domingo, 24 de fevereiro de 2013

A RELIGIÃO FAZ MAL AO MUNDO
















Dependendo do ângulo em que é observado, o filósofo americano Sam Harris, de 40 anos, exibe uma des-concertante semelhança física com o ator Ben Stiller, mas seu trabalho nunca está para comédias. Junto com o biólogo inglês Richard Dawkins, autor de Deus, um Delírio, Sam Harris é um dos mais ativos militantes contra as religiões. 

Em 2005, nos Estados Unidos, ele lançou O Fim da Fé e ficou mais de trinta semanas na lista dos mais vendidos do jornal The New York Times. Neste ano, produziu um novo best-seller com críticas à religião. Com 91 páginas, Carta a uma Nação Cristã, já lançado no Brasil pela Companhia das Letras, é um compêndio em defesa do ateísmo. 

É redigido com uma linguagem tão cortante e argumentos tão implacáveis que, por vezes, roça o panfletário, mas dá seu recado com clareza absoluta. O filósofo bate em cada um dos pilares da fé e conclui: "A religião agrava e exacerba os conflitos humanos muito mais do que o tribalismo, o racismo ou a política". Ele deu a seguinte entrevista:

O movimento dos ateus é forte nos Estados Unidos e na Inglaterra, principalmente. É uma decorrência dos atentados de 11 de setembro de 2001?

                Vejo dois motivos simultâneos para essa confluência geográfica: os atentados de 11 de setembro e a escancarada religiosidade do governo de George W. Bush. A conjunção desses dois fatores levou muitas pessoas a se preocupar com o fato de que a fé está agora dos dois lados do balcão. Esse é um jogo altamente perigoso.

Por quê?

               A fé é, intrinsecamente, um elemento que, em vez de unir, divide. A única coisa que leva os seres humanos a cooperar uns com os outros de modo desprendido é nossa prontidão para termos nossas crenças e comportamentos modificados pela via do diálogo. A fé interdita o diálogo, faz com que as crenças de uma pessoa se tornem impermeáveis a novos argumentos, novas evidências. A fé até pode ser benigna no nível pessoal. Mas, no plano coletivo, quando se trata de governos capazes de fazer guerras ou desenvolver políticas públicas, a fé é um desastre absoluto.

O senhor acha que o mundo seria melhor sem religião, sem fé, sem crença em Deus?
 
Seria melhor se não houvesse mentiras. A religião é construída, e num grau notável, sobre mentiras. Não me refiro aos espetáculos de hipocrisia, como quando um pastor evangélico é flagrado com um garoto de programa ou metanfetamina, ou ambos. Refiro-me à falência sistemática da maioria dos crentes em admitir que as alegações básicas para sua fé são profundamente suspeitas. É mamãe dizendo que vovó morreu e foi para o céu, mas mamãe não sabe. A verdade é que mamãe está mentindo, para si própria e para seus filhos, e a maioria de nós encara tal comportamento como se fosse perfeitamente normal. Em vez de ensinarmos as crianças a lidar com o sofrimento e ser felizes apesar da realidade da morte, optamos por alimentar seu poder de se iludir e se enganar.


É possível conciliar ciência e religião?

A diferença entre ciência e religião é a diferença entre ter bons ou maus motivos para acreditar nas hipóteses sobre o mundo. Se houvesse boas razões para crer que Jesus nasceu de uma virgem ou que voltará à Terra, tais proposições fariam parte de nossa visão racional e científica do mundo. Mas, como não há boas razões para acreditar nisso, quem o faz está em franco conflito com a ciência. É claro que as pessoas sempre acham um modo de mentir para elas mesmas e para os outros. A estratégia, nesse caso, é dizer que tal crença decorre da fé. Com freqüência, ouvimos dizer que não há conflito entre razão e fé. É o mesmo que dizer que não há conflito entre fingir saber e realmente saber. Ou que não há conflito entre auto-engano e honestidade intelectual.


Haverá o dia em que a humanidade deixará de ter fé ou a fé faz parte da natureza humana?

O desejo de compreender o que se passa no mundo é inato, assim como o desejo de ser feliz, de estar cercado por pessoas que amamos ou o desejo de ser mais feliz, mais carinhoso, mais ético no futuro. Mas nada disso nos obriga a mentir para nós mesmos, ou para nossos filhos, a respeito da natureza do universo. É claro que nossa compreensão do universo é incompleta e desconhecemos a extensão exata de nossa ignorância. Não temos como antecipar as maravilhosas descobertas que serão feitas. O que sabemos com absoluta certeza, aqui e agora, é que nem a Bíblia nem o Corão trazem nossa melhor compreensão do universo.


Mas nem a Bíblia nem o Corão se pretendem um manual científico para entender o mundo?
 
Esses livros não são sequer um guia sobre moralidade que possamos considerar minimamente adequado, e falo de moralidade porque é um campo em que ambos se consideram exemplares. A Bíblia e o Corão, por exemplo, aceitam a escravidão. Qualquer um que os considere guias morais deve ser a favor da escravidão. Não há uma única linha no Novo Testamento que denuncie a iniqüidade da escravidão. São Paulo até aconselha aos escravos que sirvam bem aos seus senhores e sirvam especialmente bem aos seus senhores cristãos. É desnecessário dizer que a Bíblia e o Corão, além de não servir como guias em termos de moralidade, também não são autoridade em física, astronomia ou economia.

Que tipo de impacto seu livro pode ter sobre os leitores religiosos?
 
Eu ficaria feliz se o livro levasse os leitores a se perguntar por que, em pleno século XXI, ainda aplaudimos pessoas que fingem saber o que elas manifestamente não sabem nem podem saber. Não há uma única pessoa viva que saiba se Jesus era filho de Deus ou se nasceu de uma virgem. Na verdade, não há uma pessoa viva que saiba se o Jesus histórico tinha barba. No entanto, em muitos países é uma necessidade política simular que sabemos coisas sobre Deus, sobre Jesus, sobre a origem divina da Bíblia. Imagino que qualquer pessoa religiosa que leia Carta a uma Nação Cristã com a cabeça aberta descobrirá que os argumentos usados contra a fé religiosa são absolutamente irrespondíveis. Isso deve ter algum efeito sobre o modo de ver o mundo dos leitores. Eles certamente vão perceber que ser um cristão devotado faz tanto sentido quanto ser um muçulmano devotado, que, por sua vez, é tão lógico quanto ser um adorador de Poseidon, o deus do mar na Grécia antiga. É hora de falarmos sobre a felicidade humana e nossa disponibilidade para experiências espirituais na linguagem da ciência do século XXI, deixando a mitologia para trás.

O Brasil é um país aparentemente tolerante com as diferentes religiões e conhecido pelo sincretismo religioso. Num país assim, é mais fácil ou mais difícil para o ateísmo crescer?
 
Em certo sentido, deve ser mais fácil. O convívio intenso de crenças inconciliáveis deve levar as pessoas a compreender que tais crenças são produtos de acidentes históricos, são contingenciais, são criadas pelo homem e, portanto, não são o que pregam ser. Judeus e cristãos não podem estar ambos certos porque o núcleo de suas crenças é contraditório. Na verdade, eles estão equivocados sobre muitas coisas, exatamente como estavam antes os adoradores dos deuses egípcios ou gregos. Ou os adoradores de milhares de deuses que morreram durante a longa e escura noite da superstição e da ignorância humana. Em qualquer lugar que os seres humanos façam um esforço honesto para chegar à verdade, nosso discurso transcende o sectarismo religioso. Não há física cristã, álgebra muçulmana. No futuro, não haverá nada como espiritualidade muçulmana ou ética cristã. Se há verdades espirituais ou éticas a ser descobertas, e tenho certeza de que há, elas vão transcender os acidentes culturais e as localizações geográficas. Falando honestamente, esse é o único fundamento sobre o qual podemos erguer uma civilização verdadeiramente global.
 

sábado, 23 de fevereiro de 2013

A CIÊNCIA É UMA RELIGIÃO?











Tradução: Eliana Curado
 




Está na moda ter uma raiva apocalíptica da ameaça que representa à humanidade o vírus da AIDS, o mal da “vaca louca” e muitos outros, mas penso que devemos nos preocupar com a fé, um dos grandes males do mundo, comparável ao vírus da varíola, mas mais difícil de ser erradicado.

A fé, sendo uma crença não baseada em provas, é o vício principal de qualquer religião. Quem, ao olhar a Irlanda do Norte ou o Oriente Médio, pode dizer enfaticamente que o vírus cerebral da fé não seja extremamente perigoso? Uma das estórias contadas aos jovens muçulmanos que são homens-bomba suicidas é que o martírio é a maneira mais rápida de se chegar ao paraíso – e não apenas ao paraíso, mas a um lugar especial, onde serão recompensados com o prêmio de 72 noivas virgens. Ocorre-me que nossa melhor esperança pode estar associada a uma espécie de “controle de armas espirituais”: enviar teólogos especialmente treinados para diminuir progressivamente esse número de virgens.

Levando-se em conta o perigo representado pela fé, e considerando as realizações da razão e da observação na atividade chamada ciência, é irônico que, em minhas palestras públicas, sempre haja alguém que diga: “É evidente que sua ciência é apenas uma religião como a nossa. No fundo, a ciência não passa de fé”.

Bem, ciência não é religião e não toca a fé porque, apesar de ter muitas das virtudes da religião, não possui nenhum de seus vícios. A ciência se baseia em evidências verificáveis. A fé religiosa não somente falha em provas, mas também apregoa com orgulho e alegria sua independência de provas. Que outra razão os cristãos teriam para fazer essa crítica raivosa à dúvida de Tomé? Os outros apóstolos são exemplos de virtude para nós porque a fé lhes era suficiente. O cético Tomé, por outro lado, exigia a evidência. Talvez ele devesse ser considerado o santo patrono dos cientistas.

Uma razão pela qual eu sou confrontado com a idéia de que a ciência é no fundo uma religião é porque eu acredito de fato na evolução, e acredito com uma convicção apaixonada. Para alguns, isto pode parecer superficialmente com a fé, mas a evidência que me faz acreditar na evolução não somente é poderosamente forte, como também encontra-se à disposição de qualquer um que queira se debruçar sobre o tema para estudá-lo. Qualquer pessoa pode estudar as mesmas provas que eu e, presumivelmente, chegar à mesma conclusão. Mas, se você tem uma crença que se baseia somente na fé, eu não posso examinar suas razões. Você pode se esconder atrás de seu muro particular de fé, onde não posso alcançá-lo.

É claro que, na prática, os cientistas individuais às vezes recaem no vício da fé, e uns poucos talvez acreditem de modo tão simplório em sua teoria favorita que ocasionalmente cheguem a falsificar uma prova. Todavia, o fato de que isto às vezes aconteça não altera o princípio de que o fazem com vergonha, e não com orgulho. O método da ciência é tão bem arquitetado que geralmente traz à tona mais cedo ou mais tarde qualquer tentativa de falsificação da evidência.

A ciência é na verdade uma das disciplinas mais morais e honestas que existem, porque entraria em colapso inteiramente se não fosse por uma escrupulosa aderência à honestidade na apresentação da evidência. Como James Randi apontou, esta é a razão porque os cientistas são tão freqüentemente enganados por paranormais cheios de truques e porque o papel de desmascarar é melhor representado pelos prestidigitadores profissionais. Os cientistas simplesmente não antecipam a desonestidade deliberada. Há outras profissões (não é preciso mencionar os advogados especificamente) em que a falsificação das provas, ou pelo menos a sua adulteração, é precisamente o que as pessoas são pagas para fazer e que os torna melhores na profissão.

A ciência está livre do principal vício da religião, que é a fé. Mas, como assinalei, ela possui algumas das virtudes da Religião. A Religião pode desejar conferir a seus seguidores diversos benefícios, entre eles a explicação, a consolação e o encantamento. A ciência pode oferecer o mesmo.

Os seres humanos têm um grande apetite por explicações. Esta pode ser uma das principais razões porque a religião se difundiu tão universalmente, uma vez que pretende dar explicações. Nós somos dotados de uma consciência individual em um universo misterioso e desejamos entendê-lo. A maior parte dos religiosos oferece uma cosmologia, uma biologia, uma teoria da vida e uma teoria das origens, além de significados para a existência.

Assim fazendo, eles demonstram que a religião é, em certo sentido, ciência; mas não passa de má ciência. O argumento não considera que religião e ciência operam em dimensões separadas e dizem respeito a tipos de perguntas bastante distintos. Historicamente, as Religiões sempre tentaram responder a perguntas que pertencem propriamente à ciência, mas não deveriam ter permissão para se retirarem do terreno em que elas tradicionalmente têm tentado brigar. Elas oferecem tanto uma cosmologia quanto uma biologia; todavia, ambas são falsas.

O consolo é mais difícil para a ciência oferecer. Diferentemente da religião, a ciência não pode oferecer ao carente um encontro memorável com seus amados numa vida futura. Aqueles que foram maltratados nesta vida não podem, de um ponto de vista científico, antecipar uma doce vingança para seus atormentadores em uma vida após a morte. Poder-se-ia argumentar que, se a idéia de uma vida posterior é uma ilusão (como acredito que seja), a consolação que oferece é vazia.

 Mas não é necessariamente assim; uma falsa crença pode ser tão reconfortante quanto uma verdadeira, desde que o crente jamais descubra sua falsidade. Mas se o consolo for tão barato assim, a ciência é capaz de oferecer, em contrapartida, outros paliativos baratos, tais como analgésicos, cujo conforto pode ou não ser ilusório, mas que funciona bem.

O encantamento, todavia, é o terreno em que a ciência realmente sente-se à vontade. Todos os grandes religiosos abrigam o temor, a empolgação diante da maravilha e beleza da criação. É exatamente esta sensação de estremecimento, de temor reverente – de quase adoração -, este sentimento de admiração arrebatadora, o que a ciência moderna pode oferecer. E isto vai muito além dos sonhos mais selvagens dos santos e místicos. O fato de que o sobrenatural não tenha lugar em nossas explicações, em nossa compreensão do universo e da vida, não diminui o temor. Na verdade, acontece o contrário. O mero vislumbre através de um microscópio do cérebro de uma formiga, ou através de um telescópio, de uma galáxia remota de um bilhão de mundos, é o suficiente para substituir os salmos de louvor tolos e paroquiais.

Agora, quando me dizem que a ciência ou alguma parte específica dela, como a teoria da evolução, é apenas uma religião como qualquer outra, eu geralmente nego isto com indignação. Mas começo a me perguntar se talvez esta não seja uma tática errada. Talvez a tática certa seja aceitar o desafio com gratidão e exigir que as aulas de ciência tenham a mesma duração que as aulas de educação religiosa. Quanto mais eu penso nisso, mais eu percebo que deveríamos investir seriamente nesta idéia. Quero, então, falar um pouco sobre a educação religiosa e o lugar que a ciência poderia ocupar nela.

Eu lamento profundamente o modo como as crianças são educadas. Não estou familiarizado inteiramente com o modo como as coisas acontecem nos Estados Unidos, assim o que digo pode ter mais relevância no Reino Unido, onde há instrução religiosa para todas as crianças como imposição do Estado e obrigação legal. Isto é inconstitucional nos Estados Unidos, mas presumo que as crianças recebam de qualquer forma uma instrução religiosa na religião particular que seus pais julguem apropriada.

Isto me leva à observação sobre o abuso mental de crianças. Em uma edição de 1995 do Independent, um dos principais jornais londrinos, havia uma fotografia de uma cena relativamente doce e tocante. Era a época de Natal, e a foto mostrava três crianças vestidas como três homens sábios, encenando uma peça sobre a natividade. A estória associada à foto representava uma criança Muçulmana, outra Hindu e outra, Cristã. O ponto supostamente doce e tocante da estória é que todas elas participavam da peça sobre a Natividade.

O que não é doce e nem tocante é que estas crianças tinham todas quatro anos de idade. Como se pode dizer que uma criança de quatro anos seja Muçulmana, ou Cristã, ou Hindu, ou Judia? É possível falar de um economista de quatro anos de idade? O que você diria sobre um neo-isolacionista de quatro anos, ou um liberal Republicano de quatro anos? Há opiniões sobre o cosmos e o mundo que as crianças, uma vez crescidas, presumivelmente estarão em condição de avaliar por si mesmas. A Religião é um domínio em nossa cultura em que aceita-se prontamente, sem questionamento – sem nem mesmo se aperceber do quanto isto é bizarro – que pais tenham uma palavra total e absoluta sobre o que seus filhos serão, como seus filhos vão ser formados, que opiniões seus filhos terão sobre o cosmos, sobre a vida, sobre a existência. Você compreende o que quero dizer quando me refiro a abuso mental de crianças?

Considerando agora o que se espera que a educação religiosa seja capaz de oferecer, um de seus objetivos poderia ser encorajar as crianças a refletir sobre as questões profundas da existência, convidá-las a se colocar acima das preocupações tolas da vida cotidiana e pensar sub specie aeternitatis.

A ciência é capaz de fornecer uma visão da vida e do universo que, como já observei, com inspiração poética humilde, supera em muito quaisquer crenças mutuamente contraditórias e as tradições recentes e lamentáveis das religiões do mundo.

Por exemplo, como poderiam as crianças, nas aulas de educação religiosa, deixar de se sentir inspiradas, se pudéssemos fazê-las perceber um átimo da idade do universo? Vamos supor que, no momento da morte de Cristo, a notícia de sua morte tivesse começado a viajar pelo universo na velocidade máxima possível, distanciando-se da terra. Até onde essa notícia terrível poderia ter chegado, até agora? Segundo a teoria da relatividade especial, a notícia não poderia, sob quaisquer circunstâncias, ter alcançado mais que uma qüinquagésima parte do percurso de uma única galáxia – sequer a milésima parte do percurso até a galáxia vizinha da nossa, em um universo com 100 milhões de galáxias. O universo de modo geral não poderia ser outra coisa senão indiferente a Cristo, a seu nascimento, à sua paixão e à sua morte. Mesmo momentos muito importantes, como a origem da vida na Terra, poderiam ter viajado somente através de nosso pequeno feixe de galáxias. Mas esse evento é tão remoto em nossa escala de tempo terrena que, se você medisse esse tempo com seus braços abertos, a totalidade da história humana, a totalidade da cultura humana, representariam a poeira da ponta de seus dedos em um único movimento de uma lixa de unha.

É desnecessário dizer que o argumento do arquiteto do universo, parte importante da história da religião, não seria ignorado em minhas aulas de educação religiosa. As crianças olhariam para as maravilhas eloqüentes dos reinos vivos, avaliariam o Darwinismo em contraposição com as alternativas criacionistas e tirariam suas próprias conclusões. Eu penso que as crianças não teriam dificuldade em raciocinar de modo correto se lhes fossem apresentadas provas. O que me preocupa não é a questão do tempo igual para o ensino de ciência e religião, mas que, até onde posso perceber, as crianças do Reino Unido e dos Estados Unidos não tenham basicamente nenhum tempo para o estudo da teoria da evolução. Ao contrário, só lhes ensinam o criacionismo (quer seja na escola, na igreja ou em casa).

Seria interessante também ensinar mais que uma teoria da criação. A dominante nesta cultura é o mito da criação judeu, extraído do mito da criação babilônico. Há, claro, vários outros, e talvez devêssemos conceder a todos eles o mesmo tempo (exceto pelo fato de que não sobraria tempo para estudar nada mais). Sei que há Hindus que acreditam que o mundo foi criado em uma desnatadeira cósmica e povos da Nigéria que acreditam que o mundo foi criado por Deus a partir do excremento de formigas. Certamente estas histórias têm tanto direito a tempo igual quanto o mito Judeu-Cristão de Adão e Eva.

Já falamos demais sobre o Gênesis; agora vamos nos mover para os profetas. O Cometa de Halley retornará sem falha no ano 2062. As profecias Bíblicas ou Délficas não aspiram a esta precisão; astrólogos e seguidores de Nostradamus não ousam se comprometer com prognósticos factuais. Melhor ainda, disfarçam sua charlatanice com uma cortina de fumaça de imprecisão. Quando os cometas apareceram no passado, foram frequentemente vistos como prenúncios de desastres. A Astrologia tem tido um papel importante em várias tradições religiosas, incluindo o Hinduísmo. Supostamente os três reis magos que eu mencionei anteriormente foram conduzidos à manjedoura de Jesus por uma estrela. Nós poderíamos perguntar às crianças por que rota física elas imaginariam que a suposta influência estelar nos assuntos humanos poderia viajar.

Houve um programa chocante na Rádio BBC, no período natalino de 1995, que apresentava uma astrônoma, um bispo e um jornalista designados para refazer os passos dos três reis magos. Pode-se entender a participação do bispo e do jornalista (um escritor religioso), mas a cientista era uma supostamente respeitável escritora de astronomia, e mesmo assim ela seguiu adiante com isso! Durante todo o caminho ela falou sobre os portentos de Saturno e Júpiter em posição ascendente em relação a Urano, ou o que quer que fosse. Ela na verdade não acredita em astrologia, mas um dos problemas é que nossa cultura aprendeu a se tornar tolerante em relação à Astrologia, quando não vagamente entretida por ela – e tanto é assim que mesmo pessoas do meio científico que não acreditam em astrologia de certa forma pensam que seja uma diversão anódina. Eu trato a astrologia muito seriamente: penso que é profundamente perniciosa porque solapa a racionalidade, e gostaria de ver campanhas contra ela.

Quando as aulas de educação religiosa se ocupam da ética, não penso que a ciência tenha muito a dizer, e eu a substituiria pela filosofia moral racional. As crianças pensam que há padrões absolutos de certo e errado? E se pensam assim, de onde eles vêm? Você pode criar princípios de certo e errado que funcionem bem, como “faça com os outros o que gostaria que fizessem com você” e “o maior bem para o maior número” (o que quer que isso signifique)? É relevante perguntar como um evolucionista, qualquer que seja sua moralidade pessoal, de onde vem a moral, ou que caminhos levaram o cérebro humano a ter esse sentimento de certo e errado, essa tendência à ética e à moral?

Deveríamos valorizar a vida humana acima de todas as outras? Há uma parede sólida a ser construída em volta da espécie Homo sapiens, ou deveríamos considerar que há outras espécies que merecem nossas simpatias humanistas? Nós deveríamos, por exemplo, seguir o lobby do direito à vida, que está inteiramente voltado para a vida humana, e valorizar mais a vida de um feto humano, que tem as faculdades de um verme, que a de um chipanzé que pensa e sente? Qual é a base desta cerca que erguemos em volta do Homo sapiens – mesmo em volta de uma pequena peça de tecido fetal? (Não soa muito como uma idéia evolucionária, ao se pensar sobre ela.) Quando, na descendência evolucionária de nosso ancestral comum com os chimpanzés, a cerca de proteção foi erguida?

Bem, saindo então da moral para a escatologia, nós sabemos, pela segunda lei da termodinâmica, que toda complexidade, toda a vida, todo o riso, todo o sofrimento, inclinam-se para o frio nada no final. Eles – e nós – podem não ser mais que temporários; apostas locais do grande decline universal no abismo da uniformidade.
Nós sabemos que o universo está se expandindo e que provavelmente vai se expandir eternamente, embora seja possível que se contraia novamente. Nós sabemos que, o que quer que aconteça ao universo, o sol engolfará a terra em cerca de 60 milhões de séculos no futuro.

O tempo propriamente dito começou em um certo momento, e pode terminar em um certo momento – ou não. O tempo pode chegar ao fim localmente, em trituradores chamados buracos negros. As leis do universo parecem ser verdadeiras para todo o universo. Por que é assim? As leis poderiam ser outras nestes trituradores? Para ser um tanto especulativo, o tempo poderia começar novamente com novas leis da física, novas constantes físicas. Há hipóteses de que poderia haver muitos universos, cada um isolado tão completamente dos demais que, para o primeiro, os outros não existiriam. Neste caso, poderia haver uma seleção Darwinista entre os universos.

A ciência poderia dar uma boa explicação de si mesma na educação religiosa, mas isto não seria o bastante. Eu acredito que alguma familiaridade com a versão do Rei James da Bíblia é importante para quem deseja compreender as alusões que aparecem na Literatura Inglesa. Junto com o Book of Common Prayer, a Bíblia ganhou 58 páginas no Dicionário Oxford de Citações. Somente Shakespeare tem mais. Eu penso que não ter qualquer tipo de educação bíblica é uma escolha infeliz para as crianças que quiserem ler a Literatura Inglesa e entender a procedência de frases como “através de um vidro escuro”, “toda a carne é como a relva”, “esta corrida não é para o veloz”, “chorando no deserto”, “colhendo tempestade”, “entre o joio”, “Sem olhos em Gaza”, “Os que consolam Jô” e “a oferta singela da viúva”.

Quero ainda retornar à acusação de que a ciência é apenas uma fé. A versão mais extrema desta acusação – e que vejo com freqüência tanto em cientistas quanto em racionalistas – é a acusação de haver um fanatismo e uma intolerância tão grandes em cientistas e em religiosos. Às vezes pode haver um pouco de justiça nesta acusação, mas como fanáticos intolerantes nós cientistas somos meros amadores. Nós nos contentamos em discutir com aqueles que discordam de nossos pontos de vista. Nós não os matamos.

Mas eu negaria até mesmo a menor acusação de fanatismo puramente verbal. Há uma diferença muito, muito importante entre o sentimento forte, mesmo apaixonado, em relação a algo porque pensamos a respeito e examinamos as provas e, por outro lado, o sentimento forte em relação a algo que foi internamente revelado a nós, ou internamente revelado a outra pessoa na história e subseqüentemente reverenciado pela tradição. Há uma enorme diferença entre a crença que alguém está preparado para defender recorrendo à evidência e à lógica e uma crença que é apoiada por nada mais que a tradição, a autoridade ou a revelação.

Ciência se define pela aplicação rigorosa do método científico, pela formulação de hipóteses e teorias abertas à refutabilidade e falseabilidade, bem como pela publicação, circulação e intercâmbio da produção científica na comunidade de interpares.





sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

ALBERT EINSTEIN, POR RICHARD DAWKINS




Uma das declarações mais citadas pelos religiosos sobre Einstein é “Sem a religião, a ciência é capenga; sem a ciência a religião é cega”.


Mas Einstein também disse:


“É claro que era mentira o que você leu sobre minhas convicções religiosas, uma mentira que está sendo sistematicamente repetida. Não acredito num Deus pessoal e nunca neguei isso, e sim o manifestei claramente.


Se há algo em mim que possa ser chamado de religioso, é a admiração ilimitada pela estrutura do mundo, do modo como nossa ciência é capaz de revelar.”


Parece que Einstein se contradiz? Que suas palavras podem ser escolhidas a dedo para arranjar citações que sustentem os dois lados da discussão? Não.


Por “religião” Einstein quis dizer algo totalmente diferente do significado convencional.


Segue algumas outras citações de Einstein, para dar um gostinho da religião einsteiniana:


“Sou um descrente profundamente religioso. Isso é, de certa forma, um novo tipo de religião.”


“Jamais imputei à natureza um propósito ou um objetivo, nem nada que possa ser entendido como antropomórfico. O que vejo na natureza é uma estrutura magnífica que só compreendemos de modo muito imperfeito, e que não tem como não encher uma pessoa racional de um sentimento de humildade. É um sentimento genuinamente religioso, que não tem nada a ver com misticismo.”


“A idéia de um Deus pessoal me é bastante estranha, e me parece até ingênua.”



Em números cada vez maiores desde sua morte, apologistas da religião, de forma compreensível, tentam reclamar Einstein para o seu time. Alguns dos religiosos contemporâneos a ele o viram de maneira bem diferente.


Em 1940, Einstein escreveu um trabalho famoso justificando sua declaração “Eu não acredito num Deus pessoal”. Junto com outras semelhantes, essa declaração provocou uma enxurrada de cartas de religiosos ortodoxos, muitas delas aludindo à origem judaica de Einstein.


Os trechos que se seguem são tirados do livro “Einstein e a religião”, de Max Jammer.


O bispo católico de Kansas City disse: “É triste ver um homem que descende da raça do Velho Testamento e de seus ensinamentos negar a grande tradição dessa raça”.


Outro religioso católico opinou: “Não há nenhum outro Deus que não um Deus pessoal (...) Einstein não sabe do que está falando. Ele está totalmente errado. Alguns homens acham que só porque atingiram um alto nível de especialidade em determinada área são qualificados para manifestar suas opiniões em todas.”


Um advogado católico americano, em nome de uma coalizão ecumênica, escreveu para Einstein:


“Lamentamos profundamente que o senhor tenha feito a declaração (...) em que ridiculariza a idéia de um Deus pessoal. Nos últimos dez anos, nada foi tão bem calculado para fazer as pessoas acharem que Hitler tinha alguma razão ao expulsar os judeus da Alemanha quanto sua declaração. Admitindo seu direito à liberdade de expressão, digo ainda que sua declaração  o constitui em uma das maiores fontes de discórdia dos Estados Unidos”.


Um rabino de Nova York disse: “Einstein é sem dúvida um grande cientista, mas suas opiniões religiosas são diametralmente opostas ao judaísmo”


O presidente de uma sociedade de história em Nova Jersey escreveu uma carta que deixa tão incriminadoramente exposta a debilidade do pensamento religioso que vale a pela lê-la duas vezes.


Respeitamos sua sabedoria, dr. Einstein; mas existe uma coisa que o senhor não parece ter aprendido: que Deus é um espírito e não pode ser encontrado pelo telescópio ou pelo microscópio, assim como o pensamento ou a emoção humana não podem ser encontrados na análise do cérebro.


Como todo mundo sabe, a religião se baseia na Fé, não no conhecimento. Todas as pessoas que pensam talvez sejam assaltadas, às vezes, por dúvidas religiosas. Minha própria fé já vacilou muitas vezes. Mas nunca contei a ninguém sobre minhas aberrações espirituais, por dois motivos: 1) temi que pudesse, pela mera sugestão, perturbar e prejudicar a vida e as esperanças de alguém; 2) porque concordo com o escritor que disse: “Há algo de maligno em alguém que queira destruir a fé do outro”. (...) Espero, dr. Einstein, que a citação esteja errada e que o senhor ainda vá dizer alguma coisa mais agradável para o vasto número de americanos que têm o prazer de homenageá-lo.



Menos abjeta, mas mais chocante, foi a carta do fundador da Associação do Tebernáculo do Calvário, em Oklahoma:



Professor Einstein, acredito que todo cristão nos Estados Unidos vai lhe responder: “Não vamos abrir mão de nossa crença em nosso Deus e em seu filho Jesus Cristo, mas o convidamos, se o senhor não acredita no Deus do povo desta nação a voltar ao local de onde veio”. Fiz tudo o que podia para ser uma bênção para Israel, e vem o senhor com uma declaração de sua língua blasfema e faz mais para prejudicar a causa de seu povo que todos os esforços dos cristãos que amam Israel são capazes de fazer para acabar com o anti-semitismo em nossa terra.


Professor Einstein, todo cristão dos Estados Unidos vai imediatamente lhe responder: “Pegue sua teoria maluca e mentirosa da evolução e volte para a Alemanha, de onde veio, ou pare de tentar destroçar a fé de um povo que o recebeu de braços abertos quando o senhor foi obrigado a fugir de sua terra natal”


A única coisa que todos esses críticos teístas entenderam direitinho foi que Einstein não era um deles.


Deixe-me resumir a religião einsteiniana em mais uma citação do próprio Einstein:


Ter a sensação de que por trás de tudo pode ser vivido há alguma coisa que nossa mente não consegue captar, e cujas beleza e sublimidade só nos atingem indiretamente, na forma de um débil reflexo, isso é religiosidade. Nesse sentido sou religioso.


Deus não joga dados” deve ser traduzida como “A aleatoriedade não habita o cerne de todas as coisas”

Leitura sugerida
CARTA INÉDITA DE EINSTEIN


VÍDEO SUGERIDO
Um método simples de descomplicar a frase "A ciência sem religião é manca."





A explicação de Eustáquio para a frase "DEUS NÃO JOGA DADOS"



quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

CARTA INÉDITA, ALBERT EINSTEIN ATACA DEUS







DA ASSOCIATED PRESS
 

Uma carta inédita de Albert Einstein datada de 1954, ano anterior ao de sua morte, traz pela primeira vez críticas contundentes do físico à religião. No manuscrito dirigido a seu amigo filósofo Eric Gutkind, que será leiloada hoje em Londres, o autor das teorias da relatividade retrata as práticas religiosas como "infantis". 


"A palavra Deus é para mim nada mais do que expressão e produto da fraqueza humana", escreveu Einstein, para quem a Bíblia seria "uma coleção de lendas honoráveis, ainda que primitivas". 


O conteúdo da carta difere de declarações anteriores de Einstein, que, segundo historiadores, nunca havia deixado muito clara a sua visão sobre a religião. Nessa seara, o físico era mais lembrado pela frase "A ciência sem religião é manca, a religião sem a ciência é cega". 


Na carta a Gutkind, porém, Einstein classifica a crença em Deus como "produto da fraqueza humana", e não poupa nem a religião do povo ao qual pertencia. "A religião judaica, como todas as outras religiões, é uma encarnação das superstições mais infantis." Einstein, um sionista que teve papel importante na criação do Estado de Israel, diz a Gutkind que não acredita que os judeus sejam um povo "escolhido". 


A carta traz um certo tom de descrença na humanidade e a noção de que o poder corrompe as pessoas. Os judeus, diz, só estariam "protegidos dos piores cânceres por lhes faltar poder".

A casa de leilões Bloomsbury, onde o manuscrito original será vendido, diz estar "100% certa" da autenticidade do documento e que espera conseguir por ele um preço entre US$ 12 mil e US$ 16 mil. O vendedor é um colecionador particular. 


Historiadores não costumam retratar Einstein como ateu, mas a imagem pode mudar com a publicação da carta. Sua visão sobre Deus era tida apenas como não-clerical ("Não creio no Deus da teologia que recompensa o bem e pune o mal")





Fonte Folha de São Paulo




"Carta de Deus" de Einstein é leiloada por US$ 2,9 milhões

Manuscrito de 1954 revela sentimentos do cientista sobre o judaísmo, que ele chamou de "superstição primitiva", e Deus, definido como uma expressão da fraqueza humana.





Fonte


Assunto Correlato:
Albert Einstein, por Richard Dawkins

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A Bíblia







A Bíblia é o livro mais vendido de todos os tempos. É também um dos menos lidos. A imagem que se tem da Bíblia é de um livro santo, que prega o amor, a bondade, a humildade. Ledo engano. A Bíblia, principalmente o Antigo Testamento, tem passagens sangrentas e cruéis, de fazer inveja aos piores filmes de horror. 


Quando Moisés desceu do Monte Sinai com as tábuas da lei percebeu que seus seguidores faziam orgias e adoravam um bezerro de ouro (Êxodo, 32:27-8). 



Furioso, vociferou: “Ponde cada um de vós a espada a seu lado. Percorrei o acampamento e voltai, de portão a portão, e matai cada um o seu irmão, e cada um o seu próximo, e cada um o seu conhecido próximo. E os filhos de Levi passaram a fazer o que Moisés dissera, de modo que naquele dia caíram do povo cerca de três mil homens”.



Em Deuteronômio 20:10 e sgs., encontramos trechos horripilantes. Jeová, o Deus do Antigo Testamento, o mesmo que dissera “não matarás, aconselha aos hebreus que, ao encontrarem outro povo, façam proposta de paz. Se aceitarem a paz, deverão ser escravizados para fazer trabalho forçado. Se recusarem a proposta de paz, Jeová os entregará nas mãos dos hebreus, que deverão matar todos os homens com o fio da espada. Em seguida, deverão saquear todos os despojos, inclusive as mulheres, as criancinhas e os animais domésticos.


No mesmo livro, cap. 7, Jeová diz que seu povo escolhido deverá aniquilar sete povos que lhes serão oferecidos. “E tens que consumir todos os povos que Jeová, teu Deus, te dá. Teu olho não deve ter dó deles.


Jeová não brinca em serviço. Em II Crônicas 15:13, sentencia: “...todo aquele que não procurar por Jeová, o Deus de Israel, seja jovem ou velho, homem ou mulher, deverá ser morto. Em Êxodo 22:20, demonstra sua absoluta intolerância: “Quem oferecer sacrifícios a quaisquer deuses, e não somente a Jeová, deverá ser completamente destruído.


Em Deuteronômio 22:22-23: “Caso um homem seja encontrado deitado com uma mulher que não tenha dono, ambos têm que morrer juntos...” E continua: “...tendes que levá-los para fora do portão daquela cidade e tendes de matá-los a pedradas, e eles têm que morrer.


Em Deuteronômio 21:18, Jeová ordena que, se um homem tiver um filho obstinado e rebelde, ele e a mãe devem levá-lo para fora da cidade, chamar os anciãos e dizer-lhes que o filho deverá morrer. Todos os homens da cidade deverão atirar pedras nele até morrer. obra no sábado deverá ser morto. Sendo assim, toda a cristandade, com a possível exceção dos adventistas (que guardam o sábado), deveria ser exterminada da face da terra.


Olho por olho – a pena de talião – é a lei do Antigo Testamento. Não há lugar para perdão nem piedade. No entanto, Jesus, o mesmo Jesus que mandou dar a outra face, no Novo Testamento, também tem momentos de furor, como em Mateus 10:34: “Não penseis que vim estabelecer paz na terra; vim estabelecer, não a paz mas a espada. Pois vim causar divisão; o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe. Deveras, os inimigos do homem serão pessoas de sua própria família. Quem tiver maior afeição pelo pai ou pela mãe maior que por mim, não é digno de mim; e quem tiver maior afeição pelo filho ou pela filha que por mim não é digno de mim.


Quem duvidar, que confira!


terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

A ALMA, SEGUNDO A BÍBLIA






"A mulher tem alma? Indagavam os antigos, achando que não, porque na Bíblia, no Velho Testamento, livro dos Gêneses, capítulo 2, versículo 7, está escrito que Deus ao criar o homem do pó da terra, lhe soprou nas narinas o fôlego da vida, e o homem passou a ser alma vivente, mas depois ele fez a mulher de uma costela de Adão e não soprou absolutamente o fôlego da vida nas narinas de Eva, então ela não teria alma ou quando muito seria de natureza inferior a do homem."



 A palavra hebraica traduzida como “alma” é né·fesh, e ela ocorre 754 vezes nas Escrituras Hebraicas. O que significa né·fesh? Segundo The Dictionary of Bible and Religion (Dicionário de Bíblia e Religião), “usualmente refere-se ao inteiro ser vivo, ao indivíduo como um todo”. Isto é confirmado pela descrição bíblica da alma em Gênesis 2:7: “Jeová Deus passou a formar o homem do pó do solo e a soprar nas suas narinas o fôlego de vida, e o homem veio a ser uma alma vivente.” Note que o primeiro homem “veio a ser” uma alma. Quer dizer, Adão não tinha uma alma; ele era uma alma — assim como alguém que se torna médico é médico. Portanto, a palavra “alma” aqui descreve a pessoa como um todo.


 A palavra traduzida como “alma” (psy·khé) ocorre mais de cem vezes nas Escrituras Gregas Cristãs. Assim como né·fesh, esta palavra muitas vezes refere-se à pessoa como um todo. Por exemplo, considere as seguintes declarações: “Minha alma está aflita.” (João 12:27) “Sobre cada alma começou a cair temor.” (Atos 2:43) “Toda alma esteja sujeita às autoridades superiores.” (Romanos 13:1) “Falai consoladoramente às almas deprimidas.” (1 Tessalonicenses 5:14) “Poucas pessoas, isto é, oito almas, foram levadas a salvo através da água.” (1 Pedro 3:20) Psy·khé, assim como né·fesh, refere-se claramente à pessoa como um todo. Segundo o erudito Nigel Turner, esta palavra “significa aquilo que é caracteristicamente humano, o eu, o corpo material no qual se soprou o rûa [espírito] de Deus. . . . A ênfase é no eu como um todo”.
 
 É interessante que, na Bíblia, a palavra “alma” não só se aplica aos humanos, mas também aos animais. Por exemplo, ao descrever a criação das criaturas marítimas, Gênesis 1:20 diz que Deus ordenou: “Produzam as águas um enxame de almas viventes.” E no próximo dia criativo, Deus disse: “Produza a terra almas viventes segundo as suas espécies, animal doméstico, e animal movente, e animal selvático da terra, segundo a sua espécie.” — Gênesis 1:24; note Números 31:28.


De modo que a palavra “alma”, conforme usada na Bíblia, refere-se a uma pessoa ou a um animal, ou à vida que a pessoa ou o animal tem. A definição bíblica da alma é simples, coerente e livre das complicadas filosofias e das superstições dos homens. Sendo assim, precisamos fazer a pergunta urgente: Segundo a Bíblia, o que acontece à alma na morte?



Os mortos não estão conscientes?



 A condição dos mortos é tornada clara em Eclesiastes 9:5, 10, onde lemos: “Os mortos não sabem coisa nenhuma . . . Na sepultura . . . não há obra, nem projetos, nem conhecimento, nem sabedoria alguma.” (Almeida, Edição Contemporânea) Portanto, a morte é o estado de inexistência. O salmista escreveu que, quando alguém morre, “ele volta ao seu solo; neste dia perecem deveras os seus pensamentos”. (Salmo 146:4) Portanto, os mortos estão inconscientes, inativos.


Quando Deus sentenciou Adão, ele declarou: “Tu és pó e ao pó voltarás.” (Gênesis 3:19) Antes de Deus formá-lo do pó do solo e dar-lhe vida, Adão não existia. Quando Adão morreu, ele voltou à mesma condição. Sua punição foi a morte, não a transferência para outro domínio. Então, o que aconteceu com a sua alma? Visto que na Bíblia a palavra “alma” muitas vezes simplesmente se refere a uma pessoa, quando dizemos que Adão morreu, estamos dizendo que a alma chamada Adão morreu. Isso talvez pareça estranho a alguém que crê na imortalidade da alma. No entanto, a Bíblia declara: “A alma que pecar — ela é que morrerá.” (Ezequiel 18:4) Levítico 21:1 fala duma “alma falecida” (dum “cadáver”, A Bíblia de Jerusalém). E mandou-se aos nazireus que não se chegassem “a nenhuma alma morta” (“defunto”, Pontifício Instituto Bíblico). — Números 6:6.


No entanto, que dizer da declaração em Gênesis 35:18 a respeito da morte trágica de Raquel, quando ela deu à luz seu segundo filho? Lemos ali: “Enquanto a sua alma partia (porque estava morrendo), ela chamou-o pelo nome de Ben-Oni; mas o seu pai chamou-o de Benjamim.” Será que esta passagem dá a entender que Raquel tinha no íntimo um ser que partiu quando ela morreu? De forma alguma. Lembre-se de que a palavra “alma” pode referir-se também à vida que a pessoa tem. Portanto, neste caso, a “alma” de Raquel simplesmente significava sua “vida”. É por isso que outras traduções da Bíblia vertem a frase “a sua alma partia” por “ela estava morrendo” (A Bíblia na Linguagem de Hoje), “no seu último suspiro” (Bíblia — Tradução Ecumênica) e “estando prestes a morrer” (Bíblia Vozes). Não há nenhum indício de que uma parte misteriosa de Raquel tenha sobrevivido à sua morte.


Algo similar se deu com a ressurreição do filho duma viúva, registrada no capítulo 17 de 1 Reis. Lemos no versículo 22 que, enquanto Elias orava sobre o menino, “Jeová escutou . . . a voz de Elias, de modo que a alma do menino voltou para dentro dele e este reviveu”. Novamente, a palavra “alma” significa “vida”. De modo que a versão Almeida, Edição Contemporânea, reza: “A vida do menino tornou a entrar nele, e reviveu.” Sim, foi a vida, não alguma forma indistinta que retornou ao menino. Isso está em harmonia com o que Elias disse à mãe do menino: “Vê, teu filho [a pessoa como um todo] está vivo.” — 1 Reis



P.S - Índio, a princípio, também não tinha alma.

Leitura Sugerida
Concílio de Mâcon decide por maioria de um voto que mulher tem alma