Eram seguidores de Geraldo Segalello
de Parma (1240-1300, aproximadamente). Este, como São Francisco anos antes,
renunciou a todos os bens e, após ser rejeitado pela Ordem Franciscana, começou
a pregar sozinho por volta do ano 1260. Em pouco tempo, um amplo movimento se
formou ao seu redor (do qual ele, no entanto, nunca quis ser chamado de
"líder") e se difundiu não só na Itália setentrional e central, más
também na Dalmácia, Áustria, França, Alemanha e Inglaterra.2
Os apostólicos tendiam a se organizar
em comunidade: povoados onde trabalhavam e possuíam a terra coletivamente,
constituindo reservas comuns de alimentos e outros bens, as chamadas
"credências".
Como os franciscanos, praticavam a
pobreza e pregavam em qualquer lugar: nas praças, nas ruas, mas também nas
igrejas cedidas por eclesiásticos simpatizantes. Ao contrário dos primeiros, no
entanto, contestavam o dízimo (pagamento obrigatório que os fiéis deviam pagar
à Igreja e que oneravam bastante a renda dos camponeses pobres) e o poder do
clero, consideravam a Igreja de Roma irremediavelmente profanada, praticavam o
batismo dos adultos, não juravam nem pregavam a solidão.3 Além
disso, declaravam que era melhor viver sem votos do que pregá-los apenas de
maneira formal.4
Dentre os seguidores de Segalello,
estavam várias mulheres, que assumiam o posto de "irmãs" dos
apostólicos ou, até mesmo, "profetisas".
Anedotas e lendas das mais variadas
surgiram em torno dos feitos de Segalello e de seus seguidores, e hoje é
praticamente impossível diferenciar o que é verdadeiro do que é falso. Para o
povo, Segalello era um santo que realizava milagres, um "Francisco
ressuscitado", capaz de caminhar sobre as águas como São Pedro. Para seus
detratores, como o franciscano Salimbene de Parma,'era apenas um leigo de meras
origens camponeses, um "iletrado", um "idiota", e seus
seguidores nada mais eram que "pastores de porcos e bois",
"obtusos", "bárbaros e patifes".
Salimbene atribuía a Segalello e a
seus seguidores várias "burrices": o profeta apostólico teria o
hábito de dormir com uma moça nua para testar a própria castidade e teria
ingressado na vida pública ao aparecer sobre uma charrete mamando dos seios de
uma seguidora, como se fosse uma criança. Mas as massas não consideravam as
palavras de frei Geraldo tão rudes assim, já que o próprio Salimbene foi
obrigado a admitir que, na Emília, os pregadores apostólicos tinham um séquito
bem maior do que os franciscanos.
Até mesmo as crianças pregavam, e,
dentre elas, havia um verdadeiro menino-prodígio que, quando colocado sobre o
trono de uma catedral, atraía um grande público e conseguia várias conversões.
Quando pregou em Ferrara, aconteceu o seguinte:
Um dia, o frei Boaventura pregava no
convento dos Frades Menores em Ferrara e percebeu que alguns de seus ouvintes
se levantaram de repente e saíram correndo. Ele ficou muito surpreso...
Perguntou, então, por que saíam correndo. Aqueles que ficaram responderam:
"Por que um infante dos apostólicos está pregando na igreja mãe do beato Jorge.
É lá que o povo se reúne. E é por isso que vão embora correndo: para conseguir
pegar lugar.5
Em 1280, na região de Reggio Emilia,
houve um verdadeiro levante popular contra o clero por causa dos dízimos. A
culpa por ter incitado o povo recaiu sobre Segalello e seus seguidores, que
proferiam discursos com o seguinte teor:
"Ai de vocês, que exigem o
dízimo da colheita e negligenciam a justiça e a caridade... Ai de vocês, guias
cegos, pois dizem e não fazem, e exigem os primeiros lugares e os cumprimentos
nas praças, mas sobrecarregam os outros de um fardo insuportável nos quais nem
encostam um dedo..."
Frei Geraldo foi preso e encarcerado
pelo bispo de Parma, Obizzo Sanvitali. Inicialmente, foi para uma cela do
bispado, depois lhe foi concedida uma espécie de liberdade condicional dentro
do palácio bispai (o bispo se divertia ouvindo suas palavras, como se fosse um
jogral).
Após quatro anos de cárcere, foi
solto. É provável que o bispo o considerasse um personagem inócuo, e não foi
aventada a suspeita de que o herege se tivesse feito de louco para conseguir a
liberdade.
Mas a corda da estrutura eclesiástica
se apertava cada vez mais em volta dos apostólicos. Em 1285, o papa Honório IV
ordenou que depusessem o hábito característico (um manto acinzentado ornado de
uma capa branca) e entrassem nas ordens regulares da Igreja Católica. Poucos
aceitaram o convite. Os apostólicos foram, então, expulsos das igrejas da
cidade de Parma.
Em 1290, vieram as fogueiras: quatro
apostólicos, dois homens e duas mulheres, foram executados em Parma. Outros os
seguiram nos anos seguintes. Em 18 de julho de 1300 (ano do primeiro jubileu da
Igreja Católica), o próprio Geraldo Segalello foi queimado na fogueira.
FONTE PARA ESTUDOS
1.
G.G. Merlo, Eretici ed eresie medieval!. Bolonha, Il Mulino,
1998, p. 116. Notem também que, em hebraico, o termo "ruah", por nós
traduzido como "espírito santo", é feminino.
2.
Rino Ferrari, Fra Gherardo Segalello Libertário di Dio, Quaderni
dolciniani. Biella. Centro Studi dolciniani, p.33.
3.
Evangelho Segundo São Mateus, 6, 6.
4.
Rino Ferrari, op. cit., p. 25.
5. G.G. Merlo, op. cit., p. 72.
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