãs, que, não sendo maçãs vermelhas, não estão incluídas na definição e deveriam estar.)
(ii) Um livro é pornográfico se e somente se contiver fotografias de pessoas nuas. (Os livros escritos pelo Marquês de Sade não contêm figuras. No entanto, são tidos como sendo pornográficos. Portanto, a definição é demasiado limitada)
(iii) Alguma coisa é música se e somente se for tocável num piano. (Um solo de bateria não pode ser tocado num piano e, no entanto, não deixa de ser música.)
Prova:
Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Apresente um item que seja uma instância do termo, mas não satisfaça essas condições.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 182
Falta de clareza
Definição:
A definição é tão ou mais difícil de compreender do que o termo a definir.
Exemplos:
(i) Uma pessoa é dissoluta se e somente se for lasciva. (Pretende-se definir o termo “dissoluta”. Mas o significado do termo “dissoluta” é tão obscuro como o do termo “lasciva”. Assim, a definição falha o seu objetivo de clarificação.)
(ii) Um objeto é belo se e somente se for esteticamente bem sucedido. (O termo “esteticamente bem sucedido” é mais difícil de compreender do que o termo “belo”.)
Prova:
Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Mostre que as condições não estão mais claramente definidas do que o termo a definir.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 184
Circularidade
Definição:
A definição inclui o termo definido como parte da definição.
(Uma definição circular é um caso especial da Falta de clareza)
Exemplos:
(i) Um animal é humano se e só se tem pais humanos. (Pretende-se definir “humano”. Mas para encontrarmos um ser humano temos de encontrar pais humanos. Para encontrarmos pais humanos temos já de saber o que é um ser humano.)
(ii) Um livro é pornográfico se e somente se contiver pornografia. (Teríamos já de saber o que é a pornografia para dizermos se um livro é ou não pornográfico.)
Prova:
Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Mostre que pelo menos um termo usado nas condições é o mesmo que o termo que está a ser definido.
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 184
Contradição
Definição:
A definição é contraditória.
Exemplos:
(i) Uma sociedade é livre se e somente se a liberdade for maximizada e as pessoas forem legalmente obrigadas a tomar a responsabilidade das suas ações. (As definições deste tipo são muito comuns, especialmente na internet. Mas, se uma pessoa é legalmente obrigada a fazer alguma coisa, já não podemos dizer que a liberdade está maximizada.)
(ii) As pessoas podem candidatar-se à licença de condução se: (a) não tiverem experiência anterior de condução (b) tiverem acesso a um veículo e (c) tiverem experiência de operação com veículos motorizados. (Uma pessoa não pode ter operado com veículos motorizados se não tiver experiência prévia de condução.)
Prova:
Identifique as condições da definição. Mostre que nem todas podem ser, ao mesmo tempo, verdadeiras. (Em particular, assuma que uma das condições é verdadeira e, depois, mostre que uma das outras condições deve ser falsa).
Referências:
Cedarblom e Paulsen: 186
Proposição
Definição:
Uma proposição é a afirmação de que algo é verdadeiro. Usamos frases para exprimir proposições.
Exemplos:
(i) As seguintes frases exprimem a mesma proposição:
Está chovendo.
Esta llooviendo.
It is raining.
Il pleut.
(ii) As seguintes frases exprimem a mesma proposição:
João ama Maria.
Maria é amada pelo João.
Discussão:
Faz sentido pensar numa proposição como sendo o significado de uma frase. O significado de uma frase tem vários componentes:
denotação: o estado de coisas que a frase afirma ser o caso.
conotação: os sentimentos, ideias ou emoções provocadas pela frase no auditor.
ênfase: a importância relativa que o autor atribui aos diferentes elementos da frase.
Por exemplo, na frase “O fogo enfurecia-se morro abaixo” a denotação da frase é afirmação de que um incêndio ocorre no morro e que ele alastra-se morro abaixo. A conotação é a de que isso deve ser temido (a palavra “enfurecia-se” implica fúria e perigo). A ênfase desta frase está no próprio fogo. Se tivéssemos escrito “Morro abaixo se enfurecia o fogo” a ênfase estaria no morro.
Os filósofos discutem bastante sobre o significado. Alguns dizem que o significado é apenas a denotação. Outros dizem que é a combinação apenas da denotação e da conotação. Outros ainda (incluindo Stephen Downes) dizem que o significado é a combinação dos três — denotação, conotação e ênfase.
Referências
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Valor da verdade
Uma proposição pode ter um dos seguintes valores de verdade:
Verdadeiro
Falso
Os filósofos discutem muito sobre o que constitui a verdade. Por agora podemos usar uma caracterização muito simples:
“P” é verdadeiro se e somente se P.
“P” é falso se e somente se não P.
Por exemplo:
A proposição “A neve é branca” é verdadeira se e somente se a neve for branca.
A proposição “A neve é branca” é falsa se e somente se a neve não for branca.
Por outras palavras, uma proposição é verdadeira se ela descreve corretamente um estado do mundo e será falsa se descrever incorretamente um estado do mundo. Isto é conhecido como A Teoria da Verdade de Tarski.
Tabela da verdade
Uma tabela da verdade mostra o valor da verdade da proposição complexa que resultou da aplicação de um operador lógico a duas proposições mais simples, formando uma nova proposição mais complexa.
Suponhamos que as duas proposições conectadas eram P e Q. Cada uma destas proposições tem dois valores da verdadepossíveis: verdadeiro ou falso. Isto dá-nos quatro possíveis combinações que estão representadas na tabela que se segue:
P
Q

V
V

V
F

F
V

F
F

Na coluna da direita acrescentaremos a proposição complexa formada pela ligação de P e Q. Por baixo escreveremos o valor de verdade que ela adquire em cada um dos casos possíveis. Vejamos, por exemplo, a tabela da verdade da proposição complexa P e Q:
P
Q
P e Q
V
V
V
V
F
F
F
V
F
F
F
F
Note-se que a proposição complexa pode ser verdadeira ou falsa em função dos diferentes valores da verdade de P e Q e dooperador usado. Então, se sabemos quais são os valores da verdade de P e Q, sabemos quais é o valor da verdade de P e Q.
Operadores lógicos
Os operadores lógicos aplicam-se a uma ou duas proposições para formar novas proposições. (Se ainda não leu nada sobre proposições deve fazê-lo agora)
valor da verdade da nova proposição é determinado: pelos valores de verdade das proposições ligadas e pelo operador aplicado.
Alguns dos operadores lógicos mais usados:
Disjunção
Quaisquer duas proposiçõesP e Q, podem conectar-se como alternativas mútuas, produzindo uma nova proposição (complexa):
P ou Q
A proposição “P ou Q” será verdadeira se pelo menos uma das alternativas, P ou Q, for verdadeira. Será falsa se ambos P e Qforem falsos.
tabela da verdade de P ou Q é a seguinte:
P
Q
P ou Q
V
V
V
V
F
V
F
V
V
F
F
F
Se você possui Javascript, tente por si mesmo:
Selecione os valores da verdade para as proposições P e Q clicando nos botões ao lado de “P” e “Q” respectivamente. Qual é o valor da verdade de P ou Q? Descubra clicando no botão “Computar”.
Parte superior do formulário
P é:
 V
 F  
Q é:
 V
 F
Portanto, P ou Q é:

Parte inferior do formulário
Negação
Qualquer proposição P pode ser negada mediante o operador negação, gerando uma nova proposição complexa:
Não-P
A proposição Não P será verdadeira apenas se P for falsa. Será falsa apenas se P for verdadeira. A tabela da verdade de Não Pé a seguinte:
P
Q
Não P
V
V
F
V
F
F
F
V
V
F
F
V
Se você possui Javascript, tente por si mesmo:
Selecione os valores da verdade para as proposições P e Q clicando nos botões ao lado de “P” e “Q” respectivamente. Qual é o valor da verdade de Não P? Descubra clicando no botão “Computar”.
Parte superior do formulário
P é:
 V
 F  
Q é:
 V
 F
Portanto, Não P é:

Parte inferior do formulário
Perceba que não importa se Q é verdadeiro ou falso. Não P é sempre verdadeiro se P é falso, e falso se P é verdadeiro.
Condicional
Quaisquer duas proposiçõesP e Q, podem ser conectadas pelo condicional, gerando a nova proposição complexa:
Se P, então Q
A proposição Se P, então Q é verdadeira se e somente se P for falsa ou Q for verdadeira. Só é falsa quando P é verdadeira e Qfalsa.
tabela da verdade de Se P, então Q é a seguinte:
P
Q
Se P, então Q
V
V
V
V
F
F
F
V
V
F
F
V
Se você possui Javascript, tente por si mesmo:
Selecione os valores da verdade para as proposições P e Q clicando nos botões ao lado de “P” e “Q” respectivamente. Qual é o valor da verdade de Se P, então Q? Descubra clicando no botão “Computar”.
Parte superior do formulário
P é:
 V
 F  
Q é:
 V
 F
Portanto, Se P então Q é:

Parte inferior do formulário
Uma condicional especial ocorre se trocamos o P e o Q de lugar: temos se Q, então P, que é o mesmo que dizer P apenas se Q.
Qual é o valor da verdade de P apenas se Q? Descubra clicando no botão “Computar”.
Parte superior do formulário
P é:
 V
 F  
Q é:
 V
 F
Portanto, P apena se Q é:

Parte inferior do formulário
Perceba que P apenas se Q é falso apenas quando Q é verdadeiro e P é falso.
Conjunção
Quaisquer duas proposiçõesP e Q, podem ser conectadas gerando uma proposição nova e complexa:
P e Q
A proposição P e Q será verdadeira se e somente se P e Q forem verdadeiras. Com qualquer outra combinação de valores de verdade será falsa.
tabela da verdade de P e Q é a seguinte:
P
Q
P e Q
V
V
V
V
F
F
F
V
F
F
F
F
Se você possui Javascript, tente por si mesmo:
Selecione os valores da verdade para as proposições P e Q clicando nos botões ao lado de “P” e “Q” respectivamente. Qual é o valor da verdade de P e Q? Descubra clicando no botão “Computar”.
Parte superior do formulário
P é:
 V
 F  
Q é:
 V
 F
Portanto, P e Q é:

Parte inferior do formulário
Bicondicional
Quaisquer duas proposições P e Q podem ser ligadas com o bicondicional, gerando uma nova proposição complexa:
P se e somente se Q
A proposição P se e somente se Q é verdadeira se e somente se P e Q tiverem o mesmo valor da verdade — se ambas P eQ forem verdadeiras ou ambas falsas. A tabela da verdade de P se e somente se Q é a seguinte:
P
Q
P se e somente se Q
V
V
V
V
F
F
F
V
F
F
F
V
Se você possui Javascript, tente por si mesmo:
Selecione os valores da verdade para as proposições P e Q clicando nos botões ao lado de “P” e “Q” respectivamente. Qual é o valor da verdade de P se e apenas se Q? Descubra clicando no botão “Computar”.
Parte superior do formulário
P é:
 V
 F  
Q é:
 V
 F
Portanto, P se e apenas se Q é:

Parte inferior do formulário
O bicondicional é um operador complexo, feito de operadores mais simples. Pense nele desta forma:
P se e apenas se Q é o mesmo que:
( Se P então Q ) e ( P apenas se Q ). Isso é o mesmo que dizer:
( Se P então Q ) e ( Se Q então P ).
O operador se e apenas se tem um papel especial nas Definições. Quando dizemos P se e somente se Q, estamos dizendo que P diz a mesma coisa que Q.
Referências
A lista que se segue recenseia os melhores textos em lógica e em raciocínio crítico. Apesar de não ser um guia completo (poderá haver tal coisa?), deverá ser um bom ponto de partida. Restringi a a selecção a livros publicados neste século.
Barker, Stephen F. The Elements of Logic. 5.ª ed. McGraw-Hill, 1989.
Boolos, George., and Jeffrey, Richard. Computability and Logic. 2.ª ed. Cambridge University Press, 1980.
Bergmann, Merrie, James Moor, and Jack Nelson. The LogicBook. 2.ª ed. McGraw-Hill, 1990.
Cohen, Morris, and Nagel, Ernest. An Introduction to Logic.Harcourt, Brace and World, 1932, 1962.
Copi, Irving M. and Cohen, Carl. Introduction to Logic. 8.ª ed. Macmillan, 1990.
Gianelli, A.P. Meaningful Logic. Bruce Publishing Company, 1962.
Haack, Susan. Philosophy of Logics. Cambridge University Press, 1978.
Huff, Darrell. How to Lie With Statistics. W.W. Norton, 1954.
Hughes, G.H., and Cresswell, M.J. An Introduction to Modal Logic. Methuen and Co. Ltd., 1968.
Jason, Gary. Introduction to Logic. Jones and Bartlett,1994.
Jager, Ronald. Essays in Logic From Aristotle to Russell. Prentice-Hall, 1963.
Jeffrey, Richard. Formal Logic: Its Scope and Limits.McGraw-Hill, 1981, 1967.
Johnson, R.H., and Blair, J.A. Logical Self-Defense. McGraw-Hill Ryerson, 1983, 1977.
Kahane, Howard. Logic and Philosophy: A Modern Introduction. Wadsworth, 1990.
Kelly, David. The Art of Reasoning. W.W. Norton, 1988.
Pospesel, Howard. Introduction to Logic: Propositional Logic. 2.ª ed. Prentice-Hall, 1984.
Purtill, Richard L. Logic for Philosophers. Harperand Row, 1971.
Putnam, Hilary. Philosophy of Logic. Harper, 1971.
Quine, Willard Van Orman. Methods of Logic. 4.ª ed. Harvard University Press, 1950, 1959.
Rescher, Nicholas. Introduction to Logic. St. Martin’s Press, 1964.
Salmon, Merrilee. Introduction to Logic and Critical Thinking. Harcourt Brace Jovanovich, 1984.
Salmon, Wesley. Logic. Third Edition. Prentice-Hall, 1983.
Schagrin, Morton L. The Language of Logic: A Programmed Text. Random House, 1968.
Sellars, Roy Wood. The Essentials of Logic. Edição Revista. The Riverside Press, 1925.
Skyrms, Brian. Choice and Chance: An Introduction to Inductive Logic. Dickenson, 1966.
Stephens, William N. Hypotheses and Evidence.Thomas Y. Crowell, 1968.
Thomason, Richmond. Symbolic Logic: An Introduction. Collier-Macmillan, 1970.
Weston, Anthony. A Rulebook for Arguments.Hackett, 1987. (Tradução portuguesa: A Arte de Argumentar, Gradiva, 1996)
Yanal, Robert J. Basic Logic.West Publishing Company, 1988.
Direitos autorais
O Guia das Falácias deve ser referenciado da seguinte maneira:
Stephen Downes. Guia das Falácias Lógicas do Stephen, Brandon, Manitoba, Canada, 1995-1998. Endereço:http://www.assiniboinec.mb.ca/user/downes/fallacy.
O copyright da versão original é de Stephen Downes.
O Guia das Falácias Lógicas do Stephen (daqui em diante citado como “o Guia”) é copyright de Stephen Downes, Brandon, Manitoba, Canada.
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original: Stephen's Guide to the Logical Fallacies