segunda-feira, 16 de novembro de 2015

ASTROLOGIA NA ÚLTIMA CEIA DE LEONARDO DA VINCE





Cruz do Zodíaco





OS DOZE APÓSTOLOS E OS DOZE SIGNOS ASTROLÓGICOS




                                                                                 POR LUCIENE FELIX LAMY




Observem o agrupamento proposital de 3 em 3 (Cardinal – Fixo – Mutável), abarcando os 4 elementos (Fogo – Terra – Ar – Água) e totalizando os 12 signos astrológicos.






Na antiguidade, a química e a alquimia eram uma só ciência, assim como a astrologia e astronomia. Por volta do século XIII d.C., o Papa Inocêncio III decretou uma bula, cindindo a ciência entre sagrada e profana. Desde então, astrólogos e alquimistas passaram a ser perseguidos.

Leonardo Da Vinci, um iniciado, decidiu imortalizar através da pintura toda a simbologia astrológica e numerológica contida nos ensinamentos do cristianismo esotérico, deixando este registro no quadro “A Última Ceia”.

“A Última Ceia” é, talvez, a pintura mais reproduzida do mundo.  Da Vinci trabalhou de 1495 a 1498, pintando-a na parede do Refeitório do Convento de Santa Maria delle Grazie, em Milão.

Nela, os 12 apóstolos estão caracterizados pelos signos astrológicos, de acordo com os estudos da astróloga Emma de Mascheville, no livro “Luz e Sombra”.

Segundo o autor Santiago Americano Freire em “Leonardo Da Vinci” o pintor teria se inspirado no Evangelho de João, capítulo XIII. Na pintura os doze apóstolos representam os doze signos do zodíaco, de Áries a Peixes.

Leonardo esquematizou a disposição dos apóstolos de acordo com a posição astronômica, da direita para a esquerda de quem olha para o quadroOs apóstolos estão colocados em quatro grupos de três, simbolizando as quatro estações do ano da esquerda para a direita.

Jesus está ao bem centro, sua cabeça debaixo de um arco, um semicírculo, observando-se ao fundo três janelas abertas por onde entram luz (a iluminação). À direita e à esquerda da sala estão duas janelas fechadas de cada lado, simbolizando a escuridão (as trevas).

Jesus, ao centro entre João e André, tem as duas mãos estendidas uma para cada lado (a imparcialidade). Sugere-se que com a mão esquerda Cristo se doa e com a direita recolhe. Observa-se ainda a cabeça de Cristo pendendo para o lado esquerdo, o lado do coração.

O primeiro apóstolo à direita, na cabeceira da mesa, é Simão, o cananeu, com os dois punhos à frente, e que corresponde ao signo de Áries, Signo de fogo e de ação, Simão indica com as mãos a direção a tomar. Áries rege a cabeça na anatomia astrológica, e a testa de Simão é bem realçada na pintura. Sua prontidão ariana também é mostrada pelas mãos desembaraçadas, para agirem conforme a vontade e coragem cardeal [cardinal] de Áries.

Ao seu lado, está Judas Tadeu, o taurino. Seu semblante é sereno; enquanto escuta Simão (Áries/cérebro) vai digerindo lentamente suas impressões, acolhendo-as com uma das mãos, revelando a possessividade de Touro (que é terra/receptivo). No corpo humano, Touro rege o pescoço e a garganta, e o de Judas Tadeu está bem destacado.

Mateus vem em seguida, correspondendo a Gêmeos, signo duplo que necessita de interação com as pessoas e de colher informações. Mateus tem as mãos dispostas para um lado e o rosto para o outro, revelando a dinâmica geminiana de querer falar e ouvir a todos ao mesmo tempo. Mateus era repórter e historiador da vida de Jesus, e Gêmeos rege a casa III, setor de comunicação e do conhecimento.

Logo após, está Filipe, o canceriano. Suas mãos em direção ao peito mostram a tendência canceriana para acolher, proteger e cuidar das coisas. Regido pela Lua, Câncer trabalha com o sentir. Filipe está inclinado, como se estivesse se oferecendo para alguma tarefa.

Ao seu lado está Tiago Menor, o leonino, de braços abertos, revelando nesse gesto largo o poder de irradiar amor (Leão rege o coração e o chacra cardíaco), ele se impõe nesse gesto confiante, centralizando atenções. A Casa V diz respeito aos jogos (inclusive amorosos!), a criatividade e a prole.

Atrás dele, quase que escondido, está Tomé, o virginiano, que, apesar de modesto, não deixa de expressar o lado crítico e inquisitivo de Virgem – com o dedo em riste ele contesta diante de Cristo; foi Tomé quem quis o ver para crer. Rege a Casa VI, saúde e a rotina do dia a dia.

Libra é simbolizado por João, de semblante sereno; o discípulo amado sentado mais próximo de Jesus. Com as mãos entrelaçadas, ele pondera e considera todas as opiniões antes de tomar posições – Libra rege a casa VII [do casamento, uniões, parcerias e associações], é o setor do outro e isso requer imparcialidade e diplomacia.

Ao seu lado, está Judas Iscariotes, representando Escorpião. Com uma das mãos ele segura a sacola com os “dinare”, o olhar profundo, angustiado, triste, amargurado. Era o organizador das finanças da comunidade dos apóstolos (Escorpião rege a casa VIII, que trata dos bens e valores dos outros) e com a outra mão ele bate na mesa, protestando.

Sagitário é representado por Pedro, o Pescador de Almas. Foi ele quem fez o dogma e instituiu a lei da Igreja – Sagitário rege a casa IX, setor das leis, religiões e filosofia. Seu dedo aponta para Jesus – a meta de Sagitário é espiritual – e na outra mão ele segura uma faca, representando o lado instintivo nos homens. Ele se eleva entre outros dois apóstolos, trazendo esclarecimentos (luz) à discussão.

Ao seu lado está André, que representa Capricórnio. Conhecedor das responsabilidades, com seu gesto restritivo impõe limites. Seu rosto magro e ossos salientes revelam o biotipo capricorniano. Seus cabelos e barbas brancas e seu semblante sério mostram a relação de Capricórnio com o tempo e a sabedoria. Rege a Casa X, do status e da carreira profissional.

Os temores de André são apaziguados por Tiago Maioraquariano, que debruça uma de suas mãos sobre seus ombros, num gesto amigável, enquanto a outra se estende aos demais. Ele visualiza o conjunto, percebendo ali o trabalho em grupo liderado pelo Mestre. Aquário rege a casa XI, que é o setor dos grupos, amigos e esperanças.

O último da mesa é Bartolomeu, que representa Peixes. Seus pés estão em destaque (que são regidos por Peixes na anatomia astrológica). Ele parece absorvido pelo que acontece à mesa e, com as mãos apoiadas, quase debruçado, revela devoção envolvido pelo clima desse último encontro entre os apóstolos e Jesus Cristo, já que numa determinada hora as coisas ficaram um pouco confusas, pois Jesus revelou que “a mão do que me trai está comigo à mesa”. Rege a Casa XII, das finalizações. Fonte: internet, mas acresci alguns dados.

Agora, “A Última Ceia” nos “fala” mais de perto.

LUCIENE FELIX LAMY










domingo, 15 de novembro de 2015

TORTURA (INQUISIÇÃO) - JOHANNES JUNIUS










Johannes Junius foi um burgomestre e suposto bruxo alemão que exerceu suas funções em Bamberg em 1614, 1617, 1621 e entre 1624 e 1628, além de presidente do conselho entre 1608 e 1613, em 1615, 1616, 1618, 1619, 1620, 1622 e 1623.



Em 1628, o burgomestre de Bamburgo; Johannes Junius, foi acusado e processado por bruxaria.

Esta é a carta que escreveu à filha antes de ser morto, um dos mais importantes testemunhos das perseguições:

Cem mil vezes boa noite, minha adorada filha Verônica. Inocente, fui preso, inocente, fui torturado, inocente, devo morrer. Pois quem quer que seja trancafiado na prisão das bruxas é torturado até se decidir a inventar uma confissão qualquer. Na primeira vez em que fui submetido à tortura, lá estavam o doutor Braun, o doutor Kötzendörffer e outros dois estranhos. O doutor Braun me perguntou: "Amigo, por que está aqui?" E eu respondi: "Por falsas acusações e desgraça." "Escute", disse ele, "você é um bruxo. Quer confessar espontaneamente? Senão traremos as testemunhas e o carrasco".

Eu disse: "Não sou um bruxo, e minha consciência está tranquila com relação a isso. Nem mil testemunhas podem me assustar." Então chegou, Deus do Céu, tende piedade, o carrasco, que esmagou meus polegares com as mãos amarradas, de forma que o sangue jorrava das unhas e de todo lugar, e não pude usar as mãos por quatro semanas, como pode ver pela minha letra. Então me despiram, amarraram minhas mãos nas costas e me colocaram na polé. Pensei que Céu e Terra tivessem chegado ao fim; oito vezes fui erguido e solto, tendo sofrido terrivelmente. E assim confessei, mas era tudo mentira. Agora, querida menina, conto o que confessei para fugir da dor e das torturas que não teria conseguido suportar [...]

Eu deveria dizer quem tinha visto no sabá. Disse que não havia reconhecido ninguém.

"Velho arguto, vou chamar de volta o carrasco. Diga-me, não estaria lá o chanceler?" Então eu disse que sim, que estava. "E quem mais?" Eu não reconhecia ninguém. Então ele disse: "Siga uma rua depois da outra, começando pelo mercado, passando por toda uma rua e voltando pela seguinte." Fui obrigado a dar o nome de várias pessoas. Então chegou a rua comprida. Não conhecia ninguém que ali morasse, mas precisei dar o nome de oito pessoas. E assim continuaram por todas as ruas, ainda que eu não pudesse nem quisesse dizer mais nada. Então me entregaram ao carrasco, mandaram que ele me despisse e raspasse todo meu corpo e me submetesse à tortura.

E tive de confessar os crimes que cometi. Eu nada disse. "Levantem esse mentiroso!".

Então eu disse que deveria ter matado meus filhos, mas matei um cavalo.

Não adiantou nada [...] Eu também disse ter pego uma hóstia consagrada e tê-la profanado.

Quando disse isso, deixaram-me em paz.

Querida menina, guarda esta carta em segredo, ou sofrerei outras terríveis torturas, e meus carcereiros serão decapitados [...].
Boa noite, pois teu pai, Johannes Junius, não te verá mais.


sábado, 14 de novembro de 2015

A PERSEGUIÇÃO AOS "ANTIGOS CRENTES".











No século XVII, na Rússia, era preciso prestar muita atenção ao fazer o sinal-da-cruz. Quem errasse corria o risco de acabar na fogueira.

O período entre 1598 e 1613 é conhecido na história russa como o "Tempo das Dificuldades". No breve espaço de 15 anos, sucederam-se levantes populares, invasões, guerras civis, escassez. A própria Igreja Ortodoxa Russa viu-se ameaçada pelo proselitismo dos missionários católicos e luteranos.

As "dificuldades" chegaram ao fim com uma revolta popular que libertou Moscou dos estrangeiros e com a ascensão da dinastia Romanov ao trono.




Em 1619, Filaret, pai do czar Mikhail Fedorovich, que cuidou da reorganização administrativa da Igreja, foi nomeado patriarca da Igreja de Moscou (ou seja, líder da Igreja Russa). Essa centralização familiar do poder político e espiritual não foi casual. Na verdade, a própria concepção da religião e da sociedade russas previa um Estado e uma Igreja unidos em simbiose. "O Estado moscovita — ou seja, seu soberano, o czar — era inconcebível fora da moldura eclesiástica, sem a companhia da hierarquia da Igreja e, em mais alto grau, de seu patriarca."1

Os anos que se sucederam aos "difíceis" também testemunharam o nascimento de um novo movimento religioso, o dos "Amigos de Deus", liderado pelo pope (termo russo que significa sacerdote) Ivan Nerovov. Outro expoente de relevo do movimento foi o arcebispo Awakum, autor de uma famosa autobiografia.

Os "Amigos" eram um grupo de padres que pregavam em russo, mesmo fora das igrejas; lutavam pela moralização do clero e da vida pública; opunham-se aos costumes importados do exterior (como raspar a barba), e às diversões "pagãs".

A confraternidade queria impor "um cristianismo de uma austeridade monástica que [...] banisse qualquer alegria e qualquer distração. Em vez de adaptar o serviço divino dos súditos monges às necessidades dos leigos, impunha a militares, camponeses, a toda uma população, ritos de quatro ou cinco horas na igreja".2 

Os popes da confraternidade dos "Amigos" tiveram muitos desentendimentos com as autoridades locais fortemente contrárias à sua obra de moralização. O próprio Awakum fala, em sua autobiografia, que um poderoso atirou contra ele por "exasperação pela demora excessiva da liturgia".

O povo mais humilde também se desesperava com o rigor e mais de uma vez os expulsou das paróquias. Mas os "Amigos" sempre conseguiam se safar, entre outras coisas, porque contavam com a amizade e proteção tanto do czar quanto do patriarca de Moscou.

Em 1652, Nikon, graças também ao apoio dos "Amigos de Deus", foi eleito patriarca de Moscou. Mas ele acabou logo com as expectativas de seus partidários. Os reformistas sonhavam com uma regeneração espiritual da Rússia que envolvesse todo o clero e grupos sociais.

Mas Nikon, que os historiadores compararam a uma espécie de Inocêncio III russo, queria criar uma Igreja teocrática, submissa às vontades do patriarca, que impusesse sua própria autoridade ao czar e estendesse sua influência às outras Igrejas ortodoxas do Oriente.

E talvez para dar à Igreja uma imagem mais "ecumênica" e autoritária, ele tenha decidido eliminar da liturgia russa alguns elementos nacionais e torná-la mais parecida com as outras crenças de rito grego, em especial a de Jerusalém.

Nikon manteve boas relações com o patriarca ortodoxo de Jerusalém, Paisios, não obstante o seu envolvimento no assassinato de seu rival fosse conhecido na corte e apesar de ele ter personagens duvidosos entre seus emissários a Moscou, como o religioso Arsênio, um aventureiro internacional que trocara de religião três ou quatro vezes durante suas peregrinações.

As diferenças mais evidentes entre os costumes gregos e russos estavam no sinal-da-cruz (os gregos o faziam com três dedos, os russos, com dois), no batismo (os gregos o realizavam por infusão, como os latinos, os russos, por imersão tripla) e na contagem dos anos a partir da criação do mundo (5500 para os gregos, 5508 para os russos).





Nikon decidiu adotar os ritos gregos, erradamente considerados mais "puros" e antigos. Também foram introduzidas outras mudanças, como a grafia do nome Jesus, que mudava de Isus para lisus. Muitos não a aceitaram, pois para eles parecia que Cristo era substituído por outra divindade ou até mesmo pelo anticristo.

O patriarca de Moscou introduziu suas reformas de maneira brutal e autoritária, sem nenhuma mediação ou gradualismo. Suas inovações provocaram angústia nos fiéis russos, que de um dia para o outro se viram proibidos de praticar o que lhes pareciam as manifestações "naturais" de religiosidade, substituindo -as por costumes estranhos à sua cultura e tradição.

Naturalmente, os "Amigos de Deus" foram os primeiros a protestar contra as mudanças, mas Nikon respondeu com a repressão.

Em 1653, mais de sessenta opositores às reformas, dentre os quais Neronov e Awakum, foram presos. Este último foi trancado no mosteiro de Sant'Andronico, em Moscou, onde tentaram subjugá-lo, inutilmente, pela fome. Neronov, ao contrário, cedeu ao suplício e abjurou.

Awakum (graças à intervenção do czar, que o poupou de penas bem piores) foi exilada na Sibéria com toda a família por dez anos.

Em 1654, Nikon convocou um concilio em Moscou para ratificar sua reforma. O arcebispo de Kolomna Pavel, que contestou as conclusões da assembléia, foi deposto, preso secretamente e, ao que parece, queimado na fogueira.

No mesmo ano do concilio, eclodiu na Rússia uma epidemia de peste, que muitos fiéis tradicionalistas interpretaram como uma punição pela traição com a qual o clero russo se sujara.

Em 1655, Nikon proibiu o sinal-da-cruz; com dois dedos e, no ano seguinte, passou a punir com a excomunhão quem continuasse a fazê-lo. "Aquele sinal-da-cruz, que a grande maioria dos russos havia visto os pais e avós fazendo, agora era considerado heresia, e quem insistisse em realizá-lo era afastado da Igreja." (Pia Pera, 1986, p. 36.)

Foi naqueles anos que surgiu o cisma dos "antigos crentes" na Igreja russa, que perdura até hoje. Uma Igreja popular, próxima às classes humildes e presa às tradições se contrapunha a uma autoritária e voltada para as classes altas.

Em 1657, três artesãos de Rostov, inimigos das inovações, foram torturados e exilados por ordem do czar.

Muitos "antigos crentes", que rejeitavam tanto a autoridade do Estado quanto a da Igreja, fugiram dos vilarejos e das cidades para se estabelecer nos espaços abandonados e quase inabitados do Baixo Volga, do Don, dos Urais e da Sibéria. Alguns extremistas, convencidos de que o mundo estava dominado pelo anticristo, deixaram-se morrer de fome ou atearam fogo ao próprio corpo.

Os monges do mosteiro de Solovki se rebelaram contra a nova liturgia e foram atacados pelas tropas do czar, que só conseguiram tomar o convento após um assédio de oito anos.

"No geral, a reforma de Nikon teve o efeito de afastar da Igreja uma parcela considerável do povo russo." (Pia Pera, 1986, p. 37.)

Em 1666, um novo concilio depôs Nikon, mas confirmou todas as suas inovações doutrinárias (que tinham a aprovação do czar).

Awakum, que participara dos trabalhos do concilio para defender a causa da "verdadeira" fé russa, foi declarado deposto e preso. Três discípulos seus tiveram um pedaço da língua cortado.

A sessão se concluiu em 2 de julho, com a condenação solene da antiga fé e a de seus adeptos.

Em 1667, Awakum foi exilado em Pustozërsk junto com alguns seguidores. De lá, continuou guiando os "antigos crentes" que permaneceram na Rússia.

Em 1670, foram realizadas outras perseguições sanguinárias. Alguns discípulos de Awakum foram enforcados, e sua mulher e seus filhos (que ele não via há quatro anos) foram presos em um calabouço. Três amigos seus, que com ele compartilhavam a experiência do exílio, tiveram um pedaço da língua cortado e foram presos em um calabouço junto com seu pai espiritual.

Em 1682, foi realizado um enésimo concilio, que ordenou que as autoridades civis e religiosas procurassem ativamente os antigos crentes e acirrassem as perseguições. Também foi dada ordem para queimar vivos os quatro sacerdotes irredutíveis.

E, assim, em 14 de abril de 1682, os quatro crentes Awakum, Lazar, Epifanij e Fédor foram martirizados por insistirem em fazer o sinal-da-cruz com dois dedos, em vez de três.

Antes da execução, Awakum escrevera, no cárcere, uma autobiografia que entrou para a história com o título de A vida do arcebispo Avvakum, e circulou de forma clandestina e manuscrita por cerca de dois séculos, antes de ser impressa.

FONTE DE ESTUDO

1.   É a tese do historiador Marc Raeff, citado em: Pia Pera (organizado por), Vita deii'arciprete Avvakum scritta da lui stesso. Milão, Adelphi, 1986.
2.   Pierre Pascal citado em Pia Pera, op. cit., p. 22.




sexta-feira, 13 de novembro de 2015

HEREGES


Por David Bailly





Os Arminianistas

De todos os hereges, os arminianistas eram de longe considerados os piores. Afirmavam que qualquer um tinha o direito de professar a religião em que mais acreditasse, sem ser perseguido.

Jacó Armínio (1560-1609), professor de Teologia na Universidade de Leida, era um defensor do livre-arbítrio e da tolerância para com as minorias religiosas. Além disso, refutava totalmente a doutrina calvinista da predestinação. Um sínodo internacional de reformistas, na maioria calvinistas, realizado em Dort, em 1618-1619, condenou o arminianismo.

Poucos dias depois, um de seus líderes foi decapitado e outro foi condenado à prisão perpétua.

Na Holanda, os arminianistas, também chamados de arminianos, criaram uma Igreja separada.






Os quacres

Também chamados de "amigos", eram conduzidos pelo apóstolo John Foxe, homem inculto, mas pacifista, que pregava a presença de Deus em todos os homens e acreditava ser possível aproximar-se Dele sem sacramentos, sacerdotes ou celebrações espetaculares.

O quacrismo promovia um novo estilo de vida que tendia a favorecer a simplicidade das relações e a igualdade de sexo, raça e classe. Foxe difundiu o movimento especialmente em Gales e na Inglaterra, enquanto outros fiéis pregaram na Holanda, na Polônia e em Massachusetts. A repressão puritana ocorrida durante o Commonwealth (1649-1659) matou cerca de 3.170 quacres.








Giordano Bruno

Tendo vivido entre 1548 e 1600, foi o herege mais famoso do século XVII. Sacerdote e frei dominicano, formado em Teologia em 1575, fugiu da prisão "apertada e negra do convento" e adotou uma vida nômade pela Europa.

Tornou-se "mago", astrólogo e escritor. Reivindicou para si a teoria heliocêntrica de Copérnico (é a Terra que gira em volta do Sol, e não o contrário) e afirmou que as estrelas do firmamento também são sóis em volta dos quais orbitam mundos parecidos com o nosso.

Entregue à Inquisição em 1592, sofreu um processo que durou oito anos. Acabou abjurando parte de suas convicções. Mas quando o obrigaram a condenar todas as suas idéias, inclusive as que não foram analisadas como heréticas pelo tribunal, Giordano Bruno negou-se, resistindo até à tortura, e em 20 de janeiro de 1600 foi condenado à morte.

"Talvez vocês tenham mais medo de pronunciar minha sentença do que eu tenho de recebê-la!" foram as palavras com que ouviu o veredicto.

Em 17 de fevereiro de 1600, a execução foi finalmente realizada. O filósofo foi queimado vivo em Roma, no Campo del'Fiori. Antes, foi-lhe enfiada na boca uma mordaça, instrumento de madeira que impedia que o condenado mexesse a língua, por causa dos "palavrões que dizia, sem querer ouvir quem o confortasse ou outras pessoas".






Galileu Galilei

Viveu entre 1564 e 1642. Foi um dos pais da ciência moderna. Por ter reivindicado as teorias de Copérnico, mas principalmente por ter afirmado que as Escrituras eram infalíveis nos assuntos de fé, mas não nos científicos, Galileu acabou na mira na Inquisição. Submetido à prisão e à tortura, mesmo sendo idoso e estando gravemente doente, no final, o cientista abjurou todas as suas convicções.

A SENTENÇA DE GALILEU







Paulo Sarpi

Historiador e teólogo veneziano (1552-1623). Entrou para a Ordem dos Servitas em 1566, e tornou-se seu procurador-geral em 1585. Após uma estada em Roma, onde esteve em contato com a Cúria (1585-1588), estabeleceu-se em Veneza.

Consultado como especialista sobre uma questão jurídica que opunha a República de Veneza à Santa Sé, Paulo Sarpi defendeu Veneza com uma série de escritos que lhe proporcionaram grande fama, mas também a excomunhão e uma tentativa de assassinato por parte dos jesuítas.

Em 1619, publicou em Londres a história do Concilio de Trento, com o pseudônimo de Pietro Soave Polano.

A obra defendia a tese segundo a qual o Concilio de Trento representou o ápice de um processo secular de decadência moral da Igreja e que suas deliberações foram resultados de embates políticos, e não conseqüência de autênticos debates sobre a fé. Sarpi também jogava sobre o papado a grave responsabilidade de ter tornado irrevogável o cisma com os protestantes.


Os reformadores católicos

Antes mesmo do cisma de Lutero, houve intelectuais e eclesiásticos que tentaram reformar a Igreja Católica de dentro. Teólogos estudaram com escrúpulo e rigor filológico a Palavra de Deus. Filósofos e eclesiásticos tentaram difundir, com sermões e tratados, um cristianismo mais maduro também junto ao povo, procuram evitar que práticas religiosas como o culto aos santos e às relíquias se transformasse em superstições e idolatria. Finalmente, alguns fundaram novas ordens religiosas que tentavam restaurar as regras primitivas de pobreza e simplicidade.


O muro da Contra-Reforma

O sucesso da Reforma Protestante na Europa criou na Igreja Católica muitos problemas de cunho político, econômico, administrativo e doutrinário. Os próprios prelados católicos haviam se dividido a respeito do comportamento a adotar com relação aos reformistas: alguns buscavam a reconciliação, ao menos com os luteranos "moderados", outros defendiam uma posição intransigente e antiluterana.

Era preciso um momento de clareza que levasse a uma profunda reorganização da instituição eclesiástica. Por essas razões, o papa Paulo III convocou um concilio ecumênico que teve início em Trento em 13 de dezembro de 1545. Os trabalhos da assembléia se estenderam, entre interrupções e transferências de sede, por quase vinte anos, sendo concluídos apenas em 14 de dezembro de 1563.

Qualquer possibilidade de diálogo encontrava obstáculos por parte dos papas, que temiam que o concilio tomasse uma feição "democrática" demais, o que prejudicava sua autoridade.

A corrente intransigente e antiluterana acabou triunfando, aliada a setores que reivindicavam uma reforma moral do clero e uma maior disciplina. O concilio se encerrou com a aprovação de algumas afirmações doutrinárias: a tradição histórica (ou seja, o conjunto de dogmas, regras e ritos introduzidos ao longo dos séculos e que não tinham nenhuma relação com as Escrituras) tinha o mesmo peso que a Bíblia; a única versão autorizada dos textos sagrados era a Vulgata de São Jerônimo; a única interpretação correta das Sagradas Escrituras era aquela dada pela Igreja; todo ser humano nascia trazendo em si a mácula do pecado original, que só podia ser apagada com o batismo, celebrado nas formas estabelecidas pela Igreja; também foram confirmados o número e a validade dos sacramentos; e a característica sagrada do ministério sacerdotal, que não podia se estender a todos os fiéis.

Na prática, foram refutados todos os argumentos de fé protestante.

As afirmações do concilio constituíam a verdade da fé e eram formuladas de forma a não deixar margem a dúvidas ou ambigüidades. O funil da ortodoxia se tornava cada vez mais estreito. Também foram tomadas medidas de reorganização e moralização do clero. Os bispos foram obrigados a residir no território das próprias dioceses, foi proibido o acúmulo de benefícios eclesiásticos e confirmado, com vigor, o celibato. Foram criados os seminários diocesanos, que deveriam formar um clero mais instruído, capaz de fazer frente aos pregadores hereges.

Nasceu o Índex, uma lista, atualizada continuamente, de publicações condenadas pela Igreja, que um católico só poderia ler com autorização.


Foi reconhecida a faculdade do papa de aprovar e ratificar as decisões dos concílios, o que confirmava o princípio da autoridade absoluta do pontífice.

SABER MAIS:

O Que é Heresia