Antes de 1492, os
Estados cristãos do Ocidente lutavam entre si dentro de uma bacia bem restrita:
a Europa, a África do Norte e as terras banhadas pelo Mediterrâneo. Após a
façanha de Colombo, essas lutas se espalharam pelo mundo todo, com a bênção das
várias Igrejas. O próprio Cristóvão Colombo (que, não nos esqueçamos, inaugurou
a descoberta do novo continente com a captura de alguns escravos) sonhava que,
com o ouro das índias, o reis da Espanha poderiam realizar uma Cruzada para
libertar a Terra Santa.1
Foi um pontífice, Alessandro VI Bórgia
(1492-1503), que dividiu, com a bula Inter Caetera, o globo terrestre
entre as nascentes potências coloniais católicas. Uma linha de alto a baixo
dividia em dois o mapa: metade era reservada à Espanha, outra, a Portugal.
Quando Colombo
desembarcou em Cuba, a população da ilha somava cerca de oito milhões de
habitantes. Quatro anos depois, estava mais do que dizimada. Depois que os
cubanos em parte foram exterminados, os espanhóis começaram a importar escravos
de outras ilhas do Caribe. Assim, "milhões de autóctones da região
caribenha foram efetivamente liquidados em menos de um quarto de século".2
O trabalho de
conquista, exploração e sujeição das populações do continente americano foi
levado adiante pelos conquistadores, comandantes de exércitos a serviço dos
reis da Espanha e da fé católica. Estes tinham ao seu lado corajosos
sacerdotes. Hernán Cortês, Francisco Pizarro, Hernando De Soto, Pedro de
Alvarado e centenas de outros, aproveitando-se da superioridade tecnológica e
militar de que gozavam, destruíram florescentes civilizações como a inca, a
maia e a asteca. As conseqüências das conquistas foram milhões de mortos e um
estado de dependência evidente até hoje.
As Américas
Desde o início, o
massacre dos nativos americanos foi "abençoado por Deus". Nos
"Contos Astecas sobre a Conquista",3 colhidos pelo clero
franciscano, lê-se que Cortês era apoiado pelo Estado Pontifício: "Esta
era a vontade do papa, que dera seu consentimento à vinda deles". Além
disso, sabemos que o famoso conquistador andava sempre com um sacerdote do
lado.
Mas quantos mortos
a conquista auspiciada por Deus e conduzida pelas mãos dos conquistadores
deixou? No México, só a título de exemplo, a população passou de 12 milhões, em
1519, a menos de 1,3 milhão na metade de 1600. Noventa por cento da população
local havia sido exterminada.4, No início do século XVI, a população
nativa do continente centro e sul-americano girava em torno de setenta milhões
de pessoas. Na metade do século XVII, havia sido reduzida a sete milhões.5
E em países como o nosso, a Guatemala ou a região mexicana do Chiapas a
dizimação dos índios acontece até hoje.
Os conquistadores
não eram muito sutis. Se um povoado resistia, avançavam matando todos os
habitantes que encontravam no caminho. As crônicas da época falam de
"incontáveis cadáveres" espalhados por toda parte e de seu fedor "penetrante
e pestilento".6 Muitos relatos acerca das atrocidades vieram
dos próprios missionários e dos funcionários imperiais ou mesmo dos
conquistadores.
Para entender quem
eram, basta citar alguns episódios. Cortês, para coibir uma rebelião popular,
convocou sessenta caciques (dignitários astecas) e ordenou que cada um levasse
consigo o próprio herdeiro. Então, mandou queimá-los vivos na presença de seus
parentes e advertiu os herdeiros para que conhecessem a inconveniência de
desobedecer os espanhóis.
Um povo nativo,
guiado pelo chefe indígena Hatuey, tentou se rebelar contra a escravidão.
Tentaram uma fuga em massa, mas foram novamente capturados pelos espanhóis.
Hatuey foi queimado vivo. "Quando o amarraram ao patíbulo, um frade
franciscano implorou insistentemente para que abrisse seu coração a Jesus, de
modo que sua alma pudesse subir aos céus, em vez de se precipitar na perdição.
Hatuey respondeu dizendo que se o Céu era o lugar reservado aos cristãos, ele
preferia de longe ir para o Inferno."7
Seu povo também
teve uma sorte parecida: "Os espanhóis gostavam de imaginar todo tipo de
atrocidade ainda não cometida [...] Chegaram a construir forcas enormes em que
os pés mal tocavam o chão (para evitar o sufocamento) e penduraram em cada uma
— em honra do redentor e dos 12 apóstolos — grupos de 13 indígenas, colocando
embaixo lenha e brasas e queimando-os vivos."
Em ocasiões
parecidas, inventaram outras gracinhas: "Os espanhóis arrancavam o braço
de um, a perna ou a coxa de outro, para arrancar de um só golpe a cabeça de
alguém, de modo não muito diferente de como faz um açougueiro, que esquarteja
as ovelhas para o mercado. Seiscentas pessoas, incluindo caciques, foram
esquartejadas como animais ferozes... Vasco de Balboa fez quarenta delas serem
devoradas pelos cães." (Standard, 2001.)
Às vezes, as
mortes não tinham nenhuma finalidade prática, mas eram um simples ato
arbitrário. Por exemplo, em 1517, nas ilhas caribenhas, "alguns cristãos
encontraram uma índia que segurava uma criança em um braço, dando-lhe de mamar.
Como os cães que os acompanhavam estavam famintos, tiraram o menino dos braços
da mãe e o jogaram vivo como alimento para os cães, que o fizeram em pedaços
diante dos olhos da mulher [...] quando havia mulheres que haviam parido há
pouco entre os prisioneiros, se os recém-nascidos começassem a chorar,
pegavam-nos pelas pernas e os batiam contra as pedras ou os jogavam em plantas
espinhosas para que acabassem de morrer" (Todorov, 1997, p. 169).
Outro grave
episódio foi o massacre de Caonao, em Cuba, presenciado pelo mesmo Las Casas.
Uma centena de espanhóis armados, para verificar se suas espadas estavam bem
afiadas, "começaram a estripar, perfurar e massacrar ovelhas e cordeiros,
homens e mulheres, idosos e crianças que estavam tranquilamente sentados ali
perto, observando maravilhados os cavalos e os espanhóis". Não contentes
com o massacre ao ar livre, entraram em uma casa grande e "começaram a
assassinar, cortando e furando todos aqueles que ali se encontravam: o sangue
escorria por toda parte, como se um rebanho de vacas tivesse sido morto... A
visão das feridas que cobriam os corpos dos mortos e dos moribundos era um
espetáculo horrível e assustador... os golpes sobre os corpos completamente nus
e sobre aquelas carnes delicadas haviam partido ao meio um homem com um único
golpe" (Todorov, 1997, p. 172).
O viajante Pietro
Martire assim descreve a expedição de Vasco Nunez de Balboa: "Assim como
os açougueiros cortam em pedaços a carne dos bois e das ovelhas para vendê-la
pendurada em ganchos, os espanhóis arrancavam com um só golpe o traseiro de um,
a coxa de outro, as costas de outro ainda. Consideravam-nos animais isentos de
razão... Vasco mandou os cães esquartejarem quarenta deles".8
Ainda em 1550, o
monge Jerônimo de San Miguel denunciou que os espanhóis "queimaram vivos
alguns índios, arrancaram mãos, nariz, língua e membros de outros; outros foram
jogados aos cães; mulheres tiveram os seios cortados..." O bispo de
Yucatán, Diego de Landa, disse ter visto "uma grande árvore com galhos
onde um capitão havia enforcando várias índias; e em seus tornozelos pendurara,
pela garganta, seus filhos. [...] E se durante o transporte os indígenas,
arrastados com a corda no pescoço, não andassem animados como seus
companheiros, os espanhóis cortavam sua cabeça, para não precisar parar para
desamarrá-lo".9
Um cronista de
1570 fala de um "oidor" (juiz) "que afirmava em público, de cima
de seu tablado e em voz alta, que se faltasse água para irrigar as fazendas dos
espanhóis, seria utilizado o sangue dos indígenas".
Uma conquista "legal"
A base
"legal" da conquista era o Requerimiento, um documento que os
funcionários espanhóis liam, obviamente em espanhol, aos povos que pretendiam
submeter antes de dar início aos combates. O documento começava com uma breve
história da humanidade, na qual surgia uma figura central, Cristo, definido
como o "chefe da estirpe humana". Cristo transmitiu seu poder a São
Pedro, e este, aos papas, seus sucessores. Um desses papas deu o continente
americano aos espanhóis, que eram seus legítimos governantes.
Se os
"índios" se submetessem aos espanhóis "de boa vontade",
manteriam o status de homens livres, do contrário seriam capturados como
escravos. "Com isso, garanto e juro que, com a ajuda de Deus e com a nossa
força, penetraremos em suas terras e faremos guerra contra vocês [...] para
submetê-los ao jogo e ao poder da Santa Igreja [...], causando-lhes todo
prejuízo possível e de que somos capazes, como convém a vassalos obstinados e
rebeldes que não reconhecem seu senhor e não querem obedecer, mas se opor a
ele." (Standard, 2001, p. 66.)
Em 1550, o
conquistador Pedro de Valdívia enviou uma relação sobre a guerra contra os
arauaques, nativos do Chile, ao rei da Espanha. Nela se lê, entre outras
coisas: "Mandei cortar o nariz e as mãos de duzentos deles, para puni-los
por sua insubordinação".10
O conquistador Oviedo chegará a
afirmar: "Quem irá negar que usar a pólvora contra os pagãos é como
oferecer incenso a Nosso Senhor?"11
As guerras de
conquista, além de assassinatos, provocavam a morte de vários índios em
decorrência da escassez que se sobreveio a elas. Durante a guerra para a
conquista da Cidade do México, os espanhóis destruíram as colheitas e se viram
a ponto de ter eles próprios problemas com as provisões de milho.
Grande parte da
população nativa foi reduzida à escravidão diretamente, capturada pelos
espanhóis, ou indiretamente, não conseguindo pagar os pesados tributos impostos
pelos novos dominadores. Eis o que escreve um cronista da época: "Os
impostos que recaíam sobre os índios eram tão altos que muitas cidades, não
conseguindo pagá-los, vendiam aos usurários as terras e os filhos dos pobres;
mas como os empréstimos eram freqüentes demais, e os índios não podiam se
livrar nem vendendo tudo que tinham, algumas cidades se esvaziaram
completamente e outras perderam parte da população."12
O governador da
Cidade do México, Nino de Guzmàn, escravizou dez mil nativos em uma população
total de 25 mil. Os sobreviventes abandonaram os vilarejos por medo de ter a
mesma sorte. Muitas vezes, aqueles que não conseguiam pagar os impostos eram
punidos com a tortura ou o cárcere.
Os índios
escravizados, em especial nos primeiros anos da Conquista, eram tratados como
animais de matadouro. Las Casas denunciou episódios de espanhóis que davam a carne
de índios trucidados aos animais no pasto e aos cães; nativos eram abertos para
que se extraísse sua gordura (à qual se atribuíam qualidades medicinais) ou
tinham as extremidades horrendamente mutiladas (nariz, mãos, seios, língua,
órgãos genitais).13
Outro episódio
também denunciado por Las Casas mostra que os nativos eram em todos os aspectos
tratados como animais: um "homem indigno se vangloriou e se jactanciou —
sem mostrar nenhuma vergonha —, diante de um religioso, de ter feito de tudo
para engravidar muitas mulheres índias, a fim de conseguir um preço melhor ao
vendê-las como escravas grávidas".14
Os nativos não
pereciam só pela espada ou pela pólvora, mas também pelas condições de vida
desumanas impostas pelos conquistadores. Turnos de trabalho massacrantes,
desnutrição, doenças trazidas pelos conquistadores, às quais seu organismo não
estava acostumado. Todas essas causas fizeram mais vítimas do que guerras ou
massacres juntos.
Também foi grande
o número de indígenas mortos durante o trabalho de construção da Cidade do
México e de demolição dos "templos do Diabo", ou seja, templos de sua
religião tradicional. Houve quem caísse dos andaimes, quem fosse esmagado por
traves ou quem ficasse embaixo de prédios demolidos. Os índios empregados no
trabalho de demolição não só não eram remunerados, como tinham que procurar
sozinhos seus materiais.
A expectativa de
vida para quem era obrigado a trabalhar nas minas de ouro era de 25 anos. Os
serviços de aprovisionamento nas minas também era de um cansaço extenuante. Os
índios encarregados do trabalho percorriam a pé, sobrecarregados de peso,
distâncias de quase 100 quilômetros. Muitas vezes, suas próprias provisões
terminavam antes de chegarem ao destino, e, quando chegavam, podiam ser pegos
para trabalhar nas minas por vários dias sem receber nenhuma alimentação
suplementar. Muitos morriam de fome e de cansaço nas minas ou na estrada de
volta.
"Os corpos
dos índios e dos escravos mortos nas minas produziam uma exalação tão fétida
que deles nasceu uma pestilência, sobretudo nas minas de Guaxaca. Até um raio
de meia légua de distância, e por grande parte da estrada, não se fazia nada
além de caminhar sobre cadáveres ou montes de ossos, e os bandos de pássaros e
corvos que chegavam para devorá-los eram tão grandes que tapavam o sol. Assim,
muitos povoados se esvaziaram ao longo da estrada e nos arredores."15
As transferências
de mão-de-obra por navio de um local de trabalho extenuante a outro também não
eram livres de vítimas. "Toda vez que os índios eram transferidos, tantos
morriam de fome durante a travessia que o rastro deixado pelos corpos seria
suficiente — acreditamos — para guiar outra embarcação até o porto. [...]
Depois que mais de oitocentos índios eram transferidos a um porto daquela ilha
chamado Porto de Plata, esperavam-se dois dias antes de fazê-los descer da
caravela. Deles, seiscentos morriam e eram jogados no mar: boiavam como grandes
tábuas de madeira." (Todorov, 1997, p. 166.)
Obviamente, entre
os abusos daqueles que os vigiavam estavam os sexuais. Falando da condição dos
operários em uma mina, um cronista notou que cada capataz "tinha adquirido
o hábito de ir para a cama com as índias que dependiam dele, se o agradassem,
fossem elas virgens ou casadas. Enquanto o capataz estava com uma índia na cabana,
o marido era enviado para extrair ouro nas minas; de noite; quando o pobre
voltava para casa, não só o capataz o enchia de pauladas ou chicotadas por não
ter pego bastante ouro, como muitas vezes amarrava suas mãos e pés e o jogava
debaixo da cama como um cão, enquanto se deitava em cima, com a mulher".16
Os missionários e o assassinato da alma
Com a conquista e
a cristianização forçada, os índios não foram mortos apenas fisicamente, mas
também moralmente. Sob esse aspecto, é exemplar o caso do povo dos lucaianos,
deportados em massa pelos espanhóis com seu engodo. Os conquistadores, com a
cumplicidade dos padres, conseguiram convencê-los de que os estavam levando
para uma Terra Prometida, onde encontrariam todos seus parentes já mortos.
"Como os padres
os encheram de falsas crenças e os espanhóis as confirmaram, abandonaram sua
pátria para correr atrás daquela vã esperança. Tão logo entenderam que tinham
sido enganados, já que não encontraram nem seus pais, nem outras pessoas que
queriam reencontrar, enquanto eram obrigados a aturar condições extenuantes e
trabalhos pesados com os quais não estavam acostumados, se desesperaram. Ou se
suicidavam, ou decidiam se deixar morrer de fome e faziam jejum, recusando-se a
comer a qualquer custo." (Todorov, 1997, p. 166.)
O bispo de Zumarraga
escreveu ao rei da Espanha que os nativos "não procuram mais as mulheres
para não gerar escravos". Las Casas denunciava que "marido e mulher
não ficavam juntos nem se viam por oito ou dez meses ou por um ano inteiro;
quando no final se encontravam, estavam tão cansados e prostrados de fome e dos
trabalhos, tão acabados e enfraquecidos, que mal se importavam em ter relações
conjugais. Assim, pararam de procriar. Os recém-nascidos morriam logo, pois as
mães — cansadas e famintas — não tinham leite para alimentá-los. Quando estive
em Cuba, sete mil crianças morreram em três meses por esse motivo. Algumas mães
afogavam os filhos por desespero; outras, ao perceber que estavam grávidas,
abortavam com o auxílio de algumas ervas que fazem parir filhos natimortos.
Trata-se... de um assassinato econômico, e os colonizadores têm toda a
responsabilidade" (Todorov, 1997, p. 166).
Missionários
abençoaram os massacres e as tragédias, e os reis da Espanha instituíram na
América, além das missões, tribunais de Inquisição destinados a punir todos os
indígenas que insistissem em seguir seus próprios cultos tradicionais. Filipe
II chegou ao ponto de instituir uma inquisição "de galeras", um
tribunal itinerante com o objetivo de descobrir e punir os hereges nos navios
durante as longas travessias oceânicas.17
Por outro lado,
não faltavam sacerdotes que se interessavam genuinamente pelas condições de
vida dos indígenas e denunciaram com força os abusos, as atrocidades e os
massacres. O caso mais famoso foi provavelmente o do bispo Bartolomé De Las
Casas, que escreveu vários livros sobre as condições de vida dos nativos
americanos e defendeu sua causa junto aos reis da Espanha.
Sabendo com quem
estava lidando, Las Casas e os outros sacerdotes apelaram não só aos seus
sentimentos, mas também à utilidade econômica de uma política de clemência. Las
Casas, em um relatório, afirmou que a realização de suas propostas seria
"de grande proveito para Sua Alteza, cujos rendimentos aumentariam
proporcionalmente". E o eclesiástico Motolinia escreveu: "Os
espanhóis não percebem que, se não fossem os frades, não teriam mais empregados
em suas casas e em suas terras, pois teriam matado todos, como aconteceu em
Santo Domingo e em outras ilhas, onde os índios foram exterminados." Mas
se os nativos não podiam mais ser utilizados em funções pesadas, quem
trabalharia nas plantações e nas minas, quem construiria as casas dos novos
dominadores?
Os conquistadores
encontraram uma solução pior que o mal: importar da África escravos negros.
Os sacerdotes
"bons" também se preocuparam em aprender a língua e os costumes dos
nativos, para tornar mais eficaz sua obra de conversão e transformar os
indígenas em perfeitos cristãos.
O franciscano
Bernardino de Sahagün, docente de um colégio de Tlatelolco destinado aos
descendentes da antiga nobreza asteca, obtém resultados extraordinários no
ensino do latim. De início, como ele mesmo conta, os espanhóis e os monges das
outras ordens caçoaram de seus esforços, pois os índios eram considerados animais,
"obtusos como asnos". Mas quando perceberam que o grupo de estudantes
tinha feito grandes progressos, alarmaram-se: "Para que lhes ensinar a
gramática? Não corriam o risco de se tornar hereges? Diziam também que lendo as
Sagradas Escrituras constatariam que os antigos patriarcas tinham muitas
mulheres, exatamente como eles".18 Um funcionário de Carlos V
escreveu: "É bom que eles sejam catequizados, mas saber ler e escrever é
tão perigoso quanto se aproximar do Diabo".
Em suma, instruir
os índios era positivo, mas até certo ponto. Por um lado, os nativos não tinham
direito de seguir as próprias tradições e a própria cultura, por outro, não
lhes era permitida nem a possibilidade de se integrarem à nova sociedade e se
tornarem "pares" dos espanhóis.
Em 1579, em uma
petição à Inquisição, os superiores das ordens agostiniana, dominicana e
franciscana pediram que fosse proibida a tradução da Bíblia nas línguas
indígenas.19
América do Norte
O script se
repete, com poucas variações, na conquista inglesa da América do Norte. Lá
também os colonos justificaram a invasão com a necessidade de levar o Evangelho
e de "edificar um bastião contra o reino do anticristo".20
Os brancos logo começaram a expulsar os nativos de suas terras, e isso apesar
de os primeiros colonizadores terem conseguido sobreviver ao inverno rigoroso
graças à ajuda dos "índios". Também lá, as guerras, massacres,
prepotência e epidemias exterminaram grande parte dos povos indígenas. De 10 a
12 milhões de nativos que povoavam o atual território norte-americano antes da
colonização, só restaram 250 mil.21
A epidemia de
varíola, que exterminou cerca de dois terços da população indígena, foi vista
pelos colonizadores como um dom divino. Eis o que escreve, em 1634, o
governador de Massachusetts: "Quanto aos indígenas, quase todos morreram
de varíola, e assim o Senhor confirmou nosso direito de continuar o que
fazemos".22
Para os nativos da
América do Norte, a guerra não era um fenômeno desconhecido, mas os combates
entre as tribos de peles-vermelhas nunca assumiram a crueldade dos embates
entre ocidentais. Os padres peregrinos (os primeiros colonizadores que deram
origem aos Estados Unidos da América) notavam com estupor que "suas
guerras não são nem de longe tão cruéis" quanto as européias, e acontecia
até "de guerrearem por sete anos sem que sete homens perdessem a
vida". Além disso, os índios, no combate, poupavam mulheres e crianças do
adversário.
Bem diferentes
eram os costumes dos "civilizadores" cristãos: "Quando um índio
era acusado por um inglês de roubar uma xícara e não a devolvia, a reação
inglesa era logo violenta: atacavam os índios ateando fogo ao povoado
todo".23 Citemos, por exemplo, dentre as inúmeras guerras
índias que ocorreram entre 1600 e 1800, a dos pequots, antigos habitantes do
atual Massachusetts.
De início, os
colonos entraram em guerra com outro povo, o dos narragansett, responsáveis,
talvez, pela morte de um inglês. Mas, com o tempo, encontraram a tribo dos
pequots, que também eram inimigos dos narragansett, e em vez de reunir forças
contra um inimigo em comum, os cristãos os atacaram e destruíram seus povoados.
Talvez tenham pensado que um índio valia por outro. O comandante dos puritanos,
John Mason, assim descreveu um dos massacres: "O Onipotente incutiu tanto
terror a suas almas, que fugiram diante de nós se jogando nas chamas, onde
muitos pereceram... Deus abria as asas sobre eles e escarnecia de seus
inimigos, os inimigos de seu povo, tornando-os estacas ardentes... Assim o
Senhor castigou os pagãos, alinhando seus corpos: homens, mulheres e crianças.
Assim o Senhor quis dar um chute no traseiro de nossos inimigos, dando-nos, em
compensação, suas terras."24
Outro puritano,25
Underhill, conta que "o espetáculo sanguinário foi impressionante para os
jovens soldados", mas logo lembra: "Às vezes a Santíssima Trindade
ordena que as crianças pereçam com seus pais".
O massacre
continuou até que os pequot foram exterminados quase por completo. Muitas
outras tribos sofreram a mesma sorte. Vários nativos caíram vítimas de
campanhas de envenenamento, algo terrivelmente parecido com as
"desratizações" atuais. Os colonos chegaram a adestrar cães para
farejar os índios, arrancando os pequenos dos braços das mães e destroçando-os.
Para usar suas próprias palavras: "Cães ferozes para caçá-los e cães
policiais ingleses para o ataque".
Quando as mulheres
e crianças eram poupadas, era apenas para serem vendidas como escravas nos
mercados das Antilhas ou da África do Norte, de onde nunca ninguém voltou. A
utilização de jovens indígenas como escravas era um verdadeiro símbolo de
status. Se alguma desgraçada tentava fugir, era marcada com fogo.
O pastor Roger
Williams, por ter ousado declarar que aos olhos de Deus a fé dos nativos valia
tanto quanto aquela dos brancos e por ter comprado a terra, em vez de tomar
posse dela, foi expulso de sua colônia junto com uma dúzia de seguidores.
Uma inscrição no
túmulo de um puritano do século XVII resume bem o clima da época: "Em
memória de Lynn S. Love, que, durante sua vida, matou 98 índios que o Senhor
lhe destinara. Ele pretendia elevar o número a 100 [...] quando dormiu nos
braços de Jesus".26
HECATOMBE
Em New Hampshire e
em Vermont, antes da chegada dos ingleses, a população de abenakis somava 12
mil pessoas. Menos de cinqüenta anos depois, restavam apenas 250.
O povo dos
pocumtuck chegava a 18 mil. Duas gerações depois, seu número havia caído para
920.
Os
quiripi-unquachog eram pelo menos trinta mil antes da chegada dos ingleses.
Eles também foram exterminados no intervalo de duas gerações: os sobreviventes
não somavam mais de 1.500.
A população nativa
de Massachusetts, inicialmente composta de pelo menos 44 mil pessoas, cinqüenta
anos depois estava reduzida a apenas seis mil componentes.
E a horrível lista
poderia continuar... Tenhamos em mente que a colonização americana estava
apenas começando. A grande epidemia de varíola do biênio 1677/78 ainda não
tinha chegado, nem a epopeia do Faroeste. Calcula-se que entre 1500 e 1900, nas
duas Américas, 150 milhões de pessoas perderam a vida. Destas, dois terços por
causa de epidemias (a partir de 1750, muitas vezes provocadas intencionalmente,
através de presentes infectados), e cinqüenta milhões diretamente por atos de
violência dos conquistadores, em decorrência da escravidão ou de tratamentos
desumanos.
Os exterminadores
partilhavam seus relatórios sobre os massacres com entusiásticos boletins de
guerra e citando as Escrituras: "É a vontade de Deus, que, no final das
contas, nos dá motivos para exclamar: 'Como é grandiosa sua bondade! E como é
esplêndida sua glória!'" E ainda: "Até que nosso Senhor Jesus o
mandou inclinar-se diante dele e lamber a pólvora!"
Em 1703, o pastor
Salomão Stoddard, uma das mais influentes autoridades religiosas na Nova
Inglaterra, fez um pedido formal ao governador de Massachusetts para que se
estendessem aos colonizadores as contribuições econômicas para "adquirir
grandes matilhas de cães e para adestrá-los para caçarem índios como o fazem
com os ursos".27
Em 1860, o
religioso Rufus Anderson comentou a respeito do banho de sangue, que até então
havia exterminado pelo menos 90% da população autóctone das ilhas do Havaí,
definindo-o como um fato natural, comparável à "amputação das membranas
doentes de um organismo".
Os peles-vermelhas
eram considerados menos do que humanos e ninguém tinha obrigação de respeitar a
palavra dada a eles. Os tratados de paz eram estipulados já com a intenção de
serem violados. Por exemplo, o Conselho de Estado da Virgínia declarou que, se
os nativos "ficam mais calmos depois que um tratado é firmado, temos não
só a vantagem de pegá-los de surpresa, como de roubar seu milho".28
Em 1851, foram
instituídas as "Reservas Indígenas", que eram verdadeiros campos de
concentração onde os povos nativos eram presos.
Desde então, passaram-se
150 anos, mas ainda hoje, nas Reservas, as condições de vida são terríveis. No
final dos anos 1990, algumas registravam uma mortalidade neonatal de 10%,
enquanto entre os brancos a taxa era de 8,1 por mil nascimentos. Ainda nas
Reservas, uma criança a cada três morria até os seis meses. E a expectativa de
vida de um nativo era claramente inferior à de um branco (63 anos contra 76). O
percentual de suicídios entre os nativos era o dobro daquele da população
branca, além de 75% deles sofrerem de problemas de desnutrição.25
África, Ásia e Oceania
A primeira
conquista colonial do território africano ocorreu em 1344, quando o almirante
de la Cerda conquistou as Ilhas Canárias. O feito foi ordenado pelo papa
Clemente VI. Depois, por volta de 1400, os portugueses começaram a penetrar nas
costas de Angola e da Guiné. Conseguiram o feito graças a "tratados"
com as populações locais, ludibriadas pelos missionários.
Todas as
interiorizações seguintes se iniciaram assim, com os missionários inaugurando
as conquistas europeias. Se os africanos não cedessem, os próprios religiosos
informariam aos conquistadores que chegara o momento de recorrer às armas. Foi
o que aconteceu, por exemplo, em Kilwa, em 1505. Os habitantes das cidades não
permitiram a criação de missões nos arredores, pois sabiam muito bem que eram
um pretexto para o estabelecimento de antepostos militares. Então, os
missionários franciscanos informaram os portugueses, que destruíram totalmente
a cidade. Os missionários abençoavam os massacres, mas logo perceberam que não
havia comparação entres as riquezas que os portugueses conseguiam acumular na
África e as migalhas que mandavam à Santa Sé. Assim, eles arregaçaram as mangas
e trataram de conseguir, no início do século XVI, seus próprios escravos. O papa
tentou até a conquista militar da África (por exemplo, em 1540, o exército de
Deus atacou o então reino etíope), mas considerou mais conveniente ser o
intermediário da conquista, ganhando, com isso, escravos e latifúndios.
Logo o tráfico de
escravos da Santa Sé se intensificou. Em 1650, a Companhia de Jesus possuía tal
quantidade de escravos, que impressionava até os portugueses, e utilizava sua
própria frota, adaptada ao seu transporte.
Os nativos fizeram
eclodir verdadeiras revoltas antimissionárias, e os sacerdotes se viram
"obrigados" a demonstrar determinação. Quando os escravos ousavam se
rebelar, eram torturados publicamente. Em 1707, estourou uma revolta de
escravos em Madagascar. Os missionários, no caso calvinistas, torturaram os
rebeldes em praça pública e estrangularam uma escrava.
Na África do Sul,
a Igreja também se colocou sempre ao lado dos bôeres (colonizadores brancos de
origem holandesa). Tanto que, quando em 1837 os zulus se insurgiram contra o
roubo de suas terras, os missionários ajudaram os brancos a chegar perto de
seus povoados. Foram massacrados quatrocentos africanos, sobretudo mulheres,
idosos e crianças.
Em compensação
pela atividade e preciosa participação missionária na conquista da África, as
potências coloniais doaram à Igreja enormes latifúndios e entregaram às missões
o monopólio da educação e da saúde.
A África, antes da
chegada dos brancos, possuía um sistema amplo de assistência sanitária. Não
havia povoado em que um terapeuta tradicional não pudesse curar, com misturas
de ervas e minérios moídos, quem quer que pedisse. Todas essas práticas e
remédios foram tornados ilegais, para garantir o monopólio sanitário das
missões. Mas como estas não estavam amplamente difundidas no território, a
maior parte dos vilarejos africanos ficou sem possibilidade de tratamento. Foi
um massacre. No que diz respeito à educação, foram apagados milênios de
história africana para educar os negros à superioridade branca. As missões
ensinavam a história da Europa e a palavra de Deus. Com o bastão e o chicote,
extinguiu-se a cultura de um continente.
As etapas da opressão
Em 1341, uma
expedição ítalo-portuguesa fundou um povoado nas Ilhas Canárias. Estas eram
habitadas por um povo de origem africana, os guanchos. Seu número, antes do
desembarque dos europeus, fora calculado em cerca de oitenta mil indivíduos. Em
1344, o papa Clemente VI ordenou que o almirante francês de origem espanhola
Louis de la Cerda conquistasse as Canárias.
Foi o primeiro ato
consciente de colonialismo europeu após as Cruzadas, e
os guanchos foram o
primeiro povo a ser totalmente exterminado. Em 1496, um indígena fez sinal para
os soldados cristãos se aproximarem, e suas palavras entraram para a história:
"Não há ninguém mais para combater: estão todos mortos".
Em 1441, Antônio
Gonçalves, de volta do Rio de Oro, ofereceu dez escravos africanos a Henrique,
infante de Portugal. Este os ofereceu ao papa Martinho V, que, por sua vez,
concedeu a Portugal a "soberania" sobre a África ao sul do Cabo
Branco. A aceitação dos escravos por parte do pontífice e sua sucessiva
concessão deram a Henrique a prova do consentimento do papa quanto ao tráfico
de escravos.
Em 1460, os
jesuítas convenceram Ngola, rei angolano-congolês do povo quimbundo, a conceder
a Diaz de Novais, o navegador, a permissão para capturar escravos e levá-los
para Lisboa. Os reinos de Angola e do Congo começaram a se separar por causa do
tratado. Entre 1480-1500, os portugueses entraram na Guiné graças a tratados do
gênero, feitos através de logros entre os missionários e os chefes tribais da
Guiné e de Angola.
Em 1490, um certo
Uoulof levou o chefe tribal a expulsar todos os missionários. Os soldados
portugueses o mataram por isso, mas a resistência continuou a agir e impediu o
estabelecimento de outros missionários.
Em 1505, a cidade
de Kilwa resistiu aos missionários e à conquista. Foi saqueada e destruída
enquanto os missionários abençoavam o massacre. Em 1508, os missionários
enviados ao Congo criaram um comércio próprio de escravos. Em 1529, os
portugueses incendiaram e pilharam Mombaça, em represália às revoltas populares
contra invasores e missionários. O tráfico de escravos esvaziou as regiões do
Congo.
Em 1534, São Tomé,
sede principal do comércio, foi declarada cidade e arcebispado submisso aos
missionários brancos. Em 1540, o Estado da Igreja tentou uma colonização
militar do então reino etíope de Ambara-Galla-Harar.
Em 1553, uma nova
missão jesuíta chegou a Mbanza, no Congo, onde se ocupou também do tráfico de
escravos. Em 1600, Francisco de Almeida, os jesuítas e os colonos eram os donos
absolutos das costas de Angola, mas não ainda do interior. Em 1628, os
missionários ampliaram a própria influência e ganharam da resistência africana.
Foram conquistados novos territórios na África oriental.
Em 1633, o cardeal
Richelieu concedeu à Companhia Senegalesa de Dieppe e Rouen o monopólio do
comércio de escravos por dez anos. Em 1650, os missionários da Zambésia foram
desmoralizados pela prolongada resistência africana. Os dominicanos dispunham
de enormes propriedades imobiliárias e da mão-de-obra escrava. Os jesuítas
intensificaram sua participação no comércio de escravos em Angola e se tornaram
latifundiários, como em Moçambique. A Companhia de Jesus possuía uma frota de
navios particulares para o transporte dos escravos.
Em 1660, os
capuchinhos estabelecidos nas colônias portuguesas falaram de uma ampla
hostilidade dos africanos para com eles. Só em Goréé, nos duzentos anos
seguintes, foram "exportados" vinte milhões de escravos.
Em 1676, as
revoltas contra os missionários latifundiários e escravocratas obrigaram os
bispos portugueses a abandonar São Salvador, na Angola setentrional. Em 1694, a
maior parte das igrejas do país havia sido demolida pela resistência antiescravista
africana.
Em 1700, os
escravistas e os missionários retomaram Angola, mas a parte setentrional do
país e São Salvador eram praticamente desertas e despovoadas, por causa do
comércio de escravos. Calcula-se que, desde o início do tráfico, foram massacrados
25 milhões de africanos. Os missionários, com notável precisão, atribuíram o
declínio moral e material do continente negro à resistência africana.
Em 1707, na África
do Sul, um escravo iniciou uma revolta. Os missionários holandeses, a título de
demonstração, torturaram quatro rebeldes com a roda e estrangularam uma escrava
com as mãos.
Em 1721, na África
do Sul, os missionários holandeses obrigaram as crianças nativas a serem
batizadas, mas proibiram que os escravos, pais das crianças, presenciassem a
cerimônia.
Em 1781, os bantos
xhosas e os khoi-khoin, guiados pela rainha Hoho, rebelaram-se contra o roubo
de seus animais e de suas terras. Resistiram por alguns anos, mas, no final, o
exército branco, de grandes dimensões, os derrotou. Os sobreviventes, em 1792,
foram conduzidos à missão de Baviaanskloof, a partir de onde foram distribuídos
como escravos aos camponeses brancos.
Em 1800, o
missionário Van der Kemp fundou a missão de Bethelsdorp, que serviu de base
militar para os ingleses.
Em 1805, os irmãos
Albrecht, missionários alemães anglicanos, deram início à conquista alemã,
fundando uma missão em Warmbad, no sudoeste da África.
Em 1815, o
missionário alemão Schnelen, com a concordância da Igreja e de seu governo,
fundou a missão de Betânia, no território dos namas, destinada a desenvolver um
papel fundamental no período das conquistas.
Em 1818, com o
auxílio dos missionários, os ingleses do Cabo atacaram Makanda, general dos
ndlambes.
Em 1819, na Cidade
do Cabo, o missionário segregacionista John Philip propôs a formação de uma
"cadeia de Estados". Seu governo teria como base as missões. O povo
se rebelou, mas os missionários entraram em um acordo com o governo e os
militares aplacaram as revoltas com o sangue. Os canhões ingleses abateram três
mil xhosas que lutavam para defender a própria terra.
Em 1823, os
missionários ocuparam os territórios baralong e criaram chefes fantoches para
comandar a guerra contra Moshesh e os rebeldes.
Em 1828, os
relatórios do missionário John Philip revelavam os planos dos missionários
anglicanos, que pretendiam adotar critérios segregacionistas para escolas,
locais públicos e reservas e utilizar um "sistema de tratados" para
conquistar e sujeitar os africanos.
Em 1829, a missão
de Philipton era a base militar britânica, juntamente com a missão de Glasgow
em Balfour. O missionário metodista Shaw armou e sitiou grupos de brancos em
Albany e na zona oriental do Cabo. Os colonos de Albany atacaram os negros para
ampliar seus latifúndios.
Em 1834, o
missionário Philip aconselhou o governador a anexar o Xhosaland e a recorrer ao
governo indireto criando chefes fantoches. Mas os xhosas resistiram ao ataque
combinado de uma força de vinte mil homens composta de ingleses, bôeres e
missionários católicos, wesleyanos e anglicanos.
Em janeiro de
1835, os xhosas foram derrotados pelas tropas do missionário Philip. Os outros
missionários seguiram seu exemplo.
Em 1837, graças ao
apoio dos missionários católicos e wesleyanos, os bôeres massacraram, em
Mosega, quatrocentos zulus, exclusivamente mulheres, velhos e crianças.
Em 1844, os
missionários franceses "Pais do Espírito Santo" fundaram a missão de
Santa Maria do Gabão e extorquiram "tratados" dos chefes das tribos,
que permitiram que os franceses sitiassem o estuário do Gabão.
Em 1853, David
Livingstone atravessou a África e chegou às margens do lago Niassa, onde fundou
uma missão que transformou uma base contra os nativos, preparando o terreno
para os colonos ingleses.
Em 1868, o
chanceler alemão Bismarck pediu à Inglaterra para proteger os missionários do
sudoeste da África. O governador do Cabo, Sir Philip Wodehouse, respondeu ao
apelo do império prussiano, auxiliado pela missão do doutor Hahn, e atacou o
povo dos namas. Estes resistiram enquanto puderam, mas, no final, foram
exterminados quase por completo. Seu chefe foi punido pelos missionários.
Em 1894, no dia 6
de janeiro, na Drill Hall da Cidade do Cabo, Rhodes agradeceu publicamente às
missões anglicanas e católicas, ao Exército da Salvação, ao Movimento dos
Jovens Exploradores de Baden Powell e à Sociedade Abolicionista por terem
contribuído para a "libertação" da Rodésia dos rebeldes africanos.
Em 1914, a maior
parte do território africano pertencia às potências coloniais europeias, que
confiaram o controle da educação aos missionários cristãos.
Em 1920, a Aliança
das Sociedades Missionárias no Quênia pediu à Comissão da África Oriental para
não permitir as contratações livres entre empregados e patrões.
Em 1921, no Congo
Belga, Kimbangu liderou o movimento anticolonialista. Seguidor de Gandhi, ele
pregava a não-violência. Outro movimento de resistência foi liderado por Simon
N'Tualani. Os missionários católicos pediram ao governo belga para perseguir os
dois líderes e seus grupos, pois se recusavam a trabalhar e pagar impostos aos
colonizadores. Kimbangu foi preso, torturado e morto. N'Tualani, por sua vez,
conseguiu fugir, mas os missionários conspiraram com o governo colonial para
prendê-lo. N’Tualani foi então capturado, junto com 38 mil pessoas, torturado e
mantido em cárcere até sua morte.
Em 1926, a
Conferência Missionária Internacional condenou as Igrejas africanas
"etíopes" separatistas.
Em 1940, em maio,
foi firmada uma concordata entre Portugal e o Vaticano que incluiu uma
"orientação" missionária católica nas colônias portuguesas.
Em 1946, em
Uganda, foi fundado o partido Bataka, cujo programa englobava a requisição de
terras para os camponeses e os direitos de cidadania para os negros. Os
missionários proibiram os membros do partido de entrar nas igrejas.
Em 1950, nasce o
movimento nacionalista ugandense, cujo programa antimissionário previa a
redistribuição da terra e um governo próprio.
Em 1953, no
Quênia, os missionários, guiados por Crey lançaram uma campanha racista contra
as populações kikuyu e mau mau (os guerreiros quenianos independentistas). Foi
estipulada a pena de morte para quem prestasse o juramento mau-mau.
Em 1955, graças ao
monopólio educacional das missões, o Congo não formou um só engenheiro ou
advogado africano.
Em 1960, nas
colônias portuguesas, havia mais de cem missões católicas. As atividades
"didáticas e educacionais", controladas por essas missões e por
outros quinhentos missionários protestantes, eram do tipo segregacionista: não
existiam universidades para os negros, e grande parte das crianças em idade
escolar não freqüentava as aulas. A assistência sanitária, também controlada
pelos missionários, era só para os brancos. Em Angola, a mortalidade infantil
era de 50%, havia um médico para cada dez mil habitantes, e quase todos a
serviço dos grupos europeus. Quando a população da África do Sul se insurgiu
contra a segregação, ateou fogo a muitas igrejas católicas.
Em 1964, depois da
independência e do fim do monopólio das missões no campo educacional, a taxa de
analfabetismo em Gana caiu de 85% para 25%.
Em 1977, na África
do Sul, pela primeira vez no século, as escolas "brancas" católicas,
anglicanas e metodistas admitiram não-europeus, através de critérios seletivos
e limitados e com o consentimento tácito do governo, objetivando "desintrincar"
a situação pós-Soweto.
FONTES DE ESTUDO
capítulo 13
Colonialismo e escravidão
1. Tzvetan Todorov, La conquista
dell'America. Il problema dell'"altro". Turim, Einaudi, 1997, p.
12-14.
2. David E. Stannard, Olocausto americano:
Ia conquista dei nuovo mondo. Turim, Bollati Boringhieri, 2001.
3. Tzvetan Todorov, Georges Baudot, Racconti
aztechi delia conquista, Turim, Einaudi, 1988, p. 121.
4. AAVV, // Libro nero del capitalismo. Marco
Tropea Editore, Milão, 1999, p. 409.
5. Ibid.
6. D.
Stannard, op. cit., p. 72-3.
7. Ibid.,
p. 70.
8. Tzvetan
Todorov, op. cit., p. 172.
9. Ibid./p.\73.
10. Ibid, p. 179.
11. Ibid., p. 183.
12. Ibid.,p. 163.
13. Ibid., p. 183.
14. Ibid.,p. 213.
15. Ibid., p. 166.
16. Ibid., p. 168.
17. Charles Fair, Storia delia stupidità
militare, Milão, Mondadori, p. 344.
18. Tzvetan Todorov, op. cit., p. 269.
19. Ibid.,p. 268.
20. D. Stannard, op. cit., p. 235.
21. AAVV, op. cit., p.410.
22. D. Stannard, op. cit., p. 238.
23.Ibid, p. 111.
24. Ibid, p. 111
25. Vale a pena
lembrar que os puritanos tinham escapado para a América para fugir das perseguições
religiosas.
26. Jean Pictet, L'epopea
dei pellirosse, Milão, Mursia Editore, 1992, p. 127.
27. D. Stannard, op. cit., p. 241. 28./b/d,
p. 241.
29. AAVV, op. cit., p. 411.
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